Enéas Athanázio
QUEM CONHECE A TANZÂNIA?
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Quase desconhecida no Brasil, a Tanzânia é um importante país da África
Oriental, situado na costa do Oceano Índico. Tem uma área territorial de
939.760 km2 e uma população
estimada em 25.635.000 habitantes (1). Seu idioma oficial é o swahili, um
dos mais importantes do continente africano, falado por cerca de 50 milhões
de pessoas, e em regiões de outros países, como Quênia, Uganda, Ruanda,
Burúndi, Zaire, Zâmbia, Moçambique, Comor e Madagáscar. Originário do árabe,
o nome significa costa. Foi a língua falada nas costas da África Oriental
(2). O inglês também é usado no país.
A Tanzânia foi a antiga
Tanganica, colônia e depois protetorado da Inglaterra. Tinha sua capital em
Dar-as-Salaam, a maior cidade do país e importante porto marítimo que serve,
inclusive, a outros países africanos. Mais tarde foi construída a nova
capital, Dodoma, situada no centro do país.
Conquistada a
independência, depois de longa e penosa luta para se livrar do colonialismo
e vencendo as tramas e manobras da Inglaterra, Tanganica se uniu a Zanzibar
e constituiu a República Unida da Tanzânia, em 1964. Zanzibar é constituído
de um arquipélago situado na costa tanzaniana, composto pelo próprio
Zanzibar e pela ilha de Pemba, além de outras ilhotas circundantes. É um
território semi-autônomo, que elege seu presidente e seu legislativo.
Segundo os africanistas, essa união dos dois países foi a única que
prosperou e se consolidou no território africano.
O novo país logo se
consagrou como vanguardista, tomando posições claras contra o colonialismo,
o neo-colonialismo, o apartheid e todas as formas de preconceito e
discriminação. Numa atitude arrojada e pioneira, implantou um regime
socialista sui generis, não inspirado em Marx ou Lênin, mas com raízes nos
costumes ancestrais das comunidades populares onde tudo pertencia a todos,
inclusive a terra, que podia ser cultivada, embora não fosse permitida a
propriedade. Era considerada um bem comum. Caso a gleba não fosse usada,
revertia à comunidade. Não se discutia a luta de classes, mesmo porque não
existiam classes nas organizações tribais do país.
Colocou em
prática também uma reforma agrária tão ampla como jamais havia acontecido em
qualquer ponto do globo e que atingiu milhões de pessoas. Como a população
fosse muito disseminada e percebendo que nessas condições o Estado não
poderia lhe dar assistência de maneira eficaz, adotou o sistema chamado
“vilagização” (vilagization), consistente em reunir as famílias em vilas,
facilitando-lhe assim o acesso à educação, saúde, assistência social e tudo
o mais. Em consequência, numerosas famílias formaram incontáveis vilas
espalhadas pelo país. Também foram criadas as fazendas comunitárias. Todo
esse processo foi executado através da persuasão e do convencimento, sem
violência, salvo em casos extremos de recalcitrantes que colocavam em risco
o programa. O convencimento da população se fez através do partido único,
cujos integrantes se entregavam a esse trabalho de catequização. Usavam
métodos democráticos para a obtenção dos resultados.
País agrícola
por excelência, a Tanzânia busca sem cansaço a autossuficiência num regime
que procura promover uma justa distribuição da riqueza nacional. Como nem
tudo transcorreu conforme o planejado, inclusive em decorrência de crises
internacionais e fatores climáticos, como longas secas, foram feitas
concessões, a exemplo de um acordo financeiro com o FMI, sem, contudo,
desfigurar o sistema.
Ao longo de sua história contemporânea, desde
a independência até a consolidação de suas linhas básicas de ação, a
Tanzânia contou com a clarividência de um líder carismático e de grande
prestígio político e envergadura moral: Julius Kambarage Nyerere
(1922/1999). Presidente da República e do Partido, governou o país com
segurança e clareza de objetivos, projetando-se inclusive como líder
africanista e condutor seguro de seus povos. Ficou conhecido como Mwalimu
(professor).
Todas estas considerações foram inspiradas pela leitura
do excelente ensaio “Ujamaa – O socialismo africano: o modelo da Tanzânia”,
de autoria de William Agel de Mello, escritor e diplomata, publicado no
terceiro volume de suas Obras Completas (pp. 7 a 166). É um trabalho de
fôlego, escrito por quem domina os temas africanistas e conhece a Tanzânia
por dentro, abordando os mais variados aspectos daquele país, inclusive em
suas relações internacionais, até mesmo com o Brasil. Conhecedor de imensa
bibliografia assinada por reconhecidos especialistas, na grande maioria
estrangeiros, William Agel de Mello presta um grande serviço ao divulgar um
país tão interessante e pouco conhecido. De minha parte, confesso que ele
contribuiu de forma decisiva para ampliar meus horizontes geográficos.
William Agel de Mello, além de consumado africanista e linguista, é
autor de dicionários e inspirador do idioma Panlatino, uma espécie de fusão
das línguas originárias do latim. Também escreveu substanciosos ensaios
sobre a independência da Namíbia e a dissolução do apartheid na África do
Sul.
Segundo Carlos Baker, o mais categorizado biógrafo de Ernest
Hemingway, o segundo filho do escritor, Patrick, adquiriu uma fazenda no
lugar chamado John’s Corner, na região central da antiga Tanganica. E o
livro do escritor “As verdes colinas de África” é ambientado na mesma região
das partes altas do país.
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(1) - Atlas Geográfico Mundial, Folha
de S. Paulo/The New York Times, 1993, pp.74 e 149; (2) - William Agel de
Mello, op. cit., p. 503. .
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Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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