02/02/2008
Ano 11 -
Número 566
Sheila Sacks ARQUIVO |
Sheila Sacks
O PRESIDENTE E O HOLOCAUSTO
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Pela terceira vez consecutiva o presidente Luis Inácio Lula da Silva foi
a figura central da celebração brasileira do Dia Internacional em
Memória das Vítimas do Holocausto, instituído pela Organização das
Nações Unidas (ONU), em 27 de janeiro de 2005. Realizada nos anos
anteriores em São Paulo, desta vez a solenidade teve como cenário o
secular e suntuoso Palácio Itamaraty – antiga sede do Ministério das
Relações Exteriores –, no Rio de Janeiro. Na ocasião também foi aberta a
exposição de fotos “Holocausto Nunca Mais”, organizada pelo Museu
Judaico carioca.
Para Lula, “o holocausto deve ser lembrado com indignação por nós, pelos
nossos filhos, pelos filhos dos nossos filhos e por todas as gerações
futuras”. Ele assinalou que é preciso promover valores elevados como a
solidariedade, a paz e a tolerância, transformando esses valores em
ações concretas contra o anti-semitismo e os preconceitos de raça,
religião e de classe social. “Participo deste encontro pelo terceiro ano
consecutivo”, afirmou, “pois acho fundamental rememorar o aparato de
terror empreendido pelos nazistas. Lembranças tristes e trágicas como as
do holocausto não devem ser apagadas e, sim, transmitidas a outras
gerações.”
Lula, com a simplicidade que lhe é característica, ainda reafirmou: “Se
o presidente da República pudesse, bateria na porta de cada lar
brasileiro para fazer um apelo para que todos sejam tolerantes e deixem
a discriminação de lado.” Ele destacou ainda o fato de que o Brasil é
hoje um dos poucos países no mundo em que não existe prescrição nem
pagamento de fiança para crimes de racismo. Ou seja, aquele que pratica
qualquer forma de discriminação pode ser detido, sem nenhuma atenuante.
Holofotes
A presença do presidente brasileiro nessa celebração, repetida
anualmente, tem recebido da mídia uma cobertura nacional bastante
expressiva. Este ano a notícia repercutiu com maior destaque na imprensa
e nas rádios cariocas, visto a cerimônia ser realizada, pela primeira
vez, na cidade maravilhosa. Em entrevista à Rádio Nacional, alguns dias
antes do evento, o diretor do Centro de Informações da ONU no Brasil,
Giancarlo Summa, ressaltou a importância da data: “O holocausto foi um
dos piores crimes de todos os tempos. Cerca de seis milhões de pessoas
foram assassinadas pelos nazistas, da forma mais covarde. Foi uma
barbárie absoluta.” Ele lembrou ainda que a data foi instituída, há três
anos, para marcar a libertação do “maior e pior campo” de extermínio dos
nazistas, Auschwitz-Birkenau, no sul da Polônia, ocorrida em 27 de
janeiro de 1945. Sobre a exposição, Suma explicou que painéis com fotos
mostram, de forma didática, como se deu o processo do holocausto, as
primeiras perseguições levadas a efeito contra os judeus no começo dos
anos 30, e a libertação dos prisioneiros do campo de Auschwitz.
Convidados
Mais de 500 pessoas compareceram à cerimônia (ocorrida este ano em 25 de
janeiro) que reuniu os governadores do Rio, Sérgio Cabral, e da Bahia,
Jacques Wagner; o secretário nacional de Direitos Humanos, ministro
Paulo Vanucci, o embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Clifford Sobel,
a embaixadora de Israel, Tzipora Rimon e representantes da comunidade
judaica. Vale destacar o teor do discurso do jovem governador carioca,
Sérgio Cabral, ao observar que o país ainda necessita evoluir para
diminuir a discriminação. “O Brasil não tem muito que comemorar em
relação aos direitos humanos nos últimos séculos”, disparou. “O Brasil
só libertou os seus negros da escravidão em 1888, só permitiu que o seu
povo votasse em 1945 e, durante o Holocausto, permitiu fascistas dentro
do governo.”
Fenômeno
Mas, voltando a Lula, pesquisas realizadas em dezembro de 2007 por duas
importantes instituições, o Ibope e a Datafolha, mostraram que o
presidente brasileiro registra um índice geral de aprovação inédito,
atingindo 85%. Isso porque 50% dos entrevistados classificaram o seu
governo de ótimo ou bom, e mais 35% o julgaram regular. Somente 15%
fizeram restrições. As consultas foram promovidas em 25 estados da
federação, somando mais de 13 mil pessoas de variadas profissões e
classes sociais. Considerando que Lula está no seu segundo mandato
presidencial e exercendo a liderança do país há mais de cinco anos, o
resultando é estupendo.
