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Uma honrosa missão
Há alguns dias recebi pedido de ajuda para tratamento de uma cadela resgatada.
Através dessa solicitação, vim a conhecer outras pessoas que têm esse mister e
uma, em especial, me comoveu: Lorena Lemos, por seu carinho e trato especial
aos animais.
Resgatar animais é uma causa muito nobre e, imbuída do
sentimento de amor aos animais,
Lorena o faz e deles cuida até a adoção. Seu
"Abrigo e Hospedagem Cantinho Cão Feliz" fica situado à Rua das Margaridas 20,
quadra 17, loteamento Jardim 26 de Maio (São José do Imbassaí, Maricá).
Vamos conhecer um pouco sobre sua
história?
Irene Serra: Como e por que o "Abrigo e Hospedagem Cantinho
Cão Feliz" foi fundado? Lorena Lemos: O Cantinho Cão Feliz foi fundado por
mim, em janeiro de 2016, quando viemos para Maricá. Sou protetora desde 2005,
tenho 20 anos na proteção e o meu sonho é ter uma hospedagem e um abrigo. Essa
casa que construí, paguei com dinheiro do apartamento da Tijuca. Viemos eu e o
meu sócio, Edivaldo, que trabalha comigo.
IS: Há quanto tempo vocês
resgatam animais?
LL: Comecei na proteção animal fazendo resgates, mas não
tinha a minha hospedagem, trabalhava com grupos. Antes da Tijuca, eu morava na
Barra da Tijuca onde resgatei dois cães na rua: um ficou com meu sócio; e o
outro, comigo. Em 2005, resgatei nove ou oito gatinhos na rua do Montanha
Clube, a Estrada Velha da Tijuca. Estava passeando com a minha cachorra e com
duas cachorrinhas de resgate, quando me deparei com uma caixa cheia de
gatinhos filhotes. Eu os socorri, levando-os à veterinária na Usina. Lá,
encontrei a Katia, com quem trabalhei posteriormente e, assim, entrei na
proteção animal. Conseguimos doar todos os gatinhos e comecei a resgatar
cães perto da comunidade do Borel, onde havia muitos cães abandonados, e os
deixava em hospedagens. Até que passei a levá-los para minha casa. Parei
de trabalhar em grupo e comecei a trabalhar sozinha em 2010/2011. Cheguei a
ter 12 cães no apartamento. Anteriormente, tive cães hospedados em Vargem
Grande, na Tijuca, no Grajaú. Em 2016, mudei-me para Maricá, pois achei
essa casa perto do Rio e que acomodava a minha situação; mas, atualmente,
estou com muitos cães e o lugar ficou pequeno. Por sempre sonhar em ter
uma hospedagem, um abrigo, vim para Maricá, onde estou há 9 anos. Tive
inúmeros problemas e muitos desafios no começo. Enfrentei, vencendo cada um e
cada etapa. Eu
sempre fui muito apaixonada por animais. Meu avô já era um
cachorreiro, resgatava cães na rua. Meu pai também já era. Então eu acho que
já vem assim de família mesmo. Como expliquei, resgato desde
2004/2005. Quando eu morava na Barra, fiz o resgate do Bento - que encontrei
no condomínio onde eu morava -, em uma caixa com outros sete cachorrinhos. Ele
que ficou comigo. Mas resgatar mesmo, assim botar a mão na massa, desde 2005.
Orgulho-me de dizer que há 20 anos estou na proteção animal.
IS: Seu
foco são os cães ou há resgate de outras espécies de animais?
LL:
O meu foco são os cães, porque eu não tenho lugar para ter um gatil aqui.
Queria resgatar todos os animais que são abandonados, que vêm de maus-tratos,
mas, infelizmente, o lugar em que eu moro não dá para resgatar outro tipo de
animal. Já me pediram para fazer um gatil, mas não tenho esse espaço. Por
isso, só resgato cães.
IS: Como vocês encontram os animais que precisam ser resgatados?
