Incidente/Acidente
Rua do Resende, Rio de
Janeiro, numa das suas esquinas.
Vem o homem tão embalado com seus
problemas que só percebeu o automóvel através do som da escandalosa
freada, bem próxima.
Ainda em estado de susto, vislumbrou, dentro
do veículo, o rosto redondo, gordo, do motorista, a boca a lhe transmitir
algo que não entendeu no momento, mas adivinhava... Retrucou, de imediato:
- É sempre assim, a gente vê logo quem não passa nos exames e compra a
carteirinha!
Pareceu que o motorista não gostou, se agachou, como
se procurasse algo no chão do carro. Depois, fora dele, veio, ameaçador,
com uma barra de ferro na mão direita.
Presença de espírito foi
necessária para que o homem, em oportuna simulação, enfiasse a mão direita
sob o casaco, em direção à cintura esquerda e gritasse:
- Sai daí
que já vai fogo!
Por essas coincidências inexplicáveis, passou um
carro e do seu cano de descarga irromperam dois fortes estouros.
O
motorista, que à primeira vista do seu gesto, ensaiara uma retirada, aí
mesmo disparou pela calçada, deixando cair a barra. De dentro de um bar,
surgiu um apressado policial a exigir a arma do homem, que o indagou;
- Que arma, seu “guarda”? Pode me revistar!
E, se lembrando que
o ameaçador motorista poderia reaparecer, o homem tratou de se afastar
rapidamente e se escondeu, por algum tempo, entre as bancas de mercadorias
de um supermercado, logo adiante.
Sorridente ficou só quando
rememorou os sons das gargalhadas de algumas testemunhas do incidente.
Coincidente
Despachante, nas horas vagas
usava e abusava das suas pernas, conversava com muita gente, insinuava
promessas de serviços próprios da sua especialidade. Afinal, tinha
necessidade de aumentar sua clientela, e aumentar, também, seus ganhos no
escritório, que sempre provia seus bolsos com uma boa comissão.
Uma
tarde, o calor bafejando as ruas, se encaminhava para uma repartição
estadual, onde colheria dados para um cliente acertar dívida de impostos.
Parou antes para atender à sede num bar daquela zona boêmia da cidade.
Então, pouco depois, no seu lado esquerdo, sentiu o roçar de um braço.
Encarou os olhos da mulher que ali se acomodou e lhe oferecia convidativo
sorriso, sugerindo:
- Me paga uma cervejinha, meu bem?
Pensou rápido: mulher fazendo trabalho especial àquela hora da tarde? Era
desespero ou simples hábito daquelas redondezas?
Ela continuou:
- Depois lhe pago, e com muito carinho!
Descartou-a com uma
desculpa autêntica, bem real:
- Não posso agora, moça, estou
trabalhando, e com muita pressa!
Desvencilhou-se dela, mas a frase
que ela deixou no ar, ficou gravada, tal a sinceridade da afirmativa:
- E eu também!