Enéas Athanázio
O DIREITO DA FORÇA |
|
Quando saía de seu
gabinete, ao final do expediente, o Promotor de Justiça Marcus Vinicius
Ribeiro Cunha, de 33 anos, titular da comarca de Monte Carmelo (MG), foi
surpreendido por um repentino atentado a tiros. Nada menos que quinze
disparos de arma de fogo foram feitos contra ele, três dos quais o
atingiram, dois nas costas e um no braço. Durante o ataque, o agressor
descarregou a arma e tornou a carregá-la, momento que a vítima aproveitou
para se refugiar num restaurante, onde foi socorrida. Conduzido ao hospital,
o Promotor permaneceu quatro dias internado e não corre risco de vida,
apesar dos graves ferimentos recebidos. Foi apanhado de surpresa, mesmo
porque não vinha sofrendo qualquer ameaça.
No momento do ataque o
Promotor não conseguiu ver o rosto do agressor porque o local do crime
estava escuro e ele usava capacete. Mas as suspeitas logo recaíram sobre
Juliano Aparecido de Oliveira, de 22 anos, que foi detido em seguida e
confessou a autoria do crime, afirmando ter agido por vingança, uma vez que
o Promotor fora um dos responsáveis pela perda do mandato de vereador de seu
pai, Valdelei José de Oliveira. No momento em que foi preso, o autor dos
disparos comemorava numa churrascada em uma cidade próxima. O filho e o pai
foram indiciados em inquérito policial.
O fato teve ampla repercussão e
mereceu o repúdio do Ministério Público em atos realizados em diversas
localidades de Minas Gerais e do país. O Procurador-Geral da República,
Rodrigo Janot, esteve em Uberlândia, onde aconteceu uma reunião que contou
com a presença de numerosos promotores, magistrados, advogados e policiais
que condenaram com veemência o atentado. Lamentei que a nossa Associação não
tivesse se manifestado a respeito, enviando um representante. Entretanto,
colegas de todo o país se preparavam para “baixar” em Minas Gerais caso os
fatos não fossem investigados com rigor.
Não foi essa a primeira vez que
isso aconteceu em Minas Gerais. Em 25 de janeiro de 2002, na cidade de Belo
Horizonte, capital daquele Estado, deu entrada no IML o corpo do Promotor de
Justiça Francisco José Lins do Rego Santos, conhecido como Chico Lins, que
fora vítima de homicídio. Secretário da Promotoria de Defesa do Consumidor,
foi assassinado com sete tiros quando investigava a máfia dos combustíveis
que agia na região. A máfia, segundo as investigações, chegava a desviar até
15% da arrecadação total do ICMS no Estado. O crime foi perpetrado quando o
Promotor se dirigia de casa para o escritório pelas 13h. Segundo os autos,
uma moto branca com dois ocupantes emparelhou com o carro da vítima, em
pleno centro da cidade, sendo disparados 13 tiros, dos quais sete atingiram
o alvo, prostrando-o no ato. Quem pilotava a moto era o empresário Luciano
Farah Nascimento e o autor dos disparos, o passageiro que estava na garupa,
o soldado PM Edson Souza Nogueira de Paula. Tudo aconteceu numa esquina do
bairro Santo Antônio, centro-sul da capital. No local foi erigido um
monumento em homenagem ao Promotor.
Não foi apenas essa, porém, a
homenagem ao combativo integrante do Ministério Público. Em 21 de maio de
2004 foi inaugurado o Parque Ecológico Promotor Francisco Lins do Rego,
também conhecido como Parque Ecológico da Pampulha, pertencente à Prefeitura
de Belo Horizonte e que também presta homenagem ao integrante do parquet. O
imenso espaço de áreas verdes oferece aos visitantes “uma programação
permanente de educação ambiental, cultural, patrimonial e para o trânsito”,
segundo informações da municipalidade. É uma justa e duradoura homenagem a
quem deu a vida pela ética e moralidade pública.
São, sem dúvida,
homenagens merecidas e nobres, mas os atos praticados contra os Promotores
são intoleráveis e merecem o repúdio de toda a sociedade. Eles atentam não
apenas contra a vítima, no cumprimento de seu dever legal, mas contra a
ordem pública e o estado democrático de direito do qual o Ministério Público
é o guardião por força de disposição constitucional. É lamentável mas o país
vem trilhando cada vez mais pelos caminhos da intolerância e da violência.
Qualquer problema, imaginam muitos, pode ser resolvido pela violência ou
pelo direito da força. Matando, depredando, queimando, destruindo, invadindo
– tudo vale para obter o desejado, não importando as consequências. É claro
que semelhante atitude só poderá conduzir ao caos e quando ele se implanta
todos sofrem. Mas, pensando bem, é possível concluir que uma sociedade
nascida e criada sob a égide da violência, como nos revela a triste história
nacional, tenderia a rumar por esses caminhos. No entanto, é preciso reagir.
Busquemos a solução dos problemas mas dentro da lei porque, como já dizia
Rui Barbosa, fora da lei não há salvação.
Comentários sobre o texto podem ser enviados ao autor, no email
e.atha@terra.com.br
(01 de maio, 2015)
CooJornal nº 934
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
Direitos Reservados É proibida a reprodução deste artigo em
qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do
autor.
|