Milton Ximenes Lima
“Caixistórias”
OPÇÃO DE VIDA
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Essa vem do tempo do demolido prédio de nove
andares da Caixa Econômica Federal, Rio de Janeiro, entre as ruas Treze de
Maio e Senador Dantas. Da época em que, das seis às dez da manhã, ele era
faxinado por grupo de homens de fora, chamados “extra-Caixa”, sob o comando do
Chefe de Portaria. Este, por sua vez, sempre de “marcação” com um desses
contratados, que tinha, apesar dos pesares, o hábito do prazer de
apresentar-se muito bem apessoado e usando, algumas vezes, o famoso S-120,
terno de linho considerado, naquela época, muito “bacana”, próprio dos mais
afortunados.
O homem chegava, vestia o macacão de limpeza, fazia sua tarefa e ia embora,
novamente elegante. Durante o trabalho não falava nada, embora o incomodasse
aquele Chefe policiando demais o seu trabalho, exigindo-lhe maior capricho,
detalhando e inventando exigências aqui e acolá... Pensava: - Será que tinha
inveja da sua roupa?
Um dia correu a notícia de que o vistoso moço era grande admirador dos “ares
marítimos” da Praça Mauá, com seus bares, suas boates, hotéis, mulheres e
negócios misteriosos de alto mar. Daí a associá-lo à turma de um famoso e
poderoso contrabandista foi rápido pensamento.
Por causa disto, o bondoso funcionário da então Divisão de Pessoal da Caixa,
responsável pelo pagamento dos seus serviços, convidou-o para uma conversa
especial, começando uma série de aconselhamentos visando afastá-lo daquele
ambiente. Alertava-o de que poderia acabar na prisão, estragaria sua vida para
sempre. Que ele agüentasse, com paciência, os trabalhos de faxina. Quem sabe
um dia, como era tradicional, a Caixa faria uma prova interna e não o
aproveitaria no quadro de servidores?
Entretanto, chegou a hora em que o homem se situou:
-Agradeço seu interesse, amigo, mas estou muito comprometido, não dá mais pra
romper com os homens lá! Resolvi não voltar mais aqui...
E realmente, desapareceu. Anos mais tarde, cerca de onze horas da noite, o
referido funcionário saía do então famoso Teatro Serrador, na rua Senador
Dantas, e teve que atravessar uma das escuras ruelas transversais à rua Álvaro
Alvim, na Cinelândia. Como de praxe era, vestindo elegante terno de passeio
completo, e conduzindo a esposa, também altamente produzida, jóias na orelha,
pescoço e pulsos. Na encruzilhada, dois homens bloquearam o casal e só não lhe
interromperam a passagem porque uma voz forte se ergueu do fundo estratégico
da escuridão, alertando-os:
- Esse aí, não!... Esse aí é meu amigo!
O dono daquela ordem apresentou-se à claridade, se intrometendo entre os
corpos do casal, dividindo-o com abraços laterais e, conduzindo-o a um lugar
mais movimentado, confraternizou, em repreensão suave:
- Poxa vida! Você passando por ali, a essa hora? E com a madame! Que perigo!
Você só sairia daqui todo depenado.
Era o sumido e já esquecido e elegante “ex”-faxineiro...
(Para o amigo Alcyone Raphael, o então
bondoso Chefe de Divisão desta narrativa,
hoje aposentado e muito querido na comunidade pelos seus exemplos de dedicação
à CAIXA ECONÔMICA e aos colegas.
É o Papai Noel oficial da UNEI, associação de aposentados – RJ)
(26 de outubro/2012)
CooJornal nº 810
Milton Ximenes é cronista, contista e poeta
RJ
miltonxili@gmail.com
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