Tempos
bem antigos. Segundo um saudoso morador do lugar, o que vou lhes narrar
aconteceu na cidade fluminense de Macaé. Não se deve acreditar nos fatos ao
pé da letra, mas foi como me chegou aos ouvidos a narrativa de um tio-avô,
Manoel Rousseau Valença, alcunhado Manequinho...
Acabara de chegar num
trem expresso (Estrada de Ferro Leopoldina Railway) um passageiro que a
todos perguntava pela residência de um seu amigo chamado Antônio. Chegou-se
ao Chefe da Estação, fez uma possível descrição do procurado, e obteve uma
orientação:
- Aquele moço ali, o João Coleiro, conhece todo mundo, ele
deve saber...
Agradeceu, e se dirigiu à pessoa apontada. Depois de lhe
descrever os aspectos físicos e outras minúcias da figura do tal amigo,
recebeu, finalmente, um esclarecimento:
- Ah... sei quem é... É o Antonio
Sabiá, mas não sei onde ele mora, não... Ah... espera aí...
Passava
naquele instante um carregador de malas:
- Êi, psiu, ô Nilo Pavão, você
sabe onde está morando o Antonio Sabiá?
- Sei! Após pensar um pouco,
o Nilo sugeriu:
- Mas é melhor ir de carona no carro do Papa-Capim que
mora lá por aquelas bandas também!
E lá foi o velho automóvel se
arrastando pelas ruas da encantadora cidade, em direção à Colônia de
Pescadores. No meio do caminho lembrou-se o nosso viajante ter deixado malas
e sacos no Departamento de Depósitos da Estação. Aquietou-o, então, o
Papa-Capim dizendo que podia deixar, que o seu amigo, o Coruja, iria lá
buscar sua bagagem.
Enfim, chegou à casa do amigo, onde, após os efusivos
cumprimentos, o acomodaram num pequeno mas confortável quarto. Mais tarde,
saíram os dois para um passeio pela cidade, percorrendo várias ruas
centrais, de interesse comercial. Ao chegarem à rua Direita, o visitante
cismou em entrar numa casa de engraxates. No entanto, o Antonio desviou sua
pretensão:
- Pera aí, pera aí! Aí não, lá perto da minha casa fica a
lojinha do Tsiu. Ele é um bamba na graxa! Você vai gostar!
Depois, o
viajante puxou outra ideia:
- Ô Antônio, tenho vontade de comprar umas
conservas para levar pro jantar lá de casa! Tem gente boa nisso por aqui?
- Vamos ao Armazém do Passarinho... ele tem artigos de primeira e... mais
baratos! É de confiança!
Prosseguiram a caminhada e foram até o Mercado
Municipal escolher uns peixes na barraca do João Jacaré. Este se desculpou
por não possuir estoque recente e sugeriu que eles fossem até a barraca do
Tulio Bacurau que talvez ainda tivesse peixe daquela manhã... Saindo do
Mercado, o Carlos (era este o nome do visitante) passando a mão pelo rosto e
pelo queixo, avaliou:
- Agora eu preciso de uma boa barba! Vamos até
ali...
- Ali não – interrompeu novamente o Antonio - é muito careiro!
Olhe para aquela esquina lá... naquela salinha está o meu grande “chapa”, o
Bentevi!
Carlos já estava cismado diante de tantos nomes de pássaros, mas
não se manifestou. Fingiu não se surpreender, não estranhar esse detalhe.
Resolveu ficar quieto. Pouco depois, ante a uma repentina dor de cabeça,
apenas indagou ao amigo Antonio:
- Tem alguma farmácia boa aqui perto?
Estou com pequeno enjoo, meio tonto...
- Oh, isso não é nada! Deixe
comigo, Carlinhos!
Antonio, então, procurou a esposa nos fundos da casa:
- Mulher, mulher, me ajude aqui... Vá depressa chamar a D. Rola para dar uns
passes no nosso amigo que não está passando muito bem!
Enquanto isto, o
Carlos se arriou numa poltrona e, meio intrigado, não se negou a consultar,
muito jeitoso, o Antônio:
- Afinal, meu amigo, venha cá, venha cá e... não
vá se ofender, não vá se ofender, mas, cá entre nós, me tire uma dúvida:
isso aqui é uma cidade mesmo, ou...um grande viveiro de passarinhos?
Em homenagem à cidade de Macaé, RJ, terra dos meus ascendentes, os
Rousseau-Valença.
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miltonxili@hotmail.com
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