08/02/2013
Ano 16 - Número 826
ENÉAS ATHANÁZIO
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Enéas Athanázio
O INCRÍVEL SHACKLETON |
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No final do ano passado o jornal “Página 3” brindou seus colunistas com o livro
“A Incrível Viagem de Shackleton”, de autoria de Alfred Lansing (Sextante – Rio
– 2004), relato da “mais extraordinária aventura de todos os tempos.” Desde que
o recebi, não consegui largar do livro antes de chegar à última página. É, de
fato, uma história empolgante em que um grupo de 28 exploradores sob a liderança
de Ernest Henry Shackleton (1874/1922) aventura-se pela Antártica para cruzar o
Pólo Sul, afrontando todos os riscos do continente gelado e desconhecido. Até
então ninguém jamais estivera lá. É um exemplo de coragem, superação e
determinação como poucos.
Quando o navio “Endurance” fica preso entre dois icebergs, pelos quais acaba
esmagado e naufraga, o grupo permanece sobre uma placa de gelo flutuante (banquisa),
entregue à própria sorte e nas mais precárias condições. Depois de meses e
variadas tentativas desesperadas de fuga, são levados pelos ventos e as
correntes marítimas até que as banquisas se partem e conseguem navegar nos
barcos salva-vidas retirados do navio rumo à inóspita Ilha Elephant. Dali, um
grupo de seis homens, sob a chefia de Shackleton, decide buscar socorro, numa
tentativa desesperada, atravessando num pequeno barco um trecho de 800
quilômetros através da temida Passagem de Drake, onde as ondas são gigantescas e
os ventos de furacão. Chegando, por fim, à Ilha Geórgia do Sul, de onde havia
partido a expedição, fazem a travessia dela a pé, percorrendo um território
jamais pisado pelo homem e que se encontrava em branco nos mapas. Vencendo
obstáculos inacreditáveis, atravessam a ilha até chegar a uma estação baleeira,
de onde voltaram para resgatar os companheiros que ficaram para trás e já haviam
perdido qualquer esperança. A travessia dessa ilha só seria repetida por uma
equipe preparada e apetrechada mais de 40 anos mais tarde.
Essa, no entanto, não foi a única aventura de Shacleton nos mares gelados do
sul. Antes dela já havia participado da expedição de Robert Falcom Scott e
depois chefiado a sua própria, em 1908, denominada Expedição Britânica à
Antártica, relatada em minúcias no absorvente livro “A Expedição Esquecida de
Shacleton”, de Beau Riffenbourgh (Planeta – S. Paulo – 2004). Embarcados no
pequeno navio Nimrod, caminharam sem cansaço no rumo do Pólo Sul, divididos em
pequenos grupos, chegando pela primeira vez a uma distância de 150 quilômetros
do objetivo, de onde tiveram que retornar, contrariados e frustrados, em virtude
da falta de comida para a volta. Padeceram tanta fome que ficaram esqueléticos,
com mãos tão magras que semelhavam garras. Fincaram, como pioneiros, a bandeira
britânica no Pólo, subiram ao Monte Erebus, um vulcão ativo, colheram quantidade
de materiais para pesquisas científicas e desvendaram caminhos antes
desconhecidos, abrindo as portas para novas expedições. Tiraram incontáveis
fotografias, reproduziram as paisagens em desenhos, traçaram mapas e escreveram
relatos minuciosos. Apesar do aparente fracasso por não alcançarem a meta
principal, os resultados científicos e práticos da expedição foram
consideráveis.
Retornado à Inglaterra, Shackleton foi recebido como herói e aclamado pelas
multidões. Mereceu título de nobreza, fez incontáveis palestras em diversos
países e foi alvo de muitas homenagens. Seus companheiros também receberam
homenagens e quase todos se destacaram nas atividades da vida civil. Shacketon
escreveu um livro sobre a jornada, em dois