Lilian Maial
AS MÃES QUE ENVELHECEM
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Acabei de
ler um texto de António Lobo Antunes sobre sua mãe de 93 anos, quase
cega e surda, mas com vivacidade e memória impressionantes. Um texto
muito bonito.
Me peguei a pensar que estou caminhando para essa
situação e não consigo entender exatamente o sentimento dos filhos, como
eles veem a mãe, quando ela vai envelhecendo. Hoje, ainda bem mais
nova do que a senhora em questão, já noto uma certa confusão nos
sentimentos dos meus filhos. Acredito que eu não faça nenhuma confusão
em relação a eles, a não ser o fato de continuar vendo-os crianças e,
até certo ponto, dependentes, apesar de já serem adultos e eu ter plena
consciência disso. Outro dia, subitamente, puxei meu filho mais
velho, que é o pai dos meus netos, e quem eu não via já por algum tempo,
para o meu colo, para colocar a cabeça no meu ombro, e fiz uma afago, um
cafuné. Sutilmente, ele se desvencilhou e foi resolver algum assunto. Na
hora, aquilo me causou um certo mal estar, me machucou um pouquinho,
mas, depois, compreendi que, talvez, fosse uma carência minha e não
dele, e que, pelo fato de já ser adulto e pai de filhos já crescidos,
não se sentisse muito à vontade com esse carinho. Não sei em que
momento os filhos julgam que os pais não precisam de contato físico, ou
que isso não seria correto. Ao contrário, quanto mais velhos ficamos,
mais necessitamos de pele. Com o passar dos anos, as limitações impostas
pela saúde (ou falta dela), nos levam a evitar tudo o que, antes, nos
dava prazer, como, por exemplo: comer doces, salgadinhos, andar na
chuva, correr de bicicleta, brincar de pique-pega, ou subir em árvores,
para comer os frutos do pé. Creio que um dos poucos prazeres que nos
sobram sejam justamente os prazeres do contato físico. Um beijo, um
abraço, um cafuné são tudo o que a mãe precisa de um filho. Não há
necessidade de presentes, não há necessidade de palavras doces. Nada
substitui um abraço bem apertado ou um beijo bem estalado. Na
verdade, não escrevo para os meus especificamente, mas para que todos os
filhos compreendam que o amor de mãe nunca envelhece. Ele é sapeca, é
jovem, intenso, nunca esmorece com o tempo. Para as mães, os filhos
serão sempre aquelas mesmas crianças que pediam colo à menor ameaça. E
quantas ameaças as mães enxergam em cada esquina? E quanto tempo ainda
temos para proteger nossas crias? Sim, ainda lembramos o peso dos
filhos ao nascer, suas primeiras palavras, seus primeiros passos, os
primeiros dias na escolinha, os primeiros medos, as primeiras vitórias.
Por conta de tantas lembranças, não sofremos de solidão. Mas estamos
sós. Então, aquele telefonema inesperado, aquele beijo diferente e
bem estalado, aquele abraço apertado, trazem um bem-estar, uma paz, um
bálsamo para qualquer sintoma. Aquele abraço bem juntinho para tirar uma
foto só nossa, mesmo que não vá para nenhum porta-retratos.
Neste
momento, me veio à mente a alegria de minha mãe, quando eu chegava de
surpresa, levando seu pão doce preferido, para um lanchinho à tarde,
acompanhado de um abraço apertado, um beijo e uma fungada no pescoço,
sempre perfumado. É a mesma sensação de quando eu via meus filhos nas
festinhas de Dia das Mães, na escolinha, e ganhava aquelas lembrancinhas
impagáveis, com os nomes deles escritos nas peças, fosse qual fosse, com
suas letrinhas de criança, dizendo: “eu te amo, mamãe”. Eram sessões
lacrimogêneas, que eu frequentava de óculos escuros, já sabendo da
cascata iminente a rolar pelo rosto. Compreendi que essas sensações
não mudam, não envelhecem. Continuamos as mesmas mães dos 20 ou 30 anos
aos 50, 60, 70, 100 anos! Creio que, por isso, nossos filhos permaneçam
crianças, mesmo depois de pais ou, até mesmo, avós.
Gostamos de
sentir o cheirinho de cada cangotinho, de receber e dar o aconchego do
colo, de ter contato com a pele dos filhos.
Não se trata de querer
parar o tempo. A velhice chega para todos, exceto para o amor de mãe.
Lilian Maial médica, escritora, poeta
RJ
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