LL: Muitas
vezes me marcam; em outras, vejo no Facebook, no Instagram, no Whatsapp, ou as
pessoas me pedem ajuda e muitas vezes, ainda, eu vejo também, está na minha
frente, como aconteceu, agora, o caso da Priscila, que a abandonaram em frente
à minha casa. Não podia deixá-la lá, tive que pegá-la. Ou como os dois
bebezinhos pretinhos, que devem ter 2 ou 3 meses, que largaram na minha rua,
em uma obra. Eu tive que resgatar. Mas a maioria das vezes são chamados de
ajuda, de pedidos que me marcam. Eu já fui a muitos resgates de acumuladoras,
já entrei em muitas casas com 200, 300 animais, gente acumuladora aqui
em Niterói, na Dutra. Também fiz parte do projeto da Dutra, em que eu resgatei
alguns animais. Vou à luta e pego mesmo.
IS: Quais são os critérios
para um resgate?
LL: Eu tenho que estar preparada emocionalmente para
aquilo que vou fazer. Sempre faço uma prece para dar tudo certo, para que seja
um resgate bem sucedido, que não haja nenhuma fuga, que não aconteça de um cão
me agredir, que seja um resgate tranquilo, calmo. Eu sempre vou com alguém, um
táxi dog para resgatar e já levo um Simparic para eles tomarem, porque não
podem entrar com carrapato e pulga aqui, e os animais da rua estão sempre
contaminados com carrapatos e pulgas. Vamos fazendo amizade, já consigo botar
uma correia, uma coleirinha no pescoço, vou tentando fazer amizade e sempre
sou bem-sucedida. Graças a Deus, todos os resgates que fiz sempre deram certo.
Não escolho o cão que vou resgatar. É o que que está ali, que eu vi, que me
pediram. Podendo fazer, eu vou fazer! Também não posso ficar resgatando todos.
Os pedidos são muitos, mas não posso abrigar todos, porque é um custo muito
grande quando se resgata o cão da rua.
IS: Que tipo de cuidados médicos
e tratamentos os animais recebem ao chegar no Abrigo?
LL: A primeira
providência é dar um Simparic, ainda na rua, para eles entrarem aqui. Todos no
Abrigo estão protegidos. Em chegando, vão diretamente para o banho; muitos
nunca tomaram banho, tem que ser tudo muito bem feito, com cuidado e calma,
porque são cães que vieram, geralmente, de maus-tratos, vieram da rua, são
abandonados e estão traumatizados. Um banho sempre é bom para acalmar, o banho
relaxa muito. Assim, os primeiros cuidados são: darmos Simparic, em seguida,
um banho, limpar as orelhinhas - porque todos vêm muito sujos -, colocar um remédio
no ouvido deles para eles sacudirem e a orelha ficar limpinha. Se deixarem
cortar as unhas, a gente já corta também. E, claro, chamar a veterinária para começar a fazer o principal, um hemograma, uma bioquímica.
IS: Vocês trabalham com veterinários parceiros?
LL: Não. Nós não temos
veterinários parceiros. Eu tenho uma veterinária, a Doutora Jaqueline, da
Clínica Saúde Animal em Noá, mas tudo é pago: castração, vacinação, tudo é
pago. Eu posso até ter uma conta lá e ir pagando aos poucos. Todos os meus
cães são tratados, castrados com anestesia inalatória.
IS: Sabemos que
muito é necessário para uma empresa atuar dignamente. O que mais faz falta no
"Abrigo e Hospedagem Cantinho Cão Feliz"?
LL: Muita coisa faz
falta aqui! O principal é espaço. Precisamos de um espaço maior. Outra coisa
que falta é o poço, que secou. Cobraram um absurdo para fazer a perfuração,
então desistimos. Hoje em dia compramos água. Nós compramos e gastamos muita
água, porque isso aqui é lavado todos os dias. Eu e meu sócio ficamos
sobrecarregados, porque não temos funcionários, já que não podemos pagar por
eles. Não temos pessoas nos ajudando no dia a dia, temos apenas um funcionário
que limpa lá fora, lava as baias e o quintal. É a gente que dá banho e os
medicamentos, limpa a casa. Há muitos cães tomando medicamento, então é muito
trabalho e cansativo, mas é muito prazeroso!
IS: Quando o animal é
colocado para adoção? Como funciona esse processo de adoção?
