...em que,
quando arrebentava a “fita” do filme projetado no Cine Central, os
espectadores vaiavam, batiam os pés, forçavam as fechaduras das janelas que
se abriam sobre o rio Itapemirim... até que se providenciasse uma nova
emenda no celuloide; em que, antes da projeção do filme, tínhamos que
acompanhar o noticiário do Jornal da Tela, os “traillers” (chamados então de
“reclames”) dos próximos filmes, os inevitáveis desenhos do invencível
ratinho voador “Possante, o bramante”, e, depois do filme, os seriados dos
espertos heróis da época: Fantasma, Zorro, Tarzan e outros que já não me
lembro; em que o Cine Santo Antonio, lá no bairro do Guandu, se
especializava na exibição de faroestes, aqueles em que o mocinho muito
cavalgava, atirava, brigava, brigava, e o chapéu não lhe caía da cabeça... (
Roy Rogers, Buck Jones e outros); em que, aqui no Brasil, montado no seu
garboso alazão, chapelão à cabeça, Bob Nelson cantava suas histórias de
vacarias; em que, nas enchentes do rio Itapemirim, os mais corajosos se
lançavam desafiadoramente às águas, saltando da Ponte Municipal, enquanto
remadores também se posicionavam em canoas esportivas (do Yole Clube) ao
embalo e sufoco das perigosas correntes d´água; em que, só então, a enorme
piscina do Liceu Muniz Freire (e Grupo Escolar Graça Guárdia) finalmente se
enchia de águas provindas do cano que normalmente deveria, ao contrário, as
descarregar no rio Itapemirim; em que a gente acompanhava a evolução e a
involução das enchentes nos quintais das nossas casas à margem, fincando, à
noite, pedaços de madeira que prometiam, no dia seguinte, com suas marcas
líquidas, criar expectativas de medos e alívios; em que a gente acompanhava
as caçambas se movimentando sobre os morros do norte, penduradas em cabos de
aço sustentados por torres, levando calcário para a Fábrica de Cimento
Barbará, lá na rua Moreira, início do bairro Coronel Borges; em que, ao
mesmo tempo, se sentia, vez em quando, tremer nossa casa, lá na rua D.
Fernando 63, quando o comboio ferroviário passava por detrás do nosso
quintal, levando mercadorias e materiais para a mesma Fábrica ; em que se
assistia aos jogos noturnos de basquete na quadra da Fábrica de Cimento
“Barbará”, no mesmo local; em que se viu (eu vi), lá da descida da rua D.
Joana, lado sul da cidade, um zepelin cruzando nossos céus; em que as
boiadas trafegavam por nossas ruas sob a vigilância de valentes cavaleiros
(o que não me impediu de assistir, certa vez, na rua Moreira, ao pânico de
uma procissão religiosa que com elas se enfileirou); em que, em Vargem Alta,
se instalou uma sericultura, com produção de casulos e controle das lagartas
(bicho da seda); em que o lazer das famílias aos domingos era concentrado na
Ilha da Luz, com seu parque protegido por muitíssimas árvores e com suas
piscinas de águas correntes fluviais, naturais e artificiais; em que, para
se chegar nela, se atravessava uma precária ponte de madeira que nos fazia
medo ao verificar, abaixo dos nossos pés, entre os madeirames que a
forravam, as ameaçadoras águas do rio.
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