Rosh Hashana
Uma Tradução Bem Diferente...
Jane Bishmacher de Glassman
Quando falamos em Rosh ha-Shaná, imediatamente pensamos no
Ano Novo Judaico. Este não é um estudo acadêmico sobre a origem de
festas de passagem do tempo ou da comemoração dos ciclos da natureza,
envolvendo elementos arquetípicos universais... Só pretendo, como forma
original de desejar Shaná Tová, repensar o significado da expressão.
Rosh, em hebraico, quer dizer cabeça. Mas significa também chefe;
início, princípio; cimo, cume, vértice; parte, ramificação; base,
fundamento, essência; veneno (planta venenosa); como adjetivo: superior,
principal. Shaná = ano. Mas (como verbo) significa também repetir,
reiterar; estudar, aprender; ensinar, instruir; transformar-se,
modificar-se; diferir. Outra observação linguística interessante é
que a palavra shaná é feminina... Vejam o quanto podemos extrair em
termos de reflexão sobre Rosh ha-Shaná só a partir do significado das
palavras!
Quando falamos cabeça, tendemos a associar com razão,
racional. Ao falar em feminino, associamos, até por condicionamento
cultural, com o emocional. Tendemos a formar um binômio razão X emoção,
bem como masculino X feminino...
 Além disso,
rosh pode ser base,
início, parte ou cume: uma estrutura completa!
Quando pensamos em
educação, a partir do hebraico shaná, recebemos um "toque" que pode nos
ajudar a transformar as nossas vidas, fazendo um jogo com a
multiplicidade de sentido destas palavras, que embutem mensagens
valiosas: repetir ou transformar, estudar e aprender, ensinar instruir
ou educar?
Dizer que Rosh ha-Shaná é um período de reflexão, é um
lugar comum. Tornemos este lugar, este espaço temporal, um pouco mais
incomum!
Usando os sinônimos mencionados, usemos há-rosh, a
cabeça, a razão, para sermos o chefe... de nós mesmos, de nossos
destinos! Não poderíamos assim entender o livre-arbítrio que nos foi
dado por Deus? Não poderia ser esta a essência da mensagem
metalingüística as palavras nos dizendo mais do que lhes é autorizado
saber?
E nossa emoção? Não vem sempre carregada de um passado
cumulativo que, se por um lado, engloba todas as nossas boas
experiências, nossos afetos, nossas alegrias, por outro, também não nos
faz carregar ao longo de nossas vidas, um amargo "lixo atômico"
existencial de tristezas, frustrações, perdas, que tantas vezes
contaminam nossa capacidade de (re)iniciar, de nos modificarmos, de nos
transformarmos?
Assim como em
Pessah fazemos uma faxina
em nossas casas, para eliminar o hametz, devendo chegar ao hametz que
fermenta vaidade e pensamentos negativos em nossos corações,
aproveitemos Rosh ha-Shaná para fazermos uma faxina em nossas vidas
aprendendo com nossos erros, buscando a transformação, agindo
racionalmente, mas nos permitindo sentir, ensinando ao outro a paz,
através do perdão, transformando veneno em essência!
Perdoemos,
principalmente, a nós mesmos, pelas chances desperdiçadas, por ter
perdido nossa auto-chefia na vida, recobrando-a, aprendendo com os
outros e nós mesmos, para que fale mais alto o significado de diferir...
enfim, para que Rosh ha-Shaná seja um real início, um princípio
diferente!
Jane Bichmacher de
Glasman é Doutora em Língua Hebraica, Literatura e Cultura Judaica -
USP, Professora Adjunta, Fundadora e ex-Diretora do Programa de
Estudos Judaicos - UERJ e do Setor de Hebraico UFRJ (aposentada) e
UERJ, escritora
Publicado na Revista Rio Total em 9 de setembro,
2009
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