Dar certo, dar errado
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Conheceram-se, afinaram-se, tinham afinidades, eram da mesma sociedade, as
famílias estavam de acordo e chegaram ao casamento com as pompas necessárias e
juras de amor eterno. Sete meses depois contribuíram para mais um divórcio e
com as querelas de praxe, já que se formaram dois esquadrões e com esquadras
potentes, inclusive com assessorias jurídicas de relevo e com conotações
familiares. Ainda bem que não houve rebento e assim sendo nenhuma criança
sofreu. Crianças não sabem dividir lealdades e se pai e mãe se separam, de que
lado ficar? De preferência nos dois, ainda que no ardor das primeiras
batalhas, os que se divorciam, esqueçam-se do principal que compuseram, o
filho, ou os filhos. No caso presente não houve esta criança e menos mal. Só
que aquele casamento tinha tudo para dar certo e não deu. Alguns perguntam
nestas ocasiões porque não deu certo. Nos antigamentes muitos desastres
nupciais ocorriam face às divergências de alcova. Na modernidade esta fase já
foi vencida e não deve ser motivo, ou os motivos, do pronto desgaste. Ditado
antigo, quando se elogia o marido, a mulher só diz, mora com ele. É, morar,
conviver no dia a dia requer muito amor e muitas vezes nem este segura a
relação. Enfim o casamento de João e Maria deu errado. Está bem, prefere o
casamento de Maria e João, tudo bem. E enquanto ainda se preparava o casamento
de Maria e João, a família de João enfrentou em sigilo outro casamento, que
tinha tudo para dar errado. Ambas as famílias eram abonadas e por negócios de
parentesco. Uma no ramo dos massames, a outra na criação de gado. As duas em
escalas financeiras importantes. E se a de João era a que se dedicava à
criação de gado, havia uma fazenda, que era gerida por um tio solteirão, de
poucos estudos e que ficou por lá, vindo ao Rio para receber ordens, prestar
contas, muitas vezes levar reprimendas dos outros três irmãos, que de fato
cuidavam dos dinheiros e futuro da família. Então tio Juca era pau mandado e
pelo menos uma vez ao mês saía da fazenda e vinha ao Rio, ficando então na
casa do irmão mais velho e pai de João. Numa destas escapulidas Juca conheceu
moça e a apresentou à família, avisando e todos se espantaram, porque já
chegara aos sessenta anos e com proposta inequívoca de solteirice. Apresentou
a moça e a firma da família quis logo saber quem era aquela moça, de vinte e
sete anos, que se não era bela feito Maria, para Juca era areia demais. E o
setor encarregado da segurança da firma descobriu com facilidade que Angelina,
vulgo Angel, era garota de programa e o título dado era para pegar leve. Os
três irmãos se reuniram e contritamente foram dar a infausta notícia ao Juca.
E Juca sabia de tudo, Angel lhe contara e assim mesmo ia se casar. Os três
irmãos tentaram pôr juízo na cabeça do irmão e razões foram dadas. Juca, que
sempre ouvira admoestações de cabeça baixa, bateu pé, avisou que ia casar,
fazer festa, tinha dinheiro e pronto. Juca acedeu em fazer o casamento um mês
depois do de João e Maria. O casório aconteceria na cidade perto da fazenda.
Os irmãos pediram com medo do passado da noiva, que o casório não ocorresse no
Rio. Juca e Angelina acederam. Esta moça não aguenta a fazenda por três meses
e ainda vai pôr chifre no Juca. Assim aconteceu o casamento, não a traição e
dois juquinhas tiveram a feliz primeira infância na fazendo com pais
enamorados e sempre amorosos. Quando fizeram dez anos de casados e João já
estava no terceiro casamento, os três irmãos deram a mão à palmatória e então
aceitaram Angelina. Por que o casamento de João e Maria deu errado? Como o
casamento de Juca e Angelina deu certo? Mistérios nupciais.
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pdaf35@gmail.com
Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco.
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