Simpatias e antipatias
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Não sei se o politicamente correto vê com bons olhos antipatias. Podemos
ter? Todos teriam de mirar com olhos simpáticos todos! Beleza! Que o
politicamente vá para os quintos, pois é fonte de censuras, castrações,
injustiças, revoltas e principalmente hipocrisias. O riso é foco de muita ação
do politicamente correto, com censura velada e constante. Vou a exemplo
marcante com a obra monumental e especialmente televisiva de Chico Anysio.
Quais de seus formidáveis personagens passariam incólumes por esta vil censura
do politicamente correto? Será que o riso, a graça e a alegria são
politicamente incorretos? E Noel Rosa com a música do gago? Idem as populares
anedotas? Só sobrariam as de papagaio e assim mesmo se fossem inocentes. As
há? As antipatias podem ser constantes, ou fugazes e antipáticos podem virar
amigos e simpáticos nem conhecidos, às vezes, se tornam. Entra-se em novo
círculo de relações e simpatizo com Fulano, antipatizo com Beltrano, Sicrano
nem sim, nem não. E de repente meu maior amigo é Beltrano, com quem tenho
afinidades até clubísticas. Que não se leve antipatias a ferro e fogo e sem
valorizações excessivas, merecendo apenas deixar o tempo correr, que, levadas
aos extremos, antipatias, podem atrapalhar relações. Vou a exemplo literário e
pedras vão chover na minha cartola (homenagem ao dito Cartola). Não julgava
Vinicius de Moraes simpático, ainda que se esmerasse por ser. E sua obra?
Excelente e em todas as nuances poéticas. Em música popular ele e seus
importantes parceiros produziram obras inesquecíveis. Só que meu foco não era
quem se dizia o branco mais preto do Brasil etc (será que os do politicamente
correto recriminariam a própria classificação do Poetinha?). Deixo o diplomata
e fico e me fixo em Lupicínio Rodrigues. Além de não simpatizar com Lupicínio,
achava sua figura pernóstica. Até que fui à sua obra e o gaúcho se tornou
muito simpático e eclético. Lupi para os amigos e de vida tumultuada e com
rasgos de bondade, foi rei. Deixo o retrato e vou à obra, listando algumas
músicas, já que para citar todas não há espaço. Inicio por samba, que fica
entre os melhores do Brasil, 1- “Se acaso você chegasse”, gravação original de
Cyro Monteiro e com ritmo sensacional. Depois um tango, machista agora, normal
na época e no CD com interpretação notável de Cauby Peixoto, 2- “Vou brigar
com ela”. Ainda Cauby em 3 – “Ela disse-me assim”. Cauby foi das vozes mais
mal aproveitadas do Brasil e que pena. Final de vida de chorar. 4 –
“Felicidade”, conjunto vocal do qual participava Luiz Bonfá, os Quitandinha
Serenaders, conforme denominação de Carlos Machado para o grupo. Os
Quitandinhas levam bem a canção terna, tudo a ver com saudades. 5 – “Quem há
de dizer”. A que diz que “‘quando ela dança, todos com a mesma esperança,
sempre lhe lançam um olhar”, e já dissera antes que ela “ilumina mais a sala
do que a luz de um refletor”. Dor de cotovelo das brabas. Nem vou detalhar
mais as poética e sofridas letras, dando apenas o título da música, para
mostrar o valor das composições do simpático e de bigodinho Lupicínio
Rodrigues, 6 – “Nervos de aço”, 7 – “Vingança”, 8 – “Volta”, 9 – “Nunca”, 10 –
“Esses moços”, 11- “Minha história”, 12 – “Conselho”, 13 – “Brasa”, 14 –
“Cadeira vazia” e 15 – “Castigo”. Lupi usualmente compunha sozinho, tanto que
foi difícil ver o nome de seus parceiro, fato que lamento. E há muito mais
sucessos que assinou, interpretados pela nata dos cantores daquela época,
bastando citar As irmãs Batista, Linda e Dircinha, Nelson Gonçalves, Cyro
Monteiro (que show em Se acaso você chegasse, o primeiro grande sucesso
nacional do poeta da dor de cotovelo), Paulinho da Viola (Nervos de aço fica
ótima em sua voz), Trio de Ouro. E já ouvi Simonal dando ótima interpretação a
“Quem há de dizer”, Orlando Silva, Sílvio Caldas, Carlos Galhardo, Altemar
Dutra. E de quando em quando um cantor mais novo tira do baú uma Lupicínio
Rodrigues e mostra que sua obra por mérito venceu o tempo e continua sendo
cantada. Exemplos, Elis Regina em “Cadeira Vazia” e Adriana Calcanhotto,
“Loucura” e “Ela disse-me assim”. Valeu Lupicínio Rodrigues e valeu muito.
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pdaf35@gmail.com
Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco.
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