Lilian Maial
DRIVE-THRU - VERÃO 2003
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Havíamos decidido passar um dia maravilhoso em família.
Manhã
perfeita de sol, depois de uma estafante semana de trabalho e estudo,
todos queriam mais era descansar e aproveitar aquelas horas de inércia à
beira da piscina do clube.
Passamos o dia basicamente inteiro às
voltas com filtros solares, óculos escuros, todo o aparato de proteção
da pele. Mesinha de boa localização, garçon preferido, cerveja pra lá de
gelada, picanha fatiada ao ponto. Mergulhos, sauna e a tarde caindo,
numa preguiça poente invejável.
Levantamos acampamento, com a
certeza de que era tomar banho e cair na moleza de um aconchegante sofá,
para um filminho com alguns petiscos. Ops! Que petiscos? Não havíamos
comprado nada! Parar em alguma delicatessen a essa hora, nem pensar!
Padaria... não, estacionar, todos suados e cheios de fator de proteção
solar 30... não, definitivamente nada de descer do carro.
Uma das
crianças deu seu palpite: McDonald’s! Sim, e por que não? Pertinho de
casa tem um (como se em cada esquina não tivesse um), inclusive com
drive-thru, ou seja, não precisaríamos sair do carro. Perfeito!
Ao nos aproximarmos da “casa das telhas vermelhas”, uma fila não tão
pequena assim nos recepcionou. Mas, já que seu lema é rapidez de
atendimento, e o nome “drive-thru” dá uma noção de velocidade,
resolvemos arriscar. E entramos na auto-fila. Qual...
Não fora
o barulhento Ronald e sua dança-sei-lá-do-quê, até que teria sido
tolerável a espera, mas aquele som infernal, junto com a gritaria da
criançada, depois de muito sol e cerva na cabeça, tenha dó!
O pai
não disfarçava a irritação. Ao passar na máquina para fazer o pedido, as
crianças ainda tinham dúvidas e o pai avermelhando a expressão.
Calmamente contei as crianças, multipliquei pelo número de
cheesebúrgueres e hambúrgueres que cada um come habitualmente, mais
algumas batatas e sobremesas e pronto, soletrei as quantidades
resolvidas.
Apesar da gritaria insuportável e da voz gasguita do
animador, conseguimos acalmar o pai, o filho e o espírito santo, amém,
com a promessa de um ótimo filme que estava à nossa espera.
Mal
chegou nossa vez, e lá vem o cara com aquele puffzinho com numeração, e
lança no teto do carro, orientando meu marido a estacionar logo adiante.
- Ora, mas não é drive-thru? Que diabo de espera é essa? Simples,
um dos sanduíches que o mais velho pediu levava bacon e demorava pra
ficar pronto. Não preciso dizer o quanto o moleque foi amaldiçoado em
pensamento e entre os dentes rangentes do pai, que, para informação, não
havia se cuidado com os filtros, e estava um pouco mais vermelhinho e
ardidinho do que desejava.
Depois de 10 minutos alucinantes de
espera e vendo todos passando na nossa frente, o pai descobre que alguém
levara nosso sanduíche, o tal com bacon.
Pronto, foi o que
bastou. O homem saltou ENORME do carro, dirigiu-se ao rapaz que,
equivocadamente, cedera nosso sanduíche a outra pessoa que acabara de
pedir, sacou do puff do capô do carro e partiu para enfia-lo em algum
lugar não muito descritível.
Apesar da proteção do guichê de
vidro, o rapaz se encolheu tanto, que quase cabia entre duas fatias de
pão: o McCovardão.
Bem, depois disso, logo, logo apareceram os
nossos saquinhos de papel, com bacon e tudo, um bando de canudinhos,
colherinhas, sachezinhos de catchup e mostarda, e um volte sempre
apavorado...
Muito bem, acabou. Agora é correr pro abraço, chegar
em casa e devorar os sanduíches deliciosos, vendo um bom filme. Mal
chegamos e as crianças avançaram nos pacotes, cada qual pegando seus
sanduíches, quando ouço a exclamação do caçula: veio tudo com pickles!
Quase desmaiei. Nossa família inteira detesta pickles, e sempre nós
pedimos tudo “grill” no Mc Donald’s (sanduíche normal, mas sem os
famigerados pickles, cebolas picadas e temperos fortes).
Preciso
falar do resto? Pois saiu o pai bufando, com as sacolas nas mãos, a pé,
blasfemando, na direção do drive-thru.
Não sei o que lá ocorreu,
mas ele voltou com os sanduíches certinhos, mais 3 tortinhas de maçã, 3
Mc Mix de MM e uns 2 ou 3 sanduíches de brinde...
Ah, como é
generoso esse Drive-Thru!
(RT, 08 de agosto/2008) CooJornal no 593
Lilian Maial médica, escritora, poeta
RJ
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