Enéas Athanázio
TRÊS RAINHAS
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Publicado pela Editora Letra Selvagem, de
Taubaté, que tem à frente o doublé de escritor e editor Nicodemos Sena, o
livro “Rainhas da Antiguidade – Sedução e Majestade”, de autoria de Dirce
Lorimier Fernandes, é de leitura cativante e surpreendente. Doutora em
História Social pela USP, a autora se lançou a uma tarefa tão ambiciosa quão
difícil de desvendar as figuras de três soberanas da Antiguidade,
reconstituindo tanto quanto possível suas biografias e obras, mesmo quando
as fontes eram tão minguadas que quase inexistiam, como é o caso da primeira
delas, Elisa, a fundadora de Cartago. As duas outras são Cleópatra, a rainha
do Nilo, e Zenóbia, a soberana do deserto, ambas mais recentes e sobre as
quais as fontes informativas são abundantes, Neste breve comentário,
limito-me ao ensaio sobre Elisa, aquele que me parece mais fascinante, mesmo
porque a figura majestática se esfuma num clima de mistério onde a
imaginação encontra brechas para funcionar. Devo registrar que a Introdução
ao livro é um ensaio excelente sobre a evolução da posição da mulher no
correr dos tempos (pág. 13 a 26).
Elisa, ou Alissar, ou Dido, é tida
como a fundadora de Cartago, cidade-estado que existiu no mesmo local onde
hoje se situa Túnis, a capital da Tunísia, ao norte da África. Seria ela uma
princesa fenícia que se casou com o tio, Siqueu, sacerdote do poderoso deus
pagão Melkart. Mas Siqueu foi assassinado por Pigmaleão, irmão de Elisa,
déspota ambicioso e violento. Temendo pela própria segurança, ela decide
fugir, levando em sua companhia considerável número de pessoas. A frota de
navios fugitivos faz uma parada em Chipre, ilha dominada pelos fenícios,
onde foi bem recebida. Dali partindo, “a rainha levou consigo, para povoar
Cartago, muitas moças que cantavam nas areias da ilha, conforme um piedoso
costume local” (p. 37). Assim, imbuídos do desejo de criar nova pátria, se
estabeleceram ao norte da África e a cidade prosperou em todos os setores, a
ponto de preocupar o poderoso Império Romano. Cartago floresceu e
enriqueceu, contava com a habilidade comercial dos fenícios, e boa
administração. Com isso, atiçava a cobiça de soberanos da região. E então o
poderoso rei Jarbas pede a rainha em casamento, pedido que ela não poderia
recusar sem graves consequências. Ela, porém, havia jurado fidelidade a
Siqueu, mesmo morto, e assim, decidiu se oferecer em sacrifício à alma do
marido. “No final de três meses, diz a lenda, a rainha fez levantar uma
grande fogueira na porta da cidade... Após haver imolado numerosas vítimas,
ela se jogou na fogueira” (p. 42). Cartago foi destruída pelo general romano
Cipião em 146 a. C. e dela só restam ruínas arqueológicas que constituem
motivo para sucessivas pesquisas.
A história pouco, ou quase nada,
preservou de Elisa. Coube à literatura imortalizá-la através das páginas de
“A Eneida”, de autoria de Virgílio, que fez dela a sua musa, com o nome de
Dido. O grande poema épico é o relato das aventuras de Enéias (ou Enéas),
príncipe troiano que se exila de sua cidade após sua destruição na Guerra de
Tróia. Filho de Vênus (Afrodite) e Anquises, perseguido por Juno, o herói
vai dar em Cartago e lá se transforma no objeto da paixão da rainha Elisa,
ou Dido. Mas ele não poderia escapar dos desígnios divinos e tem que
prosseguir na jornada à procura da nova pátria. Desprezando o amor da
soberana de Cartago, prossegue até a Itália, vencendo toda sorte de
obstáculos, e ali desposa Lavínia. Funda um pequeno reino que os romanos
consideram o núcleo inicial de Roma, sendo o herói troiano tido como seu
fundador. As perseguições de Juno só cessam com a intervenção de Vênus em
defesa do filho. A presença de Dido, com seu encanto e sua beleza, enriquece
de forma acentuada o grande poema. Como diz a autora, “a rainha de Cartago
inspirou a obra de Virgílio e se imortalizou no universo literário” (p. 44).
Aprofundando o ensaio, a autora conclui com longa e elaborada análise
crítica do poema de Virgílio e seus planos narrativos, além de comentar as
manifestações críticas a respeito dele. Trata-se, em suma, de um ensaio raro
e que muito contribui para desvendar uma figura tão impressionante quanto
desconhecida.
Cleópatra e Zenóbia, também estudadas no livro, serão
comentadas em outra oportunidade.
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com a Autora: Praça Santa Cruz da Exaltação, 21 Jardim Maria Augusta –
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Mensagens sobre o texto podem ser enviadas ao autor, no email e.atha@terra.com.br
(15 de fevereiro, 2015)
CooJornal nº 924
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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