Ronaldo Werneck
Com La Olivetti na Cama
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Este Bubbaloo sai direto da cama do
François. Não me entendam mal, muito menos ao jovem francês. Bernardo, seu
mais novo rebento, está dormindo no quarto lá dentro e o barulho desta
inacreditável Olivetti 32 onde batuco este sambinha, quer dizer, desta coluna
as linhas, iria acordar o mais nouveau des enfants da tribo dos Fuscos.
Naturalmente, a Ângela iria ficar pau da vida comigo – mãe é mãe, apanhe ou
não apanhe.
Muito bem. Domingo, 18 de setembro, 20:45. É quase primavera em
Cataguases. Quer dizer, no mundo. Washington e Rogério Torres acabaram de
sair, depois de terem executado um bravíssimo Carinhoso, um na flauta (doce?)
outro no violão (no ouvido: algodão?). Cataguases é sempre um espanto, são
inacreditáveis as surpresas. Vejam vocês que eu tinha que ir a Ubá ainda hoje
pra resolveu um “causo” com a Soninha, a minha mais nova namorada. Em todos os
sentidos: há exatamente vinte e dois anos Soninha Vieira possui dois
inebriantes olhos que te quiero verdes. É demais para o coração quase
cinquentenário de um poeta provinciano e pouco imaginário.
Claro que não
fui. Acabei comendo, eu, Soninha, Seu Hisbelo & o clã dos Fusco, o excelente
churrasco do Rosário François Petit Jean Fusco de Souza Guerra. Depois,
passamos alguns vídeos que eu fiz (pois é, estou na fase cinematográfica,
entre outras: o amor nos dá força, uma força estranha) e saí para procurar uma
bateria para meu amigo Afonsinho tocar no sábado que vem no Taramela (quer
dizer, como diz o grande Zé Maria, não no “sábado próximo vindouro”, mas no
“sábado próximo passado”, quer dizer, ontem: este negócio de jornalista
escrever antes do acontecimento, como se a coisa já tivesse ocorrido, sempre
me baratinou).
Liguei pro Carlinhos Vergueiro, no Rio, pra tratar de certas
kaisas, liguei pra Ubá dizendo que vou chegar mais tarde (acho que vou direto
pro Rio: tenho que estar na Cacex amanhã cedo e, por mais que a Navilouca,
apelido que a Monkinha botou no meu Opala dourado – o Golden Boy, segundo a
Soninha – esteja andando bem, são ainda 300 km até minha mansão da Inconstante
Ramos, em Copacabana me engana, pois sei que sou (era) o superbacana, o
super-das-canas, o supersacana. Fecho o parênteses que não abri pra vocês
respirarem.
Agora sim, devidamente “respirados”, digo o porquê desta foto
que ilustra a coluna. Aí se vê o poeta que vos fala e o nobre atleta Carlinhos
Vergueiro, em flagrante feito no sábado, 10, momentos antes de seu show “Um
Cigano em Cataguases”, no Colégio idem. Não entrei nesta partida de futebol,
que não sou doido. Quer dizer, não sou “tão doido”: três dias antes,
aniversário da pátria e do município, eu havia jogado futebol no Clube Meca,
naturalmente no gol, que eu sou goleiro veemente desde os tempos do velho
Alfinete, do “Operal campeão local”, que me treinou e, com licença da
esnobada, treinou também o Pompéia, ele mesmo, aquele negão que foi trapezista
e goleiro mais que altaneiro do América do Rio de Janeiro.
Pois é, pra quê!
Ganhamos de 10 a 7, com dois brilhantes gols do Vergueirinho. Mas o poeta saiu
de campo com as seguintes contusões: joelhos e cotovelos absolutamente
depauperados, dedão do pé roxo, sangue pisado. Acabei fazendo punção no
Hospital na madrugada de sexta-feira, logo após, vejam que charme, ter
desmaiado nos braços do Carlinhos Vergueiro na antiga farmácia do Seu Jacy, em
plena Praça Rui Barbosa. Até aí, nada. O pior foi depois. Na
segunda-feira, já no Rio, fui ver a Andréa Bogossian cantar, junto com o
Kimura, a Ulla e a Soninha. Saí do La Maison, na Fonte da Saudade (vocês têm
que ir correndo ver o show da Andréa, ela está cantando demais), diretamente
para a Beneficência Portuguesa, com dores incríveis. Duas costelas quebradas,
ainda resquícios da maldita partida no Meca.
Mas, ainda sobre “Um Cigano em
Cataguases”. Havia uma exibição de Corais no mesmo dia no Cine Edgard... e de
graça. Quer dizer, atropelaram o Carlinhos Vergueiro. Tentei salvar a coisa, e
com o consentimento da Lurdinha Paixão, minha secretária de cultura do
coração, entrei em cena, quer dizer, no palco do cinema, logo após os corais,
dizendo que o show do Carlinhos só começaria dali a 15 minutos e que eu estava
ali só pra convidar o distinto público que tão atentamente vira/ouvira a
“coralesca” exibição (ou coisa que o valha: fiquei emocionado ouvindo o Coral
de Cataguases enfrentar a Aquarela do Brasil: ou estou na fase cívica ou estou
devidamente apaixonado e me emociono com qualquer coisa). Dali fui para o
Restaurante Taramela e fiz o mesmo. Aproveitei e, com a devida licença de meu
amigo Ricardo Braga, sequestrei o Juarez, meu garçom de priscas eras & bares,
do Bar do Augusto ao famoso bar dos bandidos, ali na Rodoviária (pode me
chamar de “Brisa Noturna”). Que coisa mais simpática, o Juarez é o maior fã do
Carlinhos Vergueiro em Cataguases.
Bem, mudei de parágrafo porque o de cima
tava muito grande. Além disso, a Olivetti está quase caindo da cama, apesar de
escorada num livro da biblioteca de Rosário Fusco, pra ser mais preciso La
Peinture en France - Au Temps des Impressionistes – ainda não vi, ou li, mas
deve ser “o maior barato”, como diz o Pablo, deve ser “porreta”, como dizia a
Maria Bethânia nos meus tempos de Bahia, deve ser “cotuba”, com dizia o Oswald
de Andrade e o próprio Fusco.
Muito bem, todo mundo devidamente convidado,
o show devidamente anunciado, me mandei pro Colégio Cataguases, onde Carlinhos
Vergueiro já mandava brasa, em show “dedicado a ao Seu Hisbelo”, com seu
carro-chefe, como diz o Zé Maria de Abreu e Castro, o indefectível. Pois é,
Carlinhos, “nada pra beber/ nada pra fumar/ assim não dá”. Ainda mais que o
pessoal de Cataguases entendeu mal o que falei, e foi entrando assim como quem
não quer nada – oh inacreditável amadorismo empresarial o meu! – e ninguém
pagou o ingresso, apesar, acredito, da turma ter curtido adoidado as aventuras
musicais do “Cigano em Cataguases”.
Bubbaloo 6 Jornal Cataguases/
25.09.88
Ronaldo Werneck,
poeta e escritor
MG
https://ronaldowerneck.blogspot.com/
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