Enéas Athanázio
O NEGOCIADO E O LEGISLADO
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O governo interino de Michel Temer prepara um verdadeiro golpe legislativo
contra os direitos do trabalhador brasileiro. Sob o pretexto de que a nossa
legislação trabalhista é anacrônica, propõe uma flexibilização, palavra
sinistra atrás da qual ronda o propósito de revogar direitos conquistados a
duras penas para dar alguma dignidade a quem só dispõe da força de seus
braços para sobreviver. Para disseminar essa ideia, são usados os mais
pueris e inverossímeis argumentos, alguns deles raiando pelo absurdo.
Chegaram ao cúmulo de propor a extinção do tempo para refeição, de sorte que
o trabalhador teria que acionar a máquina com uma das mãos e o garfo com a
outra, enquanto come. A proposta, mais que desumana é de uma crueldade sem
limites.
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi obtida com
muita luta, suor e sacrifício. Ela contém um mínimo de direitos para o
trabalhador viver com relativa tranquilidade e sem ser vítima da exploração.
Ora, permitir que o convencionado entre o patrão e o empregado fique acima
da lei, será o mesmo que rasgar a CLT. No acordo entre o leão e o cordeiro é
fácil de prever quem sairá tosquiado.
Durante longos anos exerci a
Curadoria Trabalhista, uma das funções do Promotor Público onde não havia
Justiça do Trabalho, a quem cabia patrocinar as reclamações dos empregados
pobres. Nesse período testemunhei a exploração que campeia nessa área.
Vinham os pobres coitados dos rincões distantes, muitas vezes a pé,
molambentos e ressabiados para reclamar direitos elementares que lhes eram
sonegados. Experiência dolorosa e marcante que não me permite ter ilusões
sobre os objetivos da malsinada flexibilização. Implantada, constituirá uma
calamidade sem precedentes e um retrocesso imenso nos direitos sociais no
Brasil.
Por outro lado, fui também, e por muitos anos, representante
da Fazenda Pública junto às varas fazendárias. Nesse mister pude ver bem de
perto as maquinações para encobrir a sonegação. Parcelamentos intermináveis,
evasões, anistias, indultos, cancelamento de multas e tantas outras manobras
para procrastinar o pagamento. Creio que se recolhido o montante das
execuções fiscais existentes nas varas da Fazenda Pública em todo o país, o
déficit fiscal seria reduzido de maneira substancial. Sobre isso, no
entanto, reina completo silêncio, inclusive porque muitos meios de
comunicação de influência nacional estão no rol dos grandes sonegadores.
Ora, o imposto é um dever social e por isso a sonegação é punida com
tanta severidade em outros países. Como se sabe, Al Capone só foi preso em
virtude de sonegação do imposto de renda. Enquanto isso, aqui entre nós, o
crime de sonegação fiscal é considerado extinto se a dívida for paga antes
da denúncia. Isso graças a uma “emenda salvadora” que desfigurou a lei que
regula esse tipo de crime.
O sonegador não lesa apenas o fisco; ele
lesa toda a sociedade nacional porque o peso recai sobre todos. E sonegar os
direitos do empregado é desumano e cruel.
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e.atha@terra.com.br
(1º de setembro, 2016)
CooJornal nº 998
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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