13/09/2013
Ano 16 - Número 857
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
MONUMENTO EDITORIAL
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Para celebrar os 91 anos de idade de Nelly Novaes Coelho, a Editora Letra
Selvagem, de Taubaté (SP), publicou uma obra arrojada e corajosa que constitui
um marco no panorama editorial. Trata-se de “Escritores Brasileiros do Século
XX – Um Testamento Crítico”, contendo análises críticas de nada menos que 81
escritores que se destacaram nas letras nacionais no correr do século passado.
É um alentado volume de 980 páginas reunindo artigos publicados pela autora em
outros livros, na imprensa ou inéditos, produzidos ao longo de 50 anos de
militância crítica dessa produtiva escritora, professora da USP e reconhecida
“expert” em literatura brasileira. Segundo ela, “foi a sorte ou o acaso que
puseram em seu caminho os autores comentados”, razão pela qual estão presentes
muitos bafejados pela crítica e pelo público e outros tantos pouco divulgados
por variadas razões.
Entre os escritores de grande renome aparecem figuras como Monteiro Lobato,
Lima Barreto, Jorge Amado, Érico Veríssimo, Câmara Cascudo, Guimarães Rosa,
Ariano Suassuna e muitos outros. Por outro lado, a Autora valoriza autores que
tiveram momentos de glória literária e hoje estão esquecidos e muitos que, em
que pese o valor de suas obras, nunca chegaram ao grande público. Nesse
sentido é um livro justiceiro e ressuscitador. Dentre estes últimos, ela
aborda, por exemplo, Adonias Filho e seu impactante romance “O Forte”, deveras
louvado pela crítica mas apreciado tão somente por leitores mais exigentes;
Aníbal Machado, extraordinário romancista e, para meu gosto, insuperável
contista, autor de obras-primas como “A morte da porta-estandarte” e “Viagem
aos seios de Duília”; Antônio de Alcântara Machado, autor do célebre “Brás,
Bexiga e Barra Funda”, retratando os imigrantes italianos da Pauliceia, com
destaque para o inesquecível Gaetaninho; Antônio José de Moura, autor goiano
que permaneceu pouco conhecido; Antônio Olavo Pereira, integrante do grupo de
Lobato, autor do notável romance “Contramão”, que me deixou profunda
impressão; Augusto Ferraz, Daniel Pastura, Everaldo Moreira Véras. Heleno
Godoy, Hilário Tácito, Mora Fuentes, Orlando Bastos, Osório Alves de Castro e
mais alguns. Por outro lado, tive a satisfação de encontrar autores que me são
ou foram caros e cujas obras admiro de longa data: Ascendino Leite, João
Antônio, Paulo Dantas, Herman José Reipert, Caio Porfírio Carneiro. Não
faltaram também autores mais recentes, alguns novos, mas de reputação formada;
Alaor Barbosa, Cyro de Mattos e Nicodemos Sena, autor de uma obra apreciável,
ainda em execução, e ficcionista inspirado, embora bastante jovem. Por fim,
foi uma grata surpresa deparar com um ensaio sobre Haroldo Bruno, autor sempre
louvado mas pouco analisado pela crítica.
Deonísio da Silva, por sua vez, foi o único catarinense a merecer as galas de
relevante abordagem crítica, com a circunstância de que a Autora não lhe
regateou elogios. Analisando seu romance “Teresa”, contendo na abertura breve
passagem de Teresa d’Ávila, diz a Autora que ela “sintetiza a principal linha
de força, não só da problemática que energiza o romance, mas também a que
dinamiza a arte maior de Deonísio da Silva.” Mais adiante: “Escritor
pertencente à geração pós-moderna (...), Deonísio está entre os grandes
criadores, cuja arte escapa a qualquer tentativa de uma leitura crítica, que e
reduza a uma “ordem.” E ainda: “Vista em conjunto, sua escritura ficcional
assemelha-se a uma voragem de aconteceres e falares, que se entrecruzam
labirinticamente e resistem a qualquer tentativa de retê-la em determinada
ordem.” Como se conclui, sua obra constituiu um desafio posto diante da
experiente e traquejada crítica. E se isso não bastasse, os dados
biobibliográficos estão recheados das melhores referências. Trata-se, enfim,
de uma abordagem consagradora pela qual nós, seus conterrâneos, nos
rejubilamos.
Lamentei apenas não encontrar no volume outros catarinenses, como Nereu
Corrêa, Salim Miguel, Lindolf Bell e Péricles Prade, dentre outros. Mas o
comentarista há que se ater ao que o livro é e não àquele que gostaria que
fosse.
Quanto à Editora Letra Selvagem, todos os aplausos ainda serão poucos pela
magnífica iniciativa.
(13 de setembro/2013)
CooJornal nº 857
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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