14/06/2013
Ano 16 - Número 844
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
HERÓIS DO AR
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O pesquisador catarinense João Carlos Mosimann, natural da cidade de Brusque,
se entregou a uma acurada pesquisa e desvendou o manto de lendas e mistérios
que envolviam a passagem dos aviadores franceses, em especial do
piloto-escritor Antoine de Saint-Exupéry, pelo nosso Estado nas primeiras
décadas do século passado. Examinando extensa bibliografia, nacional e
estrangeira, além de mergulhar num mar de jornais, documentos, arquivos e
fotos, produziu o livro “Os Aviadores Franceses – A América do Sul e o
Campeche” (Edição do Autor – Florianópolis – 2012), onde reconstitui com
minúcias a empolgante epopeia dos homens que implantaram a linha aérea entre o
Rio de Janeiro e Buenos Aires, com escalas na praia do Campeche, e, mais
tarde, suas extensões nordestinas, transatlânticas e para outros países do
cone sul. História admirável de homens corajosos e decididos, imbuídos do
“espírito da linha”, e que não titubeavam em arriscar a própria vida para que
não houvesse interrupção ou atraso na entrega dos malotes postais.
Tudo começou em 1918, logo após a I Guerra Mundial, quando foi criada a
“Lignes Aériennes Latécoère”, cujo proprietário, Pierre-Georges Latécoère, era
um visionário, pioneiro do correio aéreo europeu. Depois de implantar linhas
ligando a Europa à África, ele se voltou para a América do Sul e estabeleceu a
linha entre o Rio de Janeiro e Buenos Aires, com escalas em Santos,
Florianópolis, Porto Alegre, Pelotas e Montevidéu. E foi então que a nossa
capital entrou na história, em especial a praia do Campeche, local em que foi
construído o campo de pouso, no início numa plantação de abacaxis, e instalada
a base de apoio com hangar, alojamento para as tripulações, torre de rádio e
tudo mais. Ali começaram a descer, nas suas escalas, muitos pilotos, mecânicos
e técnicos que enfrentavam as distâncias em aviões ainda precários e que, no
início, voavam apenas com recursos visuais. Estiveram muitas vezes na base do
Campeche pilotos de grande renome, autênticas lendas da aviação comercial,
dentre os quais o célebre Jean Mermoz, o mais destacado de todos, e Henri
Delaunay, que foi vítima de grave acidente, sendo recolhido ao Hospital de
Caridade, onde foi submetido a cirurgia e prolongado tratamento. Graças à sua
perícia e sangue-frio, conseguiu controlar o avião em chamas, salvando a vida
dos demais ocupantes. Em virtude do acidente, o nome da praia do Campeche
ocupou as manchetes da imprensa mundial. O local da base está hoje
desfigurado, embora ainda exista o barracão, agora transformado em depósito.
Naquele local permaneceram por bastante tempo alguns dos aviadores, em
especial Paul Vachet, que deixou boas lembranças entre os moradores. A “Latécoère”,
cuja sede ficava em Toulouse, foi sucedia pela “Aéropostale” e esta, por sua
vez, deu lugar à “Air France.”
Com criteriosa busca de elementos informativos, o Autor aborda a questão da
presença de Saint-Exupéry em terras catarinenses. Segundo vagos comentários,
disseminados pela vox populi e depois ampliados pela imprensa, ele seria um
assíduo frequentador do aeródromo do Campeche, onde teria feito amizade com
uma pessoa do local, em cuja companhia se dedicava à preparação de peixadas.
Isso, no entanto, não passaria de lenda, desmentida pela verdade histórica,
como demonstrou com robusta argumentação, não faltando, inclusive, comparações
entre as datas de certos fatos fundamentais e a real presença do
piloto-escritor em outros lugares. A versão de que ele seria o mesmo Zé Peri
ou Perri, corruptela de seu nome, sustentada até mesmo em livro, não encontra
apoio nos fatos como demonstrou o Autor ao examinar em detalhe todas as
circunstâncias que envolvem a questão. “O piloto nunca operou na Linha
Rio-Buenos Aires como querem alguns acreditar – conclui ele. – E nas únicas
ocasiões em que pousou em Pelotas, e muito provavelmente em Florianópolis,
tratava-se de rápidas escalas técnicas, tendo como radionavegador Jean
Macaigne” (p. 104). Tudo não passaria do fenômeno classificado como invenção
das tradições, como o definia Eric Hobsbawn, ou seja, uma reinvenção da
memória do pescador envolvido no caso e que seria o suposto amigo e
interlocutor do piloto.
Muitos outros aspectos da epopeia são abordados no livro. As perigosas
travessias do Atlântico e da Cordilheira dos Andes, a extensão das linhas até
Natal e os países do sul, as vitórias e as derrotas, inclusive as tragédias em
que pereceram muitos desses valentes que afrontavam as distâncias, as
tempestades e a escuridão impenetrável das noites porque a linha não podia
parar. Há também muitos elementos biográficos de diversos participantes,
inclusive de Saint-Exupéry e seu trágico desaparecimento. “Em 31 de julho de
1944, o piloto de um Lockheed Lightning P-38 não volta de uma missão que faria
sobre a França ainda ocupada: era o capitão Saint-Ex. Saíra de sua base na
Córsega para sumir no Mar Mediterrâneo. Desaparecia, aos 44 anos, da mesma
forma misteriosa que seus amigos Mermoz, Guillaumet e Reine” – escreve o Autor
(p. 96). Deixou uma admirável obra literária e um exemplo de bravura e
dedicação.
Morria o herói. Nascia o mito.
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Contatos com o Autor comentado:
E-mail: mosimix@terra.com.br
(14 de junho/2013)
CooJornal nº 844
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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