Enéas Athanázio
CINQUENTA ANOS |
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Numa dessas manhãs de
isolamento fui acordado pelo telefone. Na outra ponta da linha falava Nêodo
Filho, que conheci menino, cujo pai, Nêodo Noronha Dias, é meu amigo desde
os tempos acadêmicos, em Florianópolis. Para minha surpresa, comunicava ele
que o prefácio que fiz para o livro do pai, em 1970, acabava de ser
publicado. Nêodo pai guardou aquelas páginas durante 50 anos, ou seja, por
meio século, e as publicou no livro “Só Poesias” (Editora Viseu –
Paranavaí/PR – 2020), reunindo boa parte de sua obra poética. Curioso por
ver como eu escrevia naquela época e saudoso dos velhos tempos, abri o
volume e me deparei com o seguinte texto:
PRÓLOGO O AUTOR E SUA
OBRA(*)
Um prólogo, a rigor, deveria ser uma breve introdução à obra.
A experiência, entretanto, demonstra que tanto melhor compreendida e julgada
é a obra quando se tem algum conhecimento prévio sobre o autor, sua
formação, sua personalidade.
Eis porque deixo a obra à análise dos
críticos e à apreciação dos leitores, fixando-me, principalmente, no seu
autor.
Nêodo Noronha Dias não é mais um estreante na poesia. Santa
Catarina, onde ele viveu tantos anos –, ora fustigado pelo vento sul, ora
aquecido pelo sol dourado da querida Florianópolis –, já o conhece por meio
de suas publicações nos principais jornais e dos programas radiofônicos de
nossa capital.
Sua sensibilidade poética e seu incontestável talento
literário são reconhecidos por quantos conhecem suas produções.
Extravasando as fronteiras estaduais, viu gravados na cera (**) alguns de
seus sonetos, na voz de famoso produtos carioca de conhecido programa de
rádio (***).
No Paraná, para onde o levou o itinerário de sua vida, suas
poesias também enriqueceram alguns jornais.
Outros gêneros literários
preocupam também a sua atividade criadora. É autor de numerosos contos,
novelas e crônicas, sempre naquele estilo tão seu, tão pessoal, de enredo
curto e desenlace trágico.
Nêodo é, aparentemente pelo menos, um espírito
alegre. Sua alegria talvez esconda, como em quase todo poeta, a amargura que
transparece em suas poesias.
No entanto, brinca com a vida; faz
trocadilhos dos seus revezes; ridiculariza as situações que ela cria. Só não
brinca com sua arte, uma arte em que é tão difícil acreditar nos dias que
correm. Nesse particular é exigente e sério. Tudo reclama de si mesmo para
buscar com seriedade e constância a perfeição da forma e a limpidez do
conteúdo.
Sua poesia é o retrato fiel de um estado de espírito, é fixação
definitiva de um sentimento real, é demonstração evidente da palpitação
interior de um poeta que sofre com os males do mundo, cujas mazelas é
obrigado a aceitar na vida cotidiana colocada em plano tão inferior em
relação à existência artística.
Rebela-se contra a mesquinha condição
humana. É dessa vida vazia que ele faz troça, é do dia a dia que ele zomba.
Duas facetas no temperamento do poeta, porque Nêodo é poeta até sem querer.
Até aqui seus poemas apareceram em periódicos, onde são lidos hoje para
serem esquecidos amanhã.
Agora surgem neste primeiro livro. (****) marco
inicial de sua carreira que já se esboça promissora. O livro ficará . Irá
para a estante do intelectual, para as bibliotecas, para o recesso dos
lares. É uma vida que se inicia, com sua própria trajetória, independente da
vontade de seu autor.
Depende apenas de uma condição: da aprovação
unânime dos leitores. Aprovação que não titubeamos em prever porque o poeta
realmente a merece,
Nêodo, consagrado pelos leitores, há de chorar. Mas,
percebendo a pureza dos sentimentos que transmite a outros corações não
lamentará os espinhos que ferem, a cada poema, sua sensibilidade artística.
E o leitor verá com ele que:
“Todos vão notar que é sobre espinhos
e não por fantásticos caminhos que o homem chegará aos pés de Deus!”
Campos Novos - SC _________________
(*) O Prólogo foi escrito em
1970 quando foi pensado o livro. Decidimos não o alterar mantendo a
originalidade do texto. (**) Em Discos de Vinil. (***) Colid Filho –
Salão Grená – Programa que era levado ao ar pela Rádio Tupi do RJ nos idos
70/80. (****) De fato, este deveria ter sido o primeiro livro, no entanto
ficou aguardando um momento mais oportuno. Outro livro foi publicado antes
deste. O primeiro, “Lira de Quatro Luas”, saiu nos anos 80, por obra do
apoio da Fundação Cultural de Paranavaí, e também uma participação na
coletânea publicada pelo Diretório Acadêmico Tristão de Athaíde (DATA), nos
anos 70, “Seara Nova”, foram precursores. Assim, atualizando o texto de
Athanázio, este é o segundo livro do poeta.
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Agora, uma mostra da poesia de NNDias:
A VIDA QUE NÃO FOI
Ouves? É o vento gélido que chora. O mesmo vento que te viu menino. O
vento eterno a murmurar agora, seguindo noite a dentro seu destino.
Aquela luz que prateia a mata, é a mesma luz dos sonhares teus...
E se te foi a vida tão ingrata, medita um pouco pois existe Deus!
Não te lamentes feito o vento errante que em noite escura assusta o
caminhante a se arrastar eternamente ao léu.
Sorri, medita, olha o
céu sereno. Olhando ao céu te sentirás pequeno. Sentir-te-ás pequeno
olhando ao céu!
(P. 82)
Comentários sobre o texto podem ser enviados ao autor, no email
e.atha@terra.com.br
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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