PÓS FESTAS
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Há poetas que escreveram para eles, outros para os leitores e
alguns, sem saber, ou querer, para a posteridade. Entre meus poetas
conhecidos e louvados não estava Thiago de Mello e eis que me deparo
com. “Oh, como somos tristes. Tão terrivelmente tristes depois das
noites alegres.” Concordam que esta poesia fica para a posteridade,
sucinta e profunda. Tanto que permite conjecturas. Podemos pensar que
depois de uma comemoração e regada a álcool e alegrias, podemos até
não ter dor de cabeça e, mesmo se não deixamos percalços por atitudes
tomadas sub Bacco, pode bater certa melancolia pela perda da alegria,
que sentimos ontem. E nem quero falar no pós amor! Férias se prestam
muito a deixar um travo amargo, quando se volta, ainda que se goste do
trabalho usual. Para cair em comparação prosaica e corriqueira, as
férias são a cereja do doce, para quem gosta de cereja, no doce da
profissão. Quem não está de bem com sua atividade, então as tristezas
são maiores e de condoer na volta ao batente. Quem sabe o que o poeta
pensa, quando atira para a eternidade frase que dá margem a
elucubrações? Exemplo mais gritante foi o poema da pedra no caminho de
Carlos Drummond de Andrade. Tantas interpretações deram à sua pedra,
algumas cheias de desvãos psicológicos e até políticos, que o poeta
veio a público e avisou. Estava sem assunto e havia que escrever. A
falta de assunto era a pedra no caminho e que não lhe dessem
interpretações indevidas. De Thiago Mello qual era a pedra? O amanhã
de ontem de festa mesmo, ou quem sabe pensava na mocidade, a festa e a
vinda dos anos e por fim a velhice. Está em moda e provavelmente com
razões de peso, tirar pesos da velhice e com ações positivas em meio a
eufemismos insuportáveis. Acho ótima a ideia de tapar sol com peneira.
Quando se emprega a tola mensagem e para quem está com neurônios
saudáveis e críticos, nunca se tapa sol com peneira e não me parece
saudável tentar engambelar os que não são tolos. Fica lamentável. A
terceira idade é a melhor idade. Vaia estrepitosa. Portanto há que
ficar triste, mesmo se a vida foi mais alegre que triste. Fica bonito
em bossa nova e me parece verdade, “tristeza não tem fim, felicidade
sim” (Tom Jobim), ou ainda a “Azul da cor do mar”, onde o Síndico Tim
Maia avisava “que uns nascem pra sofrer, enquanto o outro ri”.
Infelizmente nenhum outro ri sempre e há até uma espécie de melancolia
no pôr do sol. Já o nascer do dia é radiante. E a crônica, se é que é
crônica, caminhava para passos nostálgicos, quando ainda estamos na
festa. Isto é, respiramos. E todos devem contribuir para que ela,
festa, perdure. Acredito até que os caçadores de votos devem ter este
cuidado, até porque o povo os paga para manter o circo. Oh caçadores,
não façam a patuleia chorar.
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Comentários sobre os textos podem ser enviados ao autor, no email
pdaf35@gmail.com
Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco
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