LL:
Sou
uma pessoa muito criteriosa para fazer adoções. Na pandemia, fiz muitas,
muitas mesmo. Já peguei mãezinhas, umas 25, mãezinhas grávidas, outras com
bebês de 10, 20, 30 dias. A primeira coisa que faço quando alguém quer
adotar é um questionário. A pessoa vê os os cães que estão no site "Amigo Não
Se Compra". Estou no site, no Instagram e no Facebook. A pessoa
entra em contato comigo, conversamos por telefone, e já envio um questionário
para ela responder; peço o endereço dessa pessoa e, assim que me responde, eu
avalio o questionário. Já entro no Google Maps para ver onde ela reside, se é
um lugar que eu gostaria que o meu cão fosse morar e se a pessoa tem condição
de ter um cão. Porque um cão dá muito muito custo. Tem que ter uma condição
razoável para ter mais um membro na família. Já perdi o número de cães que
doei. Não tenho pressa para eles irem embora daqui. Tem que ser uma adoção
consciente, bem-feita, para não ter
devolução. Sendo filhote, sabe que filhote vai destruir; filhote é levado,
requer uma atenção maior e você tem que saber tudo, saber da responsabilidade
que está assumindo na sua vida. É mais um membro que vai ocupar a sua casa e
isso é uma coisa muito séria. Não é um brinquedo, não é descartável. Você pega
e daí a dois ou três meses, até mesmo um ano, você não quer mais e devolve? Não é assim! Chego a ser chata na adoção.
IS: Que tipo de requisitos os
adotantes devem atender?
LL: Dou preferência a pessoas com uma
idade razoável. Não gosto de doar para pessoas muito novas, nem muito idosas.
Não dá para doar para pessoas que querem adotar por impulso. Gosto de doar
para uma família já estruturada, uma família formada que tenha vontade e
responsabilidade para adotar. Pode ter um outro cãozinho, querer mais um para
fazer companhia não tem problema nenhum. Uma família que não
descarte seu cão, que se for se mudar, até
mesmo mudar de país, o leve junto.
Quando eu faço adoção, costumo ir à casa levar. Gosto de conhecer, ver o
local que o cãozinho vai.
IS: Quais são os maiores desafios enfrentados
no resgate e na adoção dos animais?
LL: Que seja bem-sucedido, que seja
feito com tranquilidade, com calma, com paciência, pois são cães que estão às
vezes muito estressados na rua e meus requisitos criteriosos para adoção que
eu já comentei também. O trabalho no resgate é muito cauteloso, por isso eu
não doo para qualquer pessoa. Não tenho pressa para doar o meu cão, eu quero
que ele tenha uma qualidade de vida. Tenho cães que estão comigo há cinco anos
para serem adotados. Eu tive cães que, depois de seis a sete anos comigo,
foram adotados. Acho que cada coisa acontece na hora que tem que acontecer.
IS: Como vocês superam esses desafios?
LL: Supero esses desafios
com tranquilidade, com paciência. Sei superar bem os desafios. Saber lidar
com as pessoas, com o adotante, ser uma pessoa bem clara, sincera, mostrar meu trabalho, quem quiser visitar a hospedagem e o abrigo
pode vir, não há problema algum quanto a isso. Pode
me visitar, vir me conhecer, vir na minha casa. Aqui está aberto para todos, com muito amor no coração.
IS: Vocês realizam campanhas de conscientização sobre adoção responsável e
cuidados com os animais?
LL: Eu frequentava e participei de muitas
feirinhas de adoção na Tijuca, na Praça Saens Pena, onde eu fiz muitas adoções, muitas e muito boas! Não faço feira aqui em Maricá, porque não tive
boas experiências. Na pandemia de Covid eu ainda participei de feiras, mas de
três anos para cá, eu não fui mais, por motivo de saúde. É muito
longe, feira fica longe. Então é tudo doado pelo site "Amigo Não Se Compra" ou
pelo Instagram ou pelo Facebook ou amigos de amigas, indicações, conhecem meu
trabalho e adotam comigo. É isso, não tenho mais feito feira, são realizadas
assim minhas adoções agora. IS: Como as pessoas podem ajudar no trabalho
de vocês?
