11/01/2013
Ano 16 - Número 822
ARQUIVO
PEDRO FRANCO
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Recomendações: quarenta minutos
diários, ao menos quatro vezes por semana em dias não consecutivos, se o
médico aconselhar. Quem anda todos os dias, ou faz sempre exercícios, deve ter
folga de um dia por semana, para o corpo recuperar-se. Andar na hora adequada,
idem tênis e roupa. Chega de recomendações. Ipod com músicas de que gosto.
Começo com Dick Farney e Lúcio Alves em “Tereza da Praia”, depois “Trem Azul”
em francês. Quem bem canta? E um rapaz na esquina reboca um velhinho
titubeante. Parecem neto e avô. E uma pergunta invade-me, ainda que saiba que
não tem resposta. Devia aceitar minha insignificância e apenas caminhar e
ouvir música? Por que muitos têm que acabar assim? Alguns dignos e dignas
perdem até a dignidade! Em seguida uma senhora baixa e gordinha pergunta à
moça, que corre, como se vai para a Pracinha. Para, é atenciosa e explica. Ir
e dobrar a esquerda. É logo ali. A moça de cabelo em rabo de cavalo sacudindo
ao vento vai-se. Em seguida a velhinha faz-me a mesma pergunta. Nova
explicação, agradecimento e tenho novas perguntas internas. É hoje! Assim não
dá para gozar a caminhada. Já chega fugir das sujeiras das calçadas e seus
buracos. E chego à Pracinha. Muitas crianças e esta cena de crianças andando,
pedalando, comendo, rindo e até chorando de birra, alivia. Domingos pode-se
caminhar no meio da rua em volta da pracinha. Asfalto plano e sem dejetos de
cachorros. Passo pela igreja. Há cerca de setenta anos lá fiz a primeira
comunhão. Vá ser fiel a um bairro assim na China! Muitas casas sofrem
necessárias obras, mansões antigas são recuperadas e isto revitaliza o bairro,
que por sorte teve seu gabarito de prédios diminuído e pouco se constroem
edifícios. Que nenhuma “maracutaia” política venha deixar construírem novos e
altos edifícios no bairro. Tomei água de coco no Guerreiro, que não sou de
ferro. Bate brisa e melhora a caminhada. Há flamboyants florescendo. E quando
tudo parecia andar em céu de brigadeiro, vejo um antigo morador com o filho.
Filho deficiente, agora maior que ele, que minguou, sendo passeado e com muita
dificuldade para o pai. Sei que moram em apartamento e conta a crônica do
bairro que de família só os dois. Vem outra pergunta chata. Aquele homem pode
pensar em morrer? Passa um casal com lindo filho pequeno. Veste a camisa do
Fluminense. Digo-lhe tetra e o menino cai na gargalhada. Valeu! Perto da
pracinha há casa que todos os anos cria o que podemos chamar de vitrine de
Papai Noel. É ponto de parada para as crianças do bairro no dezembro. Lembrei
que já levei uma pediatra, um advogado e um engenheiro a ficar em frente à
casa e neste ano, ainda no século XX, Papai Noel respondia aos trejeitos das
crianças. Os três pequenos vibraram! Vou lembrar-lhes aquela aventura do avô
com os três netos pequenos. Viva esta casa e seu dono inventivo e natalino!
Troquei papo com o jornaleiro e com o Reginaldo segurança, ambos flamengos,
mas sem excessos e podemos brincar tranquilos. Passou um velho de bicicleta,
camisa do Flu/Unimed à brisa e não pude deixar de dizer-lhe tetra e recebi
largo sorriso. Que não fosse perder o equilíbrio e comprar terra. Tim Maia
cantou “A Rã” e depois Elis “Atrás da porta”. Quando cheguei à porta do
prédio, em frente à casa, onde morei por mais de sessenta anos, Adamo ia
começar “C´est ma vie”. Perguntam-me, não sente falta da casa. - Não, chego na
janela! Desliguei o ipod. Salvatore Adamo fica para amanhã, que já caminhei
por quarenta minutos. Onde? Ora, no Grajaú.
(11 de janeiro/2013)
CooJornal nº 822
Pedro Franco é médico cardiologista,
contista, cronista, autor teatral
pdaf35@gmail.com
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