01/06/2024
Ano 27 Número 1.369
ARQUIVO
MILTON XIMENES
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Milton Ximenes Lima
ANTIGOS DOMINGOS DE SOL MAIOR
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Parabéns, Cachoeiro, 157 anos de emancipação em maio de 2021.
Desde a infância aprendemos que o domingo era dia especial, um dia para ser
festejado, dia de alegria maior, dia de encontros com os coleguinhas de rua,
ou com os familiares.
Lá em Cachoeiro de Itapemirim, a partir dos
meus nove anos, me levantava às cinco da manhã para “pegar a missa” das
cinco e meia na então Matriz de Nosso Senhor dos Passos, bem defronte à
nossa casa, e, depois de um reforçado café, me dirigia à quadra de tênis
construída ao lado da casa dos vizinhos Semprinis, lá na rua Don Fernando. O
Zezinho, funcionário da Papelaria Semprini e responsável pela conservação do
local dos jogos, me convidara para a novidade de ser “catador de bolas”.
Chegava lá assim, mais cedo, atendendo à ansiedade dos jogadores que
pretendiam iniciar logo seus embates, mas assim também tinha minha
recompensa ao final dos jogos, lá pro meio dia ou mais: a minha “gorjeta”
era mais engordada a cada jogo que se acrescentava... Os jogadores, então,
ficavam atentos às quantidades de atuações dos “catadores” que ali chegavam
depois de mim, principalmente o “Seu” Semprini, “dono” da quadra, e
responsável pelo controle da frequência de atuações dos outros meninos,
merecedores de menores quantias. Soube lá que meu pai fora adepto do
esporte. (Estava aí explicada a existência daquela raquete abandonada sobre
o armário do quarto do ex-casal). Novamente em casa, banho tomado, entregava
os “trocados” lá apurados à administração da minha mãe que não me recusava,
depois, a uma ajuda para frequentar o Cinema Central, ou comprar miudezas
infantis.
Às vezes, quando a família tinha tempo maior para se
curtir, também planejava visitas a familiares e a lugares de lazer da
cidade, principalmente o espaço arborizado da grande Ilha da Luz e suas
águas mais tranquilas das prainhas do seu entorno, ou as das pequenas
piscinas “encachoeiradas”. Em havendo tempo, passava-se a tarde ali, entre
folguedos e comes e bebes. Só me amedrontava com a travessia das pontes,
lados norte e sul, um tanto precárias, que até lá nos levavam, e a gente
vendo, com receio, entre as tábuas do seu chão, o rio Itapemirim profundo e
apressado.
E depois, então, nos aboletávamos no ônibus Ilha-Coronel
Borges até as paradas da rua Moreira que nos aproximavam da caminhada até lá
em casa.
Como natural, a cidade cresceu e a elite construiu um belo
clube no seu lado sul, onde as quadras de tênis não foram esquecidas no
projeto e foram preenchidas por jogadores/admiradores de uma nova geração.
Ali, lá de cima da montanha do Clube Jaraguá, muitos anos depois,
contemplo a agora vasta paisagem que se me oferece, desde os seus casarios,
antigos ou novos (e altos), o seu rio fragmentando o coração da cidade, e,
ao longe, lado direito, as pedras famosas do Itabira e do Frade e da Freira
teimosamente se oferecendo contra o belo dia azul de um céu de inverno.
Fotografias minhas em cima de tudo isto: são futuras ilusões táteis para
machucarem e ressuscitarem as muitas lembranças preciosas da minha terra...
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Fiquem frios, agora, meus caros... cá entre nós, atenuem minha abordagem
sentimental acima para o que lhes vou revelar. Descobri, nessa minha última
viagem de saudades, que o espaço da antiga quadra de tênis foi simplesmente
preenchido por um... salão/ templo religioso...
Página virada,
amigos: lamento apenas minha memória tristemente violentada e camuflada
diante do inevitável avanço do tempo sobre pessoas e casas da minha querida
aldeia natal. Saudades muitas dos caminhos pisados por meus então alegres e
inocentes pés-meninos...
Vamos viver outras vidas, conterrâneos!
Comentários podem ser enviados diretamente ao autor no email
miltonxili@hotmail.com
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Milton Ximenes é cronista, contista e poeta
RJ
Email: miltonxili@hotmail.com
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Milton Ximenes Lima
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