26/10/2012
Ano 16 - Número 810

ARQUIVO
MILTON XIMENES

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Milton Ximenes Lima


“Caixistórias”

OPÇÃO DE VIDA

 

Milton Ximenes Lima - Colunista, CooJornal

 

Essa vem do tempo do demolido prédio de nove andares da Caixa Econômica Federal, Rio de Janeiro, entre as ruas Treze de Maio e Senador Dantas. Da época em que, das seis às dez da manhã, ele era faxinado por grupo de homens de fora, chamados “extra-Caixa”, sob o comando do Chefe de Portaria. Este, por sua vez, sempre de “marcação” com um desses contratados, que tinha, apesar dos pesares, o hábito do prazer de apresentar-se muito bem apessoado e usando, algumas vezes, o famoso S-120, terno de linho considerado, naquela época, muito “bacana”, próprio dos mais afortunados.

O homem chegava, vestia o macacão de limpeza, fazia sua tarefa e ia embora, novamente elegante. Durante o trabalho não falava nada, embora o incomodasse aquele Chefe policiando demais o seu trabalho, exigindo-lhe maior capricho, detalhando e inventando exigências aqui e acolá... Pensava: - Será que tinha inveja da sua roupa?

Um dia correu a notícia de que o vistoso moço era grande admirador dos “ares marítimos” da Praça Mauá, com seus bares, suas boates, hotéis, mulheres e negócios misteriosos de alto mar. Daí a associá-lo à turma de um famoso e poderoso contrabandista foi rápido pensamento.

Por causa disto, o bondoso funcionário da então Divisão de Pessoal da Caixa, responsável pelo pagamento dos seus serviços, convidou-o para uma conversa especial, começando uma série de aconselhamentos visando afastá-lo daquele ambiente. Alertava-o de que poderia acabar na prisão, estragaria sua vida para sempre. Que ele agüentasse, com paciência, os trabalhos de faxina. Quem sabe um dia, como era tradicional, a Caixa faria uma prova interna e não o aproveitaria no quadro de servidores?

Entretanto, chegou a hora em que o homem se situou:

-Agradeço seu interesse, amigo, mas estou muito comprometido, não dá mais pra romper com os homens lá! Resolvi não voltar mais aqui...

E realmente, desapareceu. Anos mais tarde, cerca de onze horas da noite, o referido funcionário saía do então famoso Teatro Serrador, na rua Senador Dantas, e teve que atravessar uma das escuras ruelas transversais à rua Álvaro Alvim, na Cinelândia. Como de praxe era, vestindo elegante terno de passeio completo, e conduzindo a esposa, também altamente produzida, jóias na orelha, pescoço e pulsos. Na encruzilhada, dois homens bloquearam o casal e só não lhe interromperam a passagem porque uma voz forte se ergueu do fundo estratégico da escuridão, alertando-os:

- Esse aí, não!... Esse aí é meu amigo!

O dono daquela ordem apresentou-se à claridade, se intrometendo entre os corpos do casal, dividindo-o com abraços laterais e, conduzindo-o a um lugar mais movimentado, confraternizou, em repreensão suave:

- Poxa vida! Você passando por ali, a essa hora? E com a madame! Que perigo! Você só sairia daqui todo depenado.

Era o sumido e já esquecido e elegante “ex”-faxineiro...


(Para o amigo Alcyone Raphael, o então bondoso Chefe de Divisão desta narrativa, 
hoje aposentado e muito querido na comunidade pelos seus exemplos de dedicação
à CAIXA ECONÔMICA e aos colegas.
É o Papai Noel oficial da UNEI, associação de aposentados – RJ)


(26 de outubro/2012)
CooJornal nº 810



Milton Ximenes é cronista, contista e poeta
RJ

miltonxili@gmail.com
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