07/06/2013
Ano 16 - Número 843
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
A CHAVE DO MISTÉRIO
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Dimas
Macedo, doublé de jurista e escritor, escreve como poucos e sabe
prender o leitor. Tenho lido com prazer muitos de seus textos e acabo de me
deliciar com “A Face do Enigma” (Imprece – Fortaleza – 2012), segunda edição
da biografia e análise da obra de José Alcides Pinto (1923/2008), uma das
figuras mais inteligentes e pitorescas do mundo literário. Sei de experiência
própria o quanto é difícil o gênero biográfico, dificuldade que se agrava
quando se trata de uma personalidade tão complexa como a do biografado, ainda
por cima autor de uma obra vasta e diversificada que se espraia pela poesia, o
romance, o conto, a novela, o teatro, o ensaio, a crítica literária e os
textos variados a que denominou miscelânea. Parece não haver gênero que
permaneceu alheio à curiosidade e à inquietação intelectual de José Alcides
Pinto, cuja vida, por sinal, já constitui autêntica peça literária. Mas Dimas
Macedo enfrentou e superou todos esses entraves, penetrou no mar de letras
produzidas pelo seu biografado e compôs um texto delicioso, leve e repleto de
informações.
Nascido nas brenhas do interior cearense, José Alcides Pinto teve a infância
típica dos meninos do sertão. Perambulava pelos campos e pelas estradas,
sonhava, inventava maneiras de enganar a monotonia. Já deveria estar inoculado
pelo carnegão literário, eis que as letras parecem ter predileção pelos
garotos das pequenas vilas. Graças a um protetor, andou por outros rincões e
acabou em Fortaleza, a capital, onde já escrevia para a imprensa. Depois,
tomado pelo ímpeto ambulatório, viajou para o Rio de Janeiro, fazendo uma
prolongada escala no Recife. Ali se envolveu em manifestações socialistas e
provou a cadeia, iniciando uma série de detenções por razões ideológicas.
Naquele meio efervescente, lançou-se à campanha de Yedo Fiúza, candidato das
esquerdas à presidência e, por outro lado, fez contato com escritores
importantes, como Gilberto Freyre e Mauro Mota. A paixão pelo jornalismo e
pela literatura, no entanto, o salvou da política e o período recifense foi
significativo para sua formação intelectual. Já no Rio de Janeiro, entregou-se
a mil atividades e teve toda sorte de experiências. Uma vida de gangorra, ora
abrigado sob um teto seguro, ora dormindo ao relento em bancos de praças
públicas. Mesmo assim estudou, ingressou no serviço público e retornou a
Fortaleza como funcionário público federal. Mais tarde abandonaria o cargo
para se tornar fazendeiro, entregando-se à administração da Fazenda “Terras do
Dragão”, em Santana do Acaraú. Mais curioso ainda é que o socialista ardoroso
da juventude se tornou um místico e passou a envergar, do dia para a noite e
até o fim da vida, o hábito religioso dos franciscanos. “Com ele desfilou
pelos espaços públicos de Fortaleza e Santana do Acaraú, aprofundando-se
também na mística de Santa Teresa d’Ávila e São João da Cruz, e adotando a
oração e a renúncia como norma de vida” – escreveu o autor (p. 35).
Quanto à obra, parece inexistir caminho por onde sua inquietação não o tenha
levado. Foi pioneiro e mentor do concretismo, mas também produziu poemas nos
moldes tradicionais. Incursionou pelo fantástico, pelo surreal e pelo
maravilhoso. Foi vanguardista e experimental. Praticou variados gêneros com
criatividade incomum e produziu em quantidade sem jamais perder a qualidade.
“Seria muito difícil ao crítico acompanhar a trajetória desse escritor
multifacetado, cuja escritura abrange quase todos os gêneros literários”,
mesmo porque “a literatura é o pano de fundo de sua própria existência, isto
é, a arte literária em estado de realização humana e de mistério” (pp. 52 e
49). Como escreveu o grande Gilberto Amado, “concretismo, pós-surrealismo,
qualquer que seja o rótulo, seus poemas rápidos, intensos, são poesia
ressonante, reveladora de seu talento admirável” (p. 52).
Em síntese, José Alcides Pinto viveu com intensidade a vida do escritor e
legou uma obra vasta e admirável. Com imenso trabalho e dedicação invulgar,
Dimas Macedo realizou um excelente serviço para divulgar e preservar sua
memória e forneceu a chave para desvendar o mistério de sua obra.
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Contatos com o autor comentado: Rua Fonseca Lobo, 1 3 5 5 /
8 0 1 A – CEP 69175-020 – Fortaleza – CE.
(07 de junho/2013)
CooJornal nº 843
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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