Já em outra pesquisa levada a efeito em 2006, Lula foi apontado como o
melhor presidente de toda a história do Brasil. Entre os itens positivos
de seu governo os consultados citavam o combate à fome, os programas
sociais e a melhora na economia. Na mesma enquete o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso ficou em segundo lugar, seguido por Juscelino
Kubitscheck e Getúlio Vargas.
Daí que não é demais reputar como uma benção, em um país das dimensões e
da importância e influência política que exerce na América Latina,
dispor, no mais alto cargo da República, de um homem com essa visão
democrática, tolerante e solidária diante das grandes questões que tocam
fundo nos sentimentos e na sensibilidade de cada ser humano. Relevante é
assinalar, neste contexto, a liberdade que goza a mídia brasileira em
relação às abordagens críticas referentes às ações do governo e mesmo à
pessoa do presidente, em um exemplo magnífico para outros chefes de
Estado no hemisfério, que costumeiramente se utilizam de artifícios para
calar as vozes daqueles que os desagradam.
Da mesma forma, palavras, gestos e ações que prenunciem ou revelem uma
predisposição a atos preconceituosos ou de anti-semitismo têm merecido
resposta imediata, tanto na mídia quanto na área jurídica, das partes
atingidas, ancoradas e salvaguardadas pela legislação brasileira e pelo
clima político que se irradia de Brasília. O governo de Lula é
transparente ao sinalizar, sistematicamente, que não compactua com a
intolerância, o racismo e o anti-semitismo. Em um discurso, há dois
anos, o presidente enfatizou a sua posição ao afirmar que ele combateria
o anti-semitismo mesmo se não houvesse um único judeu no Brasil.
Trajetória
Filho de um agricultor muito pobre, Lula nasceu em uma pequena cidade do
sertão de Pernambuco. As dificuldades e a fome o levaram, aos sete anos,
a viajar 13 dias em um caminhão “pau-de-arara” até São Paulo,
acompanhado da mãe e dos sete irmãos. Residiu com a família, durante
muito tempo, num quartinho nos fundos de um bar. Foi ajudante de
tintureiro e aos 14 anos arrumou emprego numa fábrica de parafusos. Anos
depois concluiu o curso técnico de torneiro-mecânico e ingressou nas
Indústrias Villares. Em 1975, aos 30 anos, Lula assumiu a liderança do
poderoso Sindicato dos Metalúrgicos da cidade paulista de São Bernardo
do Campo, que na época congregava mais de 200 mil operários. Foi
reeleito em 1978 e comandou grandes paralisações reivindicatórias de
melhorias de salário e de condições de trabalho. Com seu jeito simples e
direto, Lula se postava à frente dos portões das fábricas, motivando e
conquistando a adesão dos empregados para as mobilizações a favor de
importantes questões de interesse da categoria. Entretanto, em 1980 o
sindicato foi fechado por uma ação militar e sua diretoria destituída.
No mesmo ano funda o partido dos Trabalhadores (PT) que só é reconhecido
oficialmente em 1982, quando se lança candidato ao governo de São Paulo
e obtém mais de um milhão de votos. Em 1986 é eleito deputado federal
com a maior votação do país, e em 1989 perde a eleição para presidência.
Tenta a presidência mais duas vezes, em 1994 e 1998, até que ganha as
eleições em 2002 e é reeleito em 2006.
Presidente de honra do PT, Lula vê hoje o seu partido com mais de um
milhão de filiados, aglutinando brasileiros de diversos níveis sociais e
profissionais, de operários a intelectuais, em uma demonstração
incomparável da trajetória singular deste brasileiro que soube
amadurecer e ampliar os seus horizontes culturais e políticos,
transformando-se no político latino-americano mais respeitado e
bem-avaliado por seus pares internacionais. Pesquisa neste sentido foi
feita há dois meses pela ONG chilena “Latinobarômetro”, conferindo a
Lula a posição do líder político com a melhor imagem na América Latina e
o único a manter o posto nos últimos dois anos. Mais de 20 mil pessoas
em 18 países responderam à consulta, que, se de um lado consagrou Lula,
por sua vez empurrou para as últimas colocações o cubano Fidel Castro e
os presidentes Hugo Chaves (Venezuela) e George W. Bush (EUA).
(02 de fevereiro/2008)
CooJornal
no 566
Sheila Sacks é jornalista
trabalha, há 25 anos, na Assessoria de Imprensa da Empresa de Obras
Públicas do Estado do Rio de Janeiro (Emop). Também escreve para o NOSSO
JORNAL-RIO, uma publicação voltada para a comunidade judaica.
Rio de Janeiro, RJ
ssacks@oi.com.br
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