Enéas Athanázio
HOLOCAUSTO NUNCA MAIS (2) |
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Depois de se tornar um best-seller mundial, o livro “O
garoto que seguiu o pai para Auschwitz”, de autoria do escritor e jornalista
britânico Jeremy Bronfield, foi publicado no Brasil pela Editora Objetiva em
tradução de Cássio de Arantes Leite (Rio – 2019). A obra é um retrato fiel e
dramático, fundado em copiosa documentação e fontes informativas, dos
padecimentos do artesão vienense Gustav Kleinmann e seu filho Fritz, ainda
garoto, nos campos de concentração nazistas em que foram aprisionados pelo
fato de serem judeus durante a II Guerra Mundial. Tão chocantes são as
revelações que o próprio autor confessou o quanto gostaria que os relatos
fossem pura ficção. Mas a documentação demonstra que tudo foi a mais
absoluta verdade.
Pequeno e hábil artesão, Gustav Kleinmann vivia em
Viena com a esposa Tini e quatro filhos, Kurt, Fritz, Edith e Herta. Vida
modesta mas estável, com boa freguesia e desfrutando da amizade dos
vizinhos. Mas o ambiente começou a mudar quando Hitler manifestou o desejo
de anexar a Áustria à Alemanha, propósito que sempre alimentou e jamais
escondeu. Os adeptos da unificação desencadearam intensa propaganda e as
opiniões se dividiram. Para resolver a questão, o chanceler austríaco
designou um plebiscito. Irado, no seu estilo tonitruante, Hitler exigiu que
a votação fosse suspensa mas o chanceler não concordou e foi afastado do
cargo. O plebiscito foi realizado com evidente manipulação dos resultados e
a Áustria foi anexada. Era a Anschluss e a partir dali as portas do inferno
se abriram, como afirmou uma testemunha. Tiveram início as perseguições
contra os judeus e as restrições cada vez maiores de suas atividades.
Denunciados pelos vizinhos, antes amigos, Gustav e o filho Fritz foram
presos e enviados ao campo de concentração de Buchenwald nos costumeiros
vagões destinados ao transporte de gado e tão lotados que as pessoas mal
podiam respirar. Aí tem início o terrível calvário vivido pelo pai e pelo
filho.
Chegados ao destino, mais mortos que vivos, famintos, sedentos
e sonolentos, são submetidos à burocracia: filas, registro, chamada.
Raspam-lhes as cabeças, substituem suas roupas por grosseiros uniformes e
são enviados aos alojamentos onde dormirão em tarimbas secas e apertadas. A
alimentação é precária e insuficiente. E então são enviados aos campos de
trabalho escravo, vigiados com extrema severidade pelos soldados e pelos
kapos (prisioneiros que mudaram de lado) A brutalidade é constante, tanto
nos atos como nas palavras. Não basta matar, é preciso humilhar, maltratar,
espancar e, quando possível, explorar. As chamadas Unidades da Caveira
superavam as maiores brutalidades imagináveis. Muitos oficiais se
notabilizaram pela frieza e pela maldade. Sua presença aterrorizava os
prisioneiros.
As cenas de brutalidade são chocantes. Enviados às
pedreiras, cabia-lhes alimentar o triturador, carregar os vagonetes e
transportá-los pela colina acima e abaixo. Tudo com rapidez, sem luvas, as
mãos enregeladas e doloridas, e sem agasalhos. Não havia pausas, exceto uma
muito breve para a refeição miserável. Muitos desmaiavam, o que constituía
motivo para risotas e brincadeiras dos soldados, enchendo-lhes as bocas de
água e acordando-os a cacetadas. Outros tinham que limpar as latrinas, um
trabalho abjeto, feito com as mãos nuas e sem qualquer proteção. E os
soldados e kapos, nos seus uniformes impecáveis, divertiam-se à custa dos
miseráveis. Tiravam-lhes os bonés e os jogavam para além da linha proibida
onde o prisioneiro não podia entrar. Imaginando que se tratava de simples
brincadeira, os inocentes cruzavam a linha e eram fuzilados sem piedade.
Tais fuzilamentos mereciam elogios e prêmios. A maldade não tinha limites.
Não obstante, apesar de todos os horrores, Gustav e Fritz conseguiram
sobreviver para contar a terrível experiência a que foram submetidos. Sua
triste história ficou como mais um documento da estupidez humana. Com
incrível esforço, conseguiram retomar o curso da vida.
O preconceito
é um sentimento que não consigo entender. Ninguém escolhe para nascer
branco, preto, amarelo ou vermelho. Como ninguém escolhe para nascer
europeu, asiático, americano ou africano. Da mesma forma que ninguém escolhe
nascer católico, budista, muçulmano ou judeu. Tudo é fruto do mero acaso,
dependente do local onde os pais estejam no momento do nascimento e das
crenças familiares. Odiar alguém por algum desses motivos não tem o menor
sentido e afronta a lógica do homem comum. Odiar o negro porque é negro, o
judeu porque é judeu, o índio porque é índio é condenar alguém pelo que não
tem culpa. Mas o ódio parece cegar muitas pessoas e elas não enxergam as
coisas mais elementares.
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Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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