Enéas Athanázio
VIAGEM AO INFERNO
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Abril de 1942. A Solução Final do Problema Judaico estava a pleno vapor
enquanto a II Guerra Mundial castigava a Europa e tudo apontava para a
vitória nazista. Lale Sokolov, natural de pequena cidade eslocava, retorna
para casa e toma conhecimento de que os alemães estão prendendo rapazes para
trabalharem para eles no esforço de guerra. Como seu irmão tem mulher e
filhos a sustentar, decide se apresentar, sendo aceito de imediato e
incorporado ao grupo que lá se encontrava. Permitem-lhe que vá até em casa
em busca de objetos pessoais e algumas peças de roupas. Rapaz caprichoso e
elegante, Lale anda sempre bem vestido, trajando terno completo e gravata.
Tem 24 anos.
Tudo preparado, o imenso grupo de homens é conduzido a
Praga para o embarque sem saber qual o destino. Espera-os longo trem de
cargas com vagões fechados, destinados ao transporte de gado. Sem janelas ou
aberturas, as paredes têm apenas alguns vãos estreitos pelos quais se
enxerga de relance pouca coisa da paisagem exterior. Não existem bancos e
nem instalações sanitárias. E as pessoas vão entrando, entrando, em
quantidade cada vez maior enquanto os guardas ordenam que ocupem todos os
espaços. Será por pouco tempo, dizem. Os vagões ficam tão lotados que é
impossível sentar ou deitar e as pessoas respiram umas sobre os rostos das
outras. As necessidades deverão ser feitas em dois baldes.
As portas
são fechadas com estrépito e rangidos de metal. A locomotiva apita e a
composição se põe em movimento. Viaja o dia inteiro, fazendo breves escalas
em algumas pequenas cidades e entra pela noite sem parar. Na manhã seguinte
faz uma parada mais longa em uma cidade maior, talvez para abastecer. As
escalas são sempre longe do centro e da vista dos habitantes. Nenhuma
explicação é dada aos ocupantes dos vagões, nessa altura já exaustos pela
permanência em pé, com dores nas pernas inchadas, sonolentos, famintos e
sedentos. Mas a viagem torturante prossegue pelo segundo dia inteiro com
rápidas paradas. Alguns passageiros desmaiam, outros se desesperam, eclodem
brigas. Os mais fortes tentam arrombar as paredes do vagão jogando-se contra
elas. É inútil, lembram, pois nem os bois o conseguiram, quanto mais homens
fracos e cansados. E a viagem sinistra prossegue por três dias e três
noites. Por fim, enchendo os corações de esperança, o trem para e as portas
se abrem. Ar renovado invade o ambiente pestilento.
Os guardas, fuzis
em punho, ordenam que todos desçam. Tontos, trôpegos, abobados pela fome e
pela sede, eles vão desembarcando aos cambaleios e tropeços. Alguns não
conseguem andar e caem. Os demais recebem ríspidas ordens para carregá-los.
Todos entram num imenso pavilhão e passam diante de uma mesa onde recebem um
número, tatuado a frio no braço. Avançam mais um pouco e mandam que se
dispam de toda a roupa e em seguida raspam-lhes as cabeças. Cada um recebe
uma muda de roupa, grosseiro uniforme de campanha usado por soldados
soviéticos mortos em combates. Cruzam então imenso portão no qual está
escrito: O trabalha liberta!
Implorando por água e comida, são conduzidos
ao alojamento em cujos beliches estreitos são amontoados. Só no dia seguinte
receberão um pouco de comida e água. Se estiverem vivos.
Estão no
campo de concentração de Auschwitz e seu destino é a câmara de gás onde o
Ziklon B proporcionará uma morte rápida e segura.
Mesmo nessa situação
tão absurda, Lale consegue sobreviver. Conhece Gita e por ela se apaixona. O
romance impossível que os une é relatado no livro “O Tatuador de Auschwitz”,
de Heather Morris, mostrando que o amor sobrevive mesmo sabendo que a morte
está do outro lado do muro e pode vir a qualquer momento (Editora Planeta –
S. Paulo – 2018).
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e.atha@terra.com.br
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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