Angenor de Oliveira
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“Vai reduzir as ilusões a pó.” – O mundo é um moinho.
“No que se apresenta/ o triste se ausenta.” – Corre e olha o céu.
“E o seu pranto, oh!/ triste senhora/ vai molhar o deserto.” –
Disfarça e chora. “Só não sofre quem não ama.” – Vai amigo.
“Será que amor por ironia/ move esta fantasia vestida de obsessão.” –
Senhora tentação.
Muito poeta, acadêmico, ou imortal,
devia tirar a cartola para Angenor de Oliveira. Poeta de poucos
estudos formais, vida complicada e até expulso de casa pelo pai aos
dezessete anos, face à sua boemia, vivia poesia. E sendo alguém e é,
tem seu folclore e vou de fatos e lendas, para trazê-los à crônica.
Comecei com frases poéticas de Seu Angenor. Será que o pai queria
Agenor e o do cartório se fez de engraçado? E fui aos versos e faltou
a música. Estes caras da antiga MPB são tão bons, que casam música e
letra e aparecem maravilhas. Cartola usava um chapéu, para que os
respingos de cimento não lhe sujassem as madeixas. Era ajudante de
pedreiro. E de gozação o chapéu virou cartola. E Cartola vive com Dona
Deolinda, que lavava roupas para fora. Depois é que veio Dona Zica.
Cartola morto, muito Dona Zica apareceu e desmaiou. Como desmaiava
Dona Zica! Tiveram bar noturno na Rua da Carioca, Zicartola, com
muitos clientes ilustres, só que boêmios não são bons de
contabilidades e em dois anos o Zicartola fechou por problemas nas
contas. Devia aceitar muito pendura. Ouvi pela primeira vez “Tive sim”
na voz de Dona Ivone Lara. “Tive sim um grande amor, antes do seu,
tive sim”. E Cartola contava que nos dois lares havia alegria, só que
comparar amores, seria o fim, “vou parar, pois não pretendo amor te
magoar”. Interpretações livres, ainda que comparar amores seja
difícil, porque não há amorômetros. E “As rosas não falam”. Dona Zica
plantou rosas, que logo desabrocharam e lhe perguntou por quê?
Resposta. As rosas não falam. Frase na cabeça e nasce das mais lindas
músicas do cancioneiro brasileiro. “Apenas exalam o perfume que roubam
de ti”. Disse também que o mundo é um moinho, verdade, só que para ele
foi mais gangorra, que moinho. Meio alto, lá em baixo e vem uma das
maiores obras do bom Stanislaw Ponte Preta (Sérgio Porto, o das
certinhas do Lalau). Ipanema, noite e Seu Angenor lavava carros.
Sérgio o reconhece, põe a boca no mundo e levanta a vida de Cartola,
doente e no “miserê”. Gangorra sobe e não mais cai. Ainda bem. Todos
voltam a cantar Cartola, que também canta e encanta. Sete dias antes
de morrer, avisou, "no meu enterro quero Waldemiro tocando bumbo".
Waldemiro tocou. Muitos anos antes dois amigos no Carnaval sambavam no
Bloco dos Arengueiros. Carlos Cachaça e Cartola eram amigos e
arengueiros. Nasce do bloco a Estação Primeira de Mangueira de tantas
glórias entre as escolas de samba. Angenor, tricolor de coração, não
colocou verde e grená, só que ficou perto, verde e rosa são as cores
que escolheu para sua escola. Grande escolha, Sambista. Nariz com
problemas por doença e Dr. Ivo Pitanguy faz o que pode. Quantos
importantes procuram Cartola! Dias antes de morrer recebe Carlos
Drummond de Andrade. Poeta reconhece poeta! Cartola nasceu em
11/10/1908 e encantou em 30/11/1980. No seu caixão a bandeira do nosso
querido Fluminense Futebol Clube! Ainda agora Teresa Cristina e
Carlinhos Sete Cordas, estamos em 2017, trazem CD com músicas de
Cartola e com três, que Cartola gostava de cantar, ainda que fossem de
autores amigos. Bom de ouvir este CD. Teresa e Carlinhos me têm
acompanhado no automóvel nestas manhãs. Era muita notícia de malfeitos
logo pela manhã e troquei a ótima CBN pelos CDs. Hoje pela matina fui
de CD com Teresa Cristina, amanhã penso ir com a voz do próprio
Angenor de Oliveira e seus sucessos, que também há em CD. O homem
morre, suas obras persistem, quando merecem. E Cartola merece.
Obrigado, Sérgio Porto.
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(15 de outubro 2017)
CooJornal nº 1.049
Pedro Franco é médico cardiologista, Professor Consultor da Clínica Médica C da Escola de Medicina e Cirurgia
da UNI-RIO. Remido da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Professor
Emérito da UNI-RIO. Emérito da ABRAMES e da SOBRAMES-RJ.
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco
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