SÉRIE "ENCONTROS HISTÓRICOS NA MPB" (2):
Nana Caymmi & Cesar Camargo Mariano

Cândido de Lima Fernandes
Um
dos mais belos discos da MPB é “Voz e Suor”, gravado em 1983, tendo ao piano o
músico e arranjador Cesar Camargo Mariano e, como intérprete, a maravilhosa
cantora Nana Caymmi.
Nana Caymmi é o nome artístico de Dinair Tostes
Caymmi, nascida no Río de Janeiro em 29 de abril de 1941. Filha de Dorival
Caymmi e Stella Maris e, portanto, irmã de Danilo e Dori Caymmi, Nana cresceu em
uma das famílias mais musicais do Brasil. Começou a cantar desde muito jovem,
adotando desde então uma técnica vocal muito particular, em que aprendeu a
enfatizar seu timbre grave. Em 1961 participou de um concurso cantando uma
música de autoria de seu pai, "Acalanto". Pouco tempo depois, mudou-se com seu
marido para a Venezuela, passando alguns anos afastada do meio artístico.
De volta ao Brasil, lançou seu primeiro disco, "Nana". Em 1966, participou
do I Festival Internacional da Canção, obtendo o primeiro lugar com a canção
"Saveiros", de Dori Caymmi e Nelson Motta. Fora do Brasil, trabalhou com Sarah
Vaughan e Sérgio Mendes. Nos anos 70 e 80 gravou vários discos como solista e
alguns outros em parceria, como é o caso de "Voz e Suor" (1983), junto ao
pianista, compositor e arranjador Cesar Camargo Mariano.
Na década de
1990, chegou às listas dos discos mais vendidos por dedicar-se à interpretação
de canções românticas e boleros, sendo "A Noite do Meu Bem" e "Resposta ao
Tempo" dois de seus trabalhos mais populares. No ano de 1993 editou "Boleros",
uma seleção de 14 boleros clássicos, 13 deles cantados em castelhano.
Em
2003, lançou "Duetos", um álbum que traz uma seleção de canções, em parceria com
artistas consagrados da música popular brasileira, como Emílio Santiago, Herbert
Vianna, Agnaldo Timóteo e Beth Carvalho, entre outros. Depois de "Duetos", Nana
fez uma pausa em sua atividade musical para dedicar-se a um projeto com a
família Caymmi.
Em 2004, junto aos irmãos Danilo e Dori, lançou "Para
Caymmi, de Nana, Dori e Danilo: 90 anos", para celebrar o nonagésimo aniversário
de seu pai, Dorival Caymmi. O disco deu origem a um DVD homônimo. Em "Até
Pensei...", de 2005, a cantora ofereceu a seu público uma nova coleção de
canções românticas e boleros.
Como já escrevemos em crônica anterior, em
2019 lançou “Nana Caymmi canta Tito Madi”, uma homenagem a Chauki Maddi (12 de
julho de 1929 – 26 de setembro de 2018), compositor, cantor e pianista paulista
que mergulhou com sofisticação no universo da chamada “música de fossa”, das
dores de amor do samba-canção.
Cesar Camargo Mariano é um pianista,
arranjador, produtor musical e compositor brasileiro, nascido a 19 de setembro
de 1943, em São Paulo. Sua carreira começou em junho de 1957, com apenas 14
anos de idade. Nesta época, a trombonista norte-americana Melba Liston o
convidou para participar de seu concerto em um clube de jazz no Río de Janeiro.
Neste mesmo ano, Cesar Camargo Mariano conheceu o pianista Johnny Alf (falecido
em 2010), que o convidou para morar em sua casa em São Paulo com ele e sua
família. Johnny Alf ensinou a Cesar Camargo os segredos do arranjo, da
composição e das artes do cinema e do teatro.
Seu primeiro emprego como
profissional foi com a orquestra de William Furneaux e, pouco depois dessa
experiência, em 1962, formou sua primeira banda, “Três Américas”, que tocava em
festas e bailes. Cesar Camargo estudou teoria musical com seu pai, maestro de
música, mas nunca se converteu em um músico acadêmico. Após dois anos de
tentativas e fracassos decidiu continuar tocando de ouvido.
