19/04/2013
Ano 16 - Número 836
ARQUIVO
IRENE SERRA
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Irene Serra
Areia e mar, expressão de amor
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O mar mordiscava a areia
quando, estabanado, vindo de roldão, apertou-a com mais força. Sentindo o
quanto a machucara, levou sua espuma a lamber-lhe suavemente a superfície
ferida até que tudo cicatrizasse. A areia respirava aflita, soltando golfadinhas de ar, tentando tirar o que havia do mar ainda em si.
Logo cedo, a menina, sentada ante a arrebentação, ficara a observar por tempo
indeterminado aquilo que lhe parecia uma brincadeira. Não tinha idade
suficiente para perceber que o que via era uma expressão de amor. E, ao tentar
se aproximar, tocar as ondas, o mar se refluía para não ser incomodado. A
areia, ao mesmo tempo, cobria-lhe os pezinhos dificultando seu andar. Que
ninguém se aproximasse! Naquele momento não deveria haver intrusos, eram só
eles: areia e mar. Não importava quem estivesse por perto ou o que pensassem.
Queriam apenas estar juntos, sozinhos.
Sob sol ardente, o casal enamorado aprecia a natureza, a beleza dos Dois
Irmãos. De repente, em um pulo, correm para a água. A moça, com os cabelos
molhados escorrendo pelos ombros (esqueceu-se de fazer o faceiro gesto de
jogar o cabelo para frente e para trás, tão bem cantado pelo Affonso Romano),
fica a observar a areia e o mar, o mar e a areia. Perde a noção do tempo e
sente, em cada vaivem, paixão semelhante à sua. Vontade de estar junto,
envolver em abraços intermináveis o amado. É apenas impressão? A
areia teria lhe piscado, mostrando que entendera seu pensamento?
Fim de tarde, o velho solitário resolve caminhar pela orla. Nada de calçadão,
quer sentir o frescor da água, o vento roçar seus poucos cabelos
brancos, arrepiando-o como se ainda jovem fosse. No horizonte, o sol prossegue
sua viagem para o descanso noturno. Mas o mar continuará ali. E o velho,
andando cada vez mais devagar, sente que este será o seu lugar. É o bem do
mar: estar de prontidão a quem precisa de companhia, carinho, amor. Não tem
idade, é um amigo eterno. Sentando-se, mais lentamente ainda do que andara,
pende a cabeça na areia que o mar não para de abraçar.
(19 de abril/2013)
CooJornal nº 836
Irene Vieira Machado Serra
professora,
foniatra, editora da Revista Rio Total
RJ
irene@riototal.com.br
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