... em que, superando os vendedores
ambulantes com seus costumeiros balaios de produtos hortigranjeiros e
frutíferos às costas de cavalos e burros, o japonês Sukessa Nakao encostou
seu caminhão na cabeça-sul da ponte municipal e passou a monopolizar,
enquanto esteve na cidade, a venda de grandes e belíssimos tomates
cultivados nas terras dos Athayde; em que as estampas que acompanhavam o
então popular sabonete Eucalol (trazendo, no verso, informações culturais)
viravam objeto de curiosidade e troca entre os jovens estudantes; em que
também os sabonetes Lifeboy ofereciam prêmios a quem encontrasse uma chave
no seu interior; em que a divulgação dos próximos filmes a serem exibidos na
cidade era na forma de papéis-cartões de várias cores, onde “matinées” e
“soirées” eram cuidadosamente especificadas; em que as revistas Tico-Tico e
Vidas Infantil e Juvenil foram preferências de crianças e professores, antes
da chegada dos “agressivos” (à época) gibis; em que apareceu a moda do uso
das bicicletas, revolucionando a ligação casa-escola de muitas crianças e
sendo introduzidas, pelos mais ricos, nos festivos e festejados desfiles
escolares dos Dia de Cachoeiro e da Independência; em que, nestes desfiles,
Liceu e Escola de Comércio se esforçavam pela melhor exibição, dentro de uma
rivalidade autêntica, constante, mas sadia; em que se se ouvia a passagem
inesperada e barulhenta da motocicleta do Murilo Sampaio, com a inédita
acomodação lateral de um passageiro; em que os guarda-chuvas eram chamadas
de “sombrinhas”, e até, nos agressivos verões, de guarda-sóis (???); em que
as crianças tinham medo da grande imagem do Nosso Senhor dos Passos, lá num
canto direito e escuro da Matriz (Velha), de cuja cabeça desciam enormes e
fartos fios de cabelos naturais que lhe encobriam o rosto; em que, nos
casamentos, ainda não existentes os “flashes”, o (a) fotógrafa (D. Amélia
Viana/e outros)) acionava disparadores remotos a cabo, provocando um clarão
produzido por pós de magnésio inflamáveis, sucedido por uma fumaça escura
que se elevava no ambiente! (Indagação toda minha: isso poderia explicar os
olhos espantados dos noivos na maioria das fotografias?); falando-se em
casamentos, comentava-se: “Sol com chuva, casamento de viúva; chuva com sol,
casamento de espanhol”l; em que se fundou um Aeroclube; em que os aviões da
NAB - Navegação Aérea Brasileira começaram a sobrevoar a cidade, facilitando
ligações com Vitória e Rio de Janeiro; em que o embarque nos trens da
Estrada de Ferro Leopoldina Railway era o mais procurado meio para se chegar
ao Rio de Janeiro, então capital federal, através das composições chamadas
“expresso” , que partiam, diariamente às 5h30 da manhã, e as do “noturno”,
com carros-leitos adicionados em Campos dos Goitacazes (RJ), que vinham de
Vitória, em dias determinados, alcançavam a cidade às 16h30, e seguiam
para o Rio, após procedimentos de embarque e desembarque de pessoas e
mercadorias; em que, nas únicas linhas de ônibus municipais que faziam então
os itinerários Ilha-Coronel Borges e Aquidabã-Bahiminas, o “trocador”,
quando chegavam no último ponto, se levantava e alertava: “- Ponto final,
faz favor as fichas!” (... de plástico-sistema de controle da contabilização
final dos pagamentos e passageiros na época); em que jornaleiros jovens
apregoavam por nossas ruas jornais da cidade e os do Rio de Janeiro (um dia
de atraso, porque vinham de trem); em que, para se comunicar com pessoas em
outras cidades, tínhamos que acorrer ao único prédio da Telefônica, lá no
alto da rua Costa Pereira, onde, sentados, aguardávamos o chamado da
telefonista para ingressar e falar numa cabine; em que o trânsito de carros
era, nas noites de domingo, após a última sessão do cinema Central, impedido
na Praça Jerônimo Monteiro para permitir o livre passeio, em sua rua
principal e arredores, de ricos e pobres, incentivando, muitas vezes,
aproximações sentimentais... promessas de futuras famílias; em que
personagens de rua, desassistidos, mendigavam esmolas às casas e lojas
somente nos sábados; em que os namorados noturnos “mais assanhados”eram
convidados a passear no carro da polícia, apelidado de “Mamãe Carinhosa”
até... ouvir certos conselhos nas dependências “mais calmas” da Delegacia...”
Ponto possivelmente final: não vou lhes fornecer o número da minha
sepultura, para, como costumavam no meu tempo, os conhecidos nele apostarem
no jogo do bicho!
Minha cautela, gente: já procurei saber como é essa tal
de cremação! Só sei, hoje, que é um calor de matar! Não tem jeito: como nos
aconselham as orientações éticas e religiosas, fechem os olhos, porque temos
aí que obrigatoriamente, tirar (ou nos tirarem) a roupa, e sintam, depois,
um certo cheiro de churrasquinho, ou moqueca... possìvelmente capixaba...
Enfim, adeus, conterrâneos e outras simpatias! Como me aconselhou o
perspicaz poeta Manoel Bandeira, “Vou-me embora para Pasárgada”, onde serei
amigo do Rei...” (leiam a poesia, por favor, e me entendam!).
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