Biscoitos finos
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Crônica. Eis campo onde o Brasil já esteve melhor
nas paradas, tanto que ouso dizer que no momento muitos cronistas aparecem e
alguns com crônicas de uma nota só. Muitas vezes ameaçam sair do martelar
constantemente um assunto, só que estão procurando rodovias secundárias e
chegam, como nas suas demais crônicas, à Brasília. Não é que Brasília seja mau
assunto para crônicas, ainda mais agora, só que os acontecimentos por lá tanto
se repetem, que há que buscar outros delírios. E há cronistas que deixam
lacunas, quando suas digitações são interrompidas, valendo brigar com os fados
e reclamar, parou por que, por que parou. E culpo a ceifadora por três
lastimáveis deserções. Fernando Sabino, Rubem Braga e João Ubaldo. Qual o
melhor? Não cogito desta espécie de torneio. Medalho os três. De Sabino
reclamavam que fazia biscoitos, quando devia fazer bolo. Tolice, pois seus
biscoitos eram finos, afirmou, finíssimos aduzo e nem precisaria de bolo, quem
escreveu o romance “O instante perdido”. Este livro é uma espécie do “O
Retrato de Dorian Gray” de Oscar Wilde. Só escreveu um romance. Para que mais,
se Sabino e Wilde chegaram ao topo do romance. E viva os crocantes de Fernando
Sabino! De Braga se dizia tolice da grossa, quanto menos assunto tem, melhor
escreve. O gênio de Cachoeiro de Itapemirim trazia na sua cachola aquela
crônica dormitando e apenas a acordou com a graça e leveza de sempre. E
escrevia perto do seu jardim/pomar elevado, que criara e com sabedoria. Viveu
bela vida, ainda que todas acabem. Apenas perseverando viver por intermédio de
suas obras, feito ocorrido por todos que se destacam. Já o baiano Ubaldo foi
acusado de só falar de Itaparica. Mentira, andou por Ceca e Meca e deixou
crônicas notórias e se ao final foi muito à Itaparica e com um bando de
seguidores, que esperavam a viagem do próximo domingo, para ter notícias de
deleite. Quem não conheceu Zecamunista e seus desdobramentos, perdeu vaza de
conhecer tipo complexo e com idéias mirabolantes. E não se zanguem baianos, ou
moradores de Itaparica, a ilha de João Ubaldo era mais luminosa, risonha e
inventiva, que a real. E não há cronistas de boa escrita agora? Vide “O Globo”
e que tal ler Cora, ou Joaquim; E há cronista diário, que muito me espanta
pela criatividade, o cartunista Chico, que com suas charges pinta diariamente
o Brasil. Grifo. Diariamente. E há vários bons cronistas que jogaram a toalha,
pela angústia de não vir o mote para aquele dia e que a hora da entrega da
crônica lhes chegava e o parto/crônica não vinha. Mestre Drummond de Andrade,
na procura do assunto, viu pedra no caminho de sua crônica e foi à poesia.
Interpretado, decantado, teorizado o poema, danou-se, destruiu teses,
interpretações esdrúxulas e avisou. A pedra que havia no meu caminho era a
falta de assunto, que atravancava a crônica e que então exausto foi à
homenageava com verso. Drummond além de poeta, era ótimo cronista, diga-se e
vale ler a crônica “Um sábio discreto”, em que homenageou o cientista Helmut
Sick e com total propriedade e acerto. Enfim como tivemos confeiteiros
soltando biscoitos finos, muito finos. Aceito um pito final. Fui comedido em
excesso nas citações de cronistas atuantes e notórios e imperdoavelmente não
citei algum dos meus colegas da Rio Total, posto que me incluo quinzenalmente
entre eles e ainda sou do tempo que, de alguma forma, elogio em boca própria é
vitupério.
PS. já com a crônica pronta em 02/03/2021. E se disse que não nomearia
cronista colega, mantenho o prometido, visto que não citarei os da Rio Total e
os há ótimos. Lembre-se que não somos de rasga sedas! Só que após o número
deste 02 de março da Rio Total, anoto que a Editora Irene Serra nos sai de
biscoito muito fino e com crônica de muito gentil contexto. Obrigado.
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Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco.
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