01/08/2022
Ano 25
Semana 1.282




ARQUIVO


 



História

Cultura

Tradição

 



Gueto de Praga




Praga, a "jóia de pedra" como definiu Goethe, reviveu.

Quem a visitou depois da primavera de 68 achou que havia morrido: uma cidade de ouro sufocada pelo mais rígido sistema comunista, um canto de civilização europeia sepultado por um regime opressivo. Lamentável, para uma das cidades mais monumentais, grandiosas e charmosas da Europa Central; pena para uma capital cultural tradicional amada e ao mesmo tempo amaldiçoada por escritores como Kafka e Kundera.

O destino quis que fosse escritor também seu atual presidente, Vaclav Havel, o herói da "Revolução de Veludo", que desde 1989 deu vida nova à cidade, hoje literalmente invadida por turistas do mundo inteiro.

Inúmeros turistas visitam a cidade também para admirar os tesouros do bairro judaico, suas sinagogas e museus e para louvar a memória das vítimas das perseguições de um passado antigo e recente. A primeira reação do visitante que procura a Cidade Judaica de Praga e os vestígios do antigo gueto é de surpresa e perplexidade.

As animadas artérias de acesso, a elegante Rua Pariska e suas proximidades à Maislova e Siroka, apresentam magníficas fachadas em estilo neobarroco, neo-renascentista e art nouveau, que substituem um bairro único que se originou na Idade Média. As próprias sinagogas, já definidas como "Glórias entre os Templos", parecem abafadas por essas construções.

Mesmo assim, na Cidade Judaica de Praga encontra-se um conjunto de monumentos judaicos, únicos em toda a Europa Central.

Embora o antigo gueto, com seu emaranhado de ruas, ruazinhas, cortiços e passagens tenha sido cancelado do mapa histórico da cidade pelo decreto de saneamento de 1893, e substituído por um moderno bairro residencial, a comunidade judaica, com o apoio dos intelectuais e artistas da cidade, conseguiu preservar a maioria dos monumentos mais preciosos, entre eles cinco sinagogas, o edifício da prefeitura judaica e o antigo cemitério judaico.

O exame desses tesouros das épocas góticas, renascentista e barroca, assim como da mais recente, permite-nos acompanhar, em toda sua continuidade, a evolução da comunidade judaica, como em pouco lugares no mundo, por quase dez séculos. Relativamente, a vida no gueto não foi perturbada e a comunidade que lá se instalou desde a alta Idade Média continua até os nossos tempos.

Na época, havia bons motivos para demolir o gueto repleto de gente, escuro, sem ar, com o mais elevado índice de mortalidade da cidade e foco ativo de doenças infecciosas; um bolsão de miséria em que talvez não houvesse possibilidade de recuperação, tal era o estado das moradias freqüentemente divididas entre vários habitantes, cada um ocupando um espaço bem limitado.

Para a imagem de Praga, que queria competir com as outras capitais do império austro-húngaro, o bairro judaico nesse estado e em pleno coração da cidade, era uma tristeza. Para isso, a cidade procedeu a uma destruição radical e sistemática do bairro, preservando apenas os edifícios de valor histórico.
Essa operação de saneamento envolveu também o bairro cristão ao redor do gueto, com perda não menos triste: assim, apenas 20 anos, entre 1897 e 1917, surgiu sobre as ruínas do gueto e da parte nova da Cidade Velha de Praga.


BREVE HISTÓRIA

De acordo com fontes históricas, havia judeus sediados aos pés do Castelo de Praga, à margem esquerda do rio Vlatva ou Moldava, no atual bairro Malà Strana, desde o século X.

Lá no Bairro Pequeno, havia um sinagoga e um cemitério. A sinagoga foi totalmente destruída pelas chamas em 1142, quando Praga foi sitiada e ocupada e, a partir dessa data, os judeus passaram a se estabelecer à margem direita do rio Vlatva, na Cidade Velha.

Praga, no caminho das rotas do comércio entre o ocidente e o oriente, atraiu para a Boêmia imigrantes judeus provenientes de duas regiões distintas: do oriente, de Bisâncio e do ocidente, de além dos Alpes, especialmente da Baviera.

Os orientais, que se acredita serem o núcleo mais antigo, concentraram-se na área em volta do antigo Schul (sinagoga, em iídiche) da Rua Dusni, posteriormente demolido e substituído, em 1867, pela Sinagoga Espanhola ou Templo. A segunda leva de imigrantes provenientes do ocidente, ocupava uma área maior nos arredores da Velha-Nova Sinagoga. Assim, os judeus fundaram sua própria cidade no território da Cidade Velha de Praga.

A cidade judaica, depois denominada de gueto, representava desde os séculos XI a XIII um conjunto compacto de moradias, contando em 1435 com 143 edifícios significativos, dadas as pequenas dimensões das cidades medievais, com seu status jurídico e separada da parte cristã da cidade por uma muralha com seis portas que eram fechadas à noite. A última porta foi eliminada em 1822, quando o gueto contava com 279 casas, 31 ruas e ruazinhas e 2 praças.

Crescia durante os séculos a fama da comunidade judaica de Praga: graças à segurança e prosperidade relativas garantidas pela proteção dos monarcas, a cidade atraía elites intelectuais.

Na cidade, desde o século XI, funcionava a famosa Academia Judaica, prestigiosa escola talmúdica; nela, também no início do século XVI, apareceu a primeira impressora de textos judaicos de além dos Alpes, e lá também viveram e trabalharam grandes sábios.

As fontes históricas relatam que em 1703 a população do gueto contava 11.517 habitantes concentrados em apenas algumas quadras de prédios, enquanto que o resto da Cidade Velha contava com 11.618 pessoas. A cidade judaica tinha suas próprias leis, suas autoridades e seu presidente.



Fonte: Morashá
Enviado por Leon M.Mayer
(RT, 17 de setembro, 2005)




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Direção e Editoria
Irene Serra