A crônica se inicia a partir de brinde
|
|
Havia casa de vender guarda chuva, A Insinuante, que em dias
da semana, se o aniversariante a procurasse e era no Centro do Rio, no
dia comemorativo e com comprovação da data, ganhava um brinde. E nossa
heroína era levada e, muito feliz, recebia o modesto brinde. Família
pobre? Não. Pai no negócio de vidros e mãe dona de casa. A menina
tinha irmão mais velho. Casais portugueses e em geral europeus
tradicionalmente dão mais ênfase ao primogênito. E se a menina era
cuidada no atacado, o mesmo esmero não havia no varejo. Aos quinze
anos ensaiou ter festa e o pai ofereceu pôr um barril de chope no
quintal. O barril a fez desanimar da festa. Pensou e com razão que os
colegas do Instituto La-Fayette seriam convidados e os alunos do
conceituado colégio, da Tijuca e adjacências, não casavam bem com
festa de barril de chope. Voltemos aos seus cinco anos e morava no
Centro da cidade nesta época. Colocaram-na em escola onde vários
níveis se juntavam e a professora logo no primeiro dia deu uma varada
em um aluno (estava em 1940) mau comportado. A menina fugiu da escola.
Quando a levavam, fugia. Enfim prometeu que se fosse para outra
escola, ficaria. Saiu de morar no Centro e foi para a Tijuca e para o
Instituto La-Fayette. Já lera sua primeira palavra. O “guilobo”. Na
escola disse bassoura (portugueses fecham o v, que parece b) e os
colegas riram. É vassoura! Daí em diante e por 13 anos, do jardim da
infância aos 18 anos no clássico, ninguém mais riu dela. Sempre
primeira aluna. E no La-Fayette, de ótimas memórias para ela, no final
do primeiro ano do clássico conheceu seu primeiro namorado, que
cursava o primeiro científico. Aguentou-o de setembro a dezembro,
vieram as férias e vendeu seu passe em março. Um chato. E nem mais se
cumprimentavam. O chato nem queria cumprimentá-la. As turmas se reúnem
para a formatura. Aceitou de novo o chato em lance que merece história
especial. Formam-se. Vai seguir Letras NeoLatinas. Ele Engenharia. O
chatíssimo pede que não siga carreira e seja dona da sua casa.
Incrivelmente cede e aí passa cerca de dez meses em Portugal na quinta
da avó. Muitas brigas por cartas. O chato continuava ciumento. Voltam
e se casam. Ele mudou de carreira, trabalha e estuda. Ao menos é
esforçado e fiel. Ele diz que sem a ajuda dela, não conseguiria se
formar em Medicina. Moram com os pais dele. Sogra e nora, vai parecer
patranha, viram mãe e filha e o marido era filho único. Ao casar
pensa, se não vou fazer carreira de magistério, vou ser a melhor dona
de casa. Foi. Exemplos. Sogra internada 40 dias em hospital. Heroína
ao lado e sai apenas por 3 horas. O filho fica e a enferma avisa que
ele pode saber Medicina, de cuidar de doente nada sabe. Dois netos
moram em São Paulo e por fim os três netos, dois SP e um RJ, ficam de
novembro a março com a Vovó Leca. Em julho também com ela. No início e
no meio do ano em Petrópolis, onde têm casa de veraneio. Os netos
adoram Vovó Leca, muito mais que ao vovô. Os paulistas se mudam para o
Rio. Neta Mariana não tivera francês no primeiro semestre e a turma do
Rio teve. Vovó Leca fizera Aliança Francesa, até o Nanci e logicamente
em primeiro lugar. Foi mês de julho de intensivo francês. Já cuidara
da instrução dos filhos, Denise, engenheira química, Carlos Diniz,
médico e os ajudou com muito esmero. Ah os trabalhos de grupo sempre
na casa do Grajaú. Mariana se apresenta na nova escola e está
preparada em francês, mais que a turma, que tivera um semestre no
idioma, avisa a professora. Vovó Leca pinta aparelhos de jantar em
porcelana para Denise e Carlos Diniz e até quadros, faz a capa do
livro de crônica do marido, “Casarios”. Pinta o Hospital Gaffrée e
Guinle a bico de pena e serve para a capa para livro sobre o Prof.
Fioravante Di Piero. Faz a revisão de tese de mestrado para amigo do
marido, serve de copy desk para as inúmeras publicações do mesmo.
Ficaria contando e contado suas proezas em prol dos seus. Foi ótima
nora e acho que Jorge e Eugenie também não têm que reclamar da sogra.
Paro nos encômios e emocionado. Não haverá brinde na Insinuante neste
aniversário, apenas uns mimos. Vovó Leca faz 82 anos, comemoração em
Itaipava, na Pousada Altenhaus. Em fevereiro de 2018, sob as bênçãos
de Deus, farão bodas de diamante. Quem assina esta crônica e
emocionado? Logicamente o chato.
–––––––––––––––––––––––––––––––
Comentários sobre os textos podem ser enviados ao autor, no email
pdaf35@gmail.com
(1º de novembro 2017)
CooJornal nº 1.051
Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco
Direitos reservados. É proibida a reprodução deste artigo em qualquer meio de comunicação,
eletrônico ou impresso, sem autorização do autor.
|