16/12/2024 Ano 27 - Nº 1.395
ARQUIVO
IRENE SERRA
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Irene Serra
TEATRO EM DIA CHUVOSO
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Lá vem o Vera Cruz, vindo de Belo Horizonte. Ele balança cadenciadamente,
deslizando sobre os trilhos, seu som ecoando mais forte e vibrando ao entrar
em um túnel. Manhã já clara, a criançada beirinha da estrada de ferro dá adeus
ao vê-lo, alguns mais afoitos correm como se estivessem querendo acompanhá-lo,
numa gritaria feliz.
E feliz também está um menino que, com sua mãe,
observa cada trecho da estrada até chegar ao Rio, aonde vão a passeio, na casa
de um tio. O menino, carioca, mora em Minas. O tio, mineiro, mora no Rio... E,
se os pais esperam com enorme carinho e saudade por este encontro, o que não
dizer dos primos, companheiros de folguedo de todas as férias?
De
manhã, é sagrada a ida à praia. Todos correm, na competição de quem chega
primeiro. O quarteirão de distância é mínimo, ali do lado está a areia fofa,
mar limpo (este é o Rio? É, ou melhor, era!), frescobol, peteca, castelos na
areia, muita conversa e o melhor da festa: Chicabom e Jajá de coco. Corados
pelo sol, cansados, é hora do retorno para casa após o sinal da mãe. O
quarteirão parece imenso, não acaba nunca... Mas quando chegam à portaria do
prédio, o cansaço desaparece e o lance da escada de serviço é galgado de dois
em dois degraus, para garantir a frente no banho.
O agora avô Rogério,
menino daquela época, recorda:
“Certa noite, a mãe e a tia
resolveram ir ao teatro, convidando para tanto o tio, intelectual e culto,
para assistir à citada peça. Mas este tio agradeceu. E, junto aos demais
filhos e sobrinho, resolveu escrever e dirigir uma peça de teatro, com
roteiro, falas e, pasmem todos, com efeitos sonoros (chuvas, raios e tudo que
se tem direito). Ao voltar do teatro, sua mãe e tia assistiram,
embasbacadas, ao melhor show que poderiam ver em muitos anos. Após 45 anos,
ainda vejo Tio Arthur ensaiando e dirigindo esta peça.”
Que sensação de
felicidade este relato traz! Através do Rogério sentimos que apenas o natural
envelhecimento físico nos mostra que não somos mais aquelas crianças, porém,
com orgulho, podemos dizer que as que agora estão ao nosso lado também
crescerão irmanadas dos mesmos princípios de solidariedade, amizade e,
principalmente, amor. Quem dera todas as famílias assim se reunissem, tornando
o tempo algo tão etéreo que as lembranças da infância nunca se perdessem.
(RT, 19 de novembro/2005) CooJornal no 451.
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Irene Vieira Machado Serra
foniatra, editora e diretora da Revista Rio Total
RJ
irene@revistariototal.com.br
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