Em 1963
integrou o Quarteto Sabá, com o qual gravou seu primeiro LP. Em seguida formou o
Sambalanço Trio, com Airto Moreira e Humberto Claiber. Juntos gravaram um disco
com Lennie Dale, que lhes concedeu vários prêmios e, sobretudo, reconhecimento.
Ao final dessa mesma década, a rede TV Record de São Paulo o convidou para
participar de um especial chamado "Passaporte para o Estrelato". A partir dessa
experiência a emissora decidiu contratá-lo para trabalhar como instrumentista e
arranjador. Seus dois grupos dessa época, Sambalanço Trio e Som Três, são
considerados uma importante contribuição dentro do jazz brasileiro. De fato,
“Samambaia” (1981), foi um de seus álbuns mais populares tanto no Brasil como
nos Estados Unidos.
Uma de suas parcerias mais conhecidas é “Elis e Tom”
(1973), feito juntamente com Elis Regina e Tom Jobim. Como mostramos na crônica
do mês passado, este álbum consagrou Cesar Camargo Mariano de forma definitiva
como produtor, pianista e diretor musical, considerado por parte da crítica
especializada como um dos melhores discos da bossa nova. Também participou de
alguns álbuns junto com Chico Buarque, Maria Bethânia e Jorge Ben. Na mesma
época, entrou no mercado dos jingles e no das bandas sonoras de cinema.
Nos anos oitenta Cesar Camargo Mariano gravou dois discos considerados
históricos, o citado “Samambaia”, junto com o guitarrista Hélio Delmiro, e "Voz
e Suor", nosso disco de hoje, junto com Nana Caymmi.
Precursor no uso de
sintetizadores em seus arranjos musicais, Cesar Camargo continuou atuando como
arranjador, produtor, compositor e pianista no Brasil até 1994, data em que se
mudou para os Estados Unidos, onde começou a trabalhar com o saxofonista e
compositor japonês Sadao Watanabe, a quem acompanhou em suas habituais turnês
pelo Japão.
Cesar Camargo Mariano é pai de quatro filhos, todos eles
músicos. O mais velho é o baixista Marcelo Mariano, fruto de seu primeiro
casamento com a cantora brasileira Marisa Gata Mansa. Seu enlace seguinte foi
com nada menos que a diva Elis Regina. O casamento durou oito anos, durante os
quais nasceram a cantora Maria Rita e o também cantor Pedro Camargo. Sua filha
mais nova é Luísa Camargo, fruto de sua união com Flavia Rodrigues Alves.
“Voz e Suor”, gravado no ano de 1983, é um daqueles trabalhos que devem ser
saboreados aos poucos. O álbum está recheado de grandes temas, alguns dos quais
de autoria de compositores do quilate de Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Dorival
Caymmi, Ivan Lins e Milton Nascimento, aos quais a voz de Nana e os arranjos e o
suave toque pianístico de Camargo conseguem conferir uma dimensão diferente das
interpretações tradicionais. São maravilhosas as interpretações de “Doce
Presença” (Ivan Lins e Vitor Martins), “Clara Paixão” (Rosinha de Valença, Indy
e Nonato Buzar) e ”Velho Piano” (Dori Caymmi e Paulo César Pinheiro). Estou
certo também de que “Fruta Boa” (Milton Nascimento e Fernando Brant) e “Por Toda
a Minha Vida” (Tom Jobim e Vinicius de Moraes) conseguirão emocioná-los.
Este é um trabalho precioso, daqueles que recomendamos de coração e que,
infelizmente, não é facilmente encontrado no mercado, apesar dos nomes de seus
protagonistas, autênticos ícones da música popular brasileira. Porém, pode ser
encontrado nas plataformas digitais, como o Spotify.
Espero que vocês
gostem.
Cândido Luiz de Lima Fernandes é economista e professor universitário em
Belo Horizonte; email:
candidofernandes@hotmail.com

Direção e Editoria
IRENE SERRA
irene@riototal.com.br
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