Enéas Athanázio
O BARULHO DO TEIXEIRA |
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Advogado com longa militância no Rio de Janeiro e folclorista, Francisco de
Vasconcellos é autor de uma obra ampla e variada que não cessa de crescer.
Tem abordado os mais diversos temas da chamada cultura popular de vários
pontos do país, sempre fundamentado nas melhores fontes e em pesquisas
próprias. Em seu mais recente livro, - “Temas de Feira e de Cordel” (Arteg
Impressões – Juiz de Fora – 2019), - focaliza três curiosos eventos da vida
sertaneja e seus personagens, além de realizar interessante incursão no
exame da poesia popular.
No primeiro deles analisa um episódio que ficou
gravado na memória do povo e que aconteceu na remota Vila do Teixeira,
povoado pobre e desconhecido do sertão da Paraíba. A mulher, a terra e a
política, ressalta o autor, eram as causas de frequentes lutas de famílias
que se tornavam inimigas. No caso em tela, tudo indica que a política
colocou em posições opostas os Dantas, conhecidos como a Família Terrível, e
os Nóbregas. A serviço dos primeiros estavam os Guabirabas, “mestres nas
tocaias, nos insultos e nas insinuações malévolas. Sua crueldade não
conhecia limites...” Delphino e Liberato, delegados em sucessão, teriam
perseguido os Dantas, adversários políticos, tendo aquele se afastado do
cargo para que assumisse o segundo. Cirino Guabiraba, um dos irmãos
facínoras, envia ao delegado Liberato um recado atrevido: estaria na feira
da Vila e, de fato, lá compareceu quando ela estava no auge. Saindo um por
um, para não despertar suspeitas, os homens do delegado prepararam uma
tocaia num local por onde Cirino teria forçosamente que passar. E ali o
mataram à traição, não lhe permitindo nem sequer confessar-se, enquanto o
cavalo ensanguentado voltava para casa e dava o sinal de que o dono fora
preso ou morto. A família se movimenta para o revide e tanto Liberato como
Delphino foram mortos, embora este, a rigor, não participasse dos
acontecimentos. Seguiram-se outros desdobramentos e os episódios entraram na
história como o Barulho do Teixeira.
Barulho do Teixeira atraiu a atenção
dos cantadores de feiras e da literatura de cordel, tendo variadas versões.
É tema de livros de Pedro Batista e de Gustavo Barroso, tendo ultrapassado
as fronteiras nordestinas para ecoar no Rio de Janeiro, em Minas Gerais e no
Espírito Santo. O cantador Hugolino Nunes da Costa seria o autor da primeira
versão rimada e metrificada dos acontecimentos. Outros poetas populares
também se dedicaram ao assunto.
Nesse período histórico o cangaço
vicejava em todo o Nordeste. Apesar das volantes policiais que os
perseguiam, os bandos de cangaceiros aterrorizavam as populações indefesas
das pequenas cidades e vilas. O caso de Cirino caiu no gosto do povo, talvez
pela valentia com que tentou reagir ou por ter morrido sem padre e
confissão.
Com seu ensaio, Francisco de Vasconcellos reaviva um episódio
dos mais conhecidos e cantados nas feiras populares.
Nos ensaios
seguintes, o autor analisa a figura e a época do Valente Valério que, de
bandido virou santo, e, a seguir, a de Inácio da Catingueira (1845/1879),
herói cultural de seu povo, escravo, pobre e analfabeto que se tornou um dos
maiores cantadores e poetas populares do sertão, falando pela gente
miserável e conquistando os corações. Jamais foi esquecido. O ensaio de
Vasconcellos é merecida homenagem.
Para fechar seu belo livro, o autor
tece eruditas considerações sobre a hipérbole na poesia popular .
Comentários sobre o texto podem ser enviados ao autor, no email
e.atha@terra.com.br
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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