01/02/2015
Ano 18 - Número 922
ARQUIVO
PEDRO FRANCO
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Fotografia: "Eu, você, nós dois/ Aqui nesse terraço à beira mar/ O sol já vai
caindo/ E o seu olhar/ Parece acompanhar a cor do mar/ Você tem que ir embora/
A tarde cai/ Em cores se desfaz, escureceu/ O sol caiu no mar e aquela luz/ Lá
embaixo se acendeu/ Você e eu/ Eu, você, nós dois/ Sozinhos neste bar à meia
luz/ E uma grande lua saiu do mar/ Parece que este bar já vai fechar/ E há
sempre uma canção para contar/ Aquela velha história de um desejo/ Que todas
as canções têm para contar/ E veio aquele beijo, aquele beijo". Antônio Carlos
Jobim.
Esta não é das músicas mais comentadas do Tom Jobim e no entanto é das
mais gravadas. João Gilberto, Dick Farney, Nara Leão, Elis Regina, Gal Costa,
Silvinha Teles, Ella Fitzgerald (Photograph), o próprio Tom e quem sabe outras
gravações existam. Por que tantos cantores escolheram? Perguntei-me e fui
verificar. E comparo-a ao conto "Missa do Galo" do mestre Machado de Assis.
Não dizem e dizem. São ternamente eróticos, sub-repticiamente eróticos, cada
um no seu campo/tempo e ao seu jeito. Vou fugir de comparações e ficar na
"Fotografia", título à primeira vista algo distanciado da letra, talvez
utilizado por falta de outro. A música fala de um amor, que não fica, que tem
que ir e os amores, que tem que ir, são melancólicos e tristes, ainda que
ganhem uma áurea de beleza. "Você tem que ir embora e a tarde cai." Os dois
estão sozinhos em um bar, que vai fechar e a lua nasce. Bar poético, que fecha
quando a lua nasce. Seria ela casada? Algo entre ingênuo e escuso acontecia.
Depois fala em desejo e o fecho da música é um beijo. E que beijo, citado duas
vezes. Alguém mais novo vai pensar logo, que ele e ela deveriam estar em um
motel e com, ou sem, beijos, atingir os “finalmentes”, ao invés de olharem
pesarosos à tarde que caía, para dar lugar à lua, que nascia do mar. E os
olhos dela eram da cor do mar. Como é difícil explicar para os da geração do
"ficar", as nuances do amor, o flerte, o pegar na mão, o romantismo, a
progressão lenta do desejo, as dificuldades do amor, a conquista progressiva,
alicerçada nos ais do coração, o primeiro beijo, aquele beijo! Quem era
ela? Para quem Tom fez a letra e a música? Ou eram apenas artes musicais de um
poeta? Creio, por vivências e dificuldades de amor também, que houve aquele
bar, a tarde caía e ela iria partir e houve aquele beijo. Depois... Sempre se
tentava um depois e acredito que era muito mais glorioso, do que é nestes
“macdonáldicos” dias. É, talvez "Fotografia" tenha sido um bom título. Flagrou
um momento de amor e elas, fotografias, tornam eternos minutos tão queridos,
quão raros, para quem os viveu. Parece que o mundo para e estamos os dois,
livres e independentes de tudo e todos, por um momento, pairando, ainda que
você tenha que partir depois. E há esperanças de outras tardes, "eu, você, nós
dois".
(01 de fevereiro/2015)
CooJornal nº 922
Mensagens sobre o texto podem ser enviadas ao autor, no email pdaf35@gmail.com
Pedro Franco é médico cardiologista,
contista, cronista, autor teatral
Conheça um pouco mais de Pedro Franco
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