16/07/2022
Ano 25 Número 1.280
Arquivo
Odete R. Baltazar |
Odete Ronchi Baltazar
A MENINA DOS LIVROS
|
|
Minha paixão pelos livros vem da infância, quando o que tínhamos
para ler era somente a cartilha da escola. Lia e relia a cartilha o tempo
todo. Tanto li que decorei certas lições.
Mais ou menos por essa época
(idos anos 60), as Irmãs Paulinas iam de casa em casa vender livros e eu me
lembro que a minha mãe comprou-me um que tinha como título "O pequeno
Henrique". Para minha irmã comprou "A cega de Sorrento". Por muitos anos esses
foram os nossos únicos tesouros que se juntaram a outros, recebidos ao fim do
ano como prêmio de primeiro lugar na turma. Lembro dos títulos "Os dois
cavalinhos" e "O prisioneiro da montanha" de Fidélis Dalcin Barbosa.
Depois vieram as enciclopédias que eu amava de paixão e folheava sem parar...
E mais tarde, na adolescência, pude participar da Biblioteca das Moças, onde
podíamos pegar emprestados um livro por vez, a cada semana. Como a minha irmã
também pegava um, acabávamos lendo dois livros por semana porque nos revezámos
com a leitura.
Nesta época li todos os grandes romances do
cristianismo, as Mulherzinhas de Louisa May Alcott e tantos outros que nem
lembro mais... Anotava todos os títulos que lia em uma lista que acabei
perdendo depois...
Como era difícil adquirirmos os livros, íamos
emprestando de um ou de outro.
Lembro que costumava frequentar
assiduamente a biblioteca do colégio das freiras, o MTM, de Criciúma, onde eu
fazia o Colégio Normal. Chegava cedo unicamente para desfrutar de uns minutos
de tranquilidade a sós com os amados livros. Qualquer horário vago eu ia para
lá, para o meu refúgio.
Agora que ficou mais fácil a compra de livros,
fico embevecida, quase em transe hipnótico quando entro em uma livraria. Fico
em estado de euforia e acabo levando muitos e muitos livros. E me deleito a
folheá-los e a cheirá-los com carinho.
Na minha cabeceira tenho vários
livros que leio toda noite. Gosto de manuseá-los, escrever neles, anotar nas
páginas, marcar como se fora um sinal. Meus livros são verdadeiros diários.
Contam segredos.
Os livros da Cecília, por exemplo, têm anotações em
quase todas as páginas e as datas sucedem-se, mas os sentimentos permanecem
porque eternos como a palavra impressa.
E uma outra coisa: adoro reler
os livros. Uma, duas, três vezes. Têm livros que estão na casa de praia e que
releio a cada verão. Não me cansam e a cada leitura descubro novos elementos.
Livros de poesia são um caso à parte, pois fazem parte de mim. Vão comigo
por onde eu vou. Amo cada página, cada poema, cada verso, cada palavra. E
todos estão marcados, assinalados para sempre.
Nem me importo com os
críticos que dizem que preciso cuidar do livro e não escrever neles... E desde
quando escrever no livro é algum ultraje?
O livro é meu e eu o amo com
meus sinais e minhas marcas. Eu dobro a página, faço orelha, escrevo e vivo
cada página.
Eu me transformo com o livro e o livro muda comigo . Somos
seres em mutação. Um livro sem marcas é um objeto sem vida. Os meus falam
através de cada marca que fiz.
O que dirão meus netos quando lerem os
livros de sua avó, cheios de anotações que contam seus segredos?
(01 de julho/2006) CooJornal no 483
Odete Baltazar é escritora e poeta SC
Direitos Reservados
É proibida a reprodução deste artigo em
qualquer meio de comunicação eletrônico ou impresso sem autorização do
autor.
|
|