LL: Eu queria ter voluntários para virem ao Abrigo,
ajudar a dar banho; eu tenho a Adriana, a Juliana, a Mara, mas elas moram no
Rio. Nem sempre podem vir, sei que aqui eu fico muito só, muito isolada. Eu não
tenho essa parceria com mais frequência. Cada um tem sua vida, trabalha e é
realmente muito complicado pra mim. Assim, eu queria ter ajuda, mais ajuda no
dia a dia, no trabalho, na rotina. Ajuda com parcerias, por exemplo. Eu compro
tudo em loja, não compro nada a preço de custo, gasto muito dinheiro em ração.
Não tenho parceria de
ração, também não dou qualquer ração para os meus cachorros, a que eles comem
é a Golden ou então a Premier, tem a Senior para cachorro idoso e tem as
específicas para quem está com problema renal, para quem está com problema de
obesidade. Tudo é comprado com o dinheiro de pessoas que me ajudam. Não são
muitas, mas tenho pessoas que me ajudam mensalmente, faço rifas para castrar,
vacinar, comprar medicamentos. Tudo de pet é caro. E quando os resgatados têm
doenças como filária, parvovirose, cinomose, eles têm que fazer
ecocardiograma, eletro. Tudo isso é muito gasto!
IS: Vocês poderiam
compartilhar algumas histórias emocionantes ou bem-sucedidas de resgates e
adoções?
LL: Há quatro histórias bem-sucedidas que marcaram a
minha vida. Uma foi na Tijuca, no Pascoal, eu resgatei na Páscoa, por maus-tratos. Ele sofria muito. vivia numa corrente preso, cão de porte
médio, magérrimo, pele e osso, vivia nas fezes, na urina, em um quintal minúsculo.
Ele tinha muitas feridas no corpo todo e
ficou no meu apartamento. Com o trabalho que faço com atendimento em
bons veterinários, ele foi se recuperando facilmente, conseguiu uma excelente
adoção. Em Maricá eu resgatei o Davi, resgatei no Morro do Alemão.
Ele tinha uma hérnia, chutaram ele no saquinho por trás e nasceu uma hérnia
imensa nele. Fiz o resgate da família toda dele. Da Vitória e dos três bebês
deles. Todos resgatados. Davi fez três cirurgias na clínica Bichos e Caprichos
na Tijuca, porque toda hora saía a hérnia. Ficou
bom e foi adotado por uma família maravilhosa.
Tive
o Bento que eu resgatei aqui com uma coroa na cabeça que é uma bicheira imensa
e de maus-tratos e está comigo até hoje.
Agora
eu resgatei dois cachorrinhos, Thomas e Maria Alice, de maus-tratos lá de
Sepetiba que vieram pele e osso para mim, menos de quinze dias de resgate eles
já estão outros cães. Vieram muito medrosos devido a maus-tratos, a gente não
podia tocar neles, porque eles já gritavam. Ainda não tomaram banho, ainda não
cortaram as unhas, ainda não fizeram exame de sangue, porque eu achei muito
cedo. Estão muito medrosos, só depois do Carnaval nós vamos coletar sangue
para fazer hemograma. Eles já engordaram, os ossinhos já não estão aparecendo
mais, já vem com a gente, já dão beijo. É um trabalho assim muito
gratificante; isso não tem preço.
IS: Qual é o seu grande sonho para o futuro em relação aos animais?
LL: Meu
grande sonho é ter parceiros e virar uma ONG. Ir para um lugar maior, esse é o
meu grande sonho também. Pode ser aqui em Maricá mesmo tem sítios aqui em
Maricá. Resgatar, poder resgatar mais animais, resgatar gato, resgatar cavalo,
resgatar qualquer animal porco, qualquer um de maus-tratos. Tem muitos animais
em situação de maus-tratos. Esse é o meu maior sonho, mas meu grande sonho é
virar uma ONG e ter parceiros que me apoiam. A gente vive com a corda no
pescoço. O trabalho é muito grande. Infelizmente, às
vezes a gente tem que fechar os olhos porque não tem como resgatar. Isso me
entristece muito, eu fico muito mal, porque você querer fazer e não
poder é uma coisa muito ruim. Então, meu maior sonho é que eu vire uma ONG que
eu possa fazer muitos resgates. Há muitas
vidas precisando ser salvas.
Contato:
Lorena Lemos.
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Revista Rio Total Direção e Editoria
Irene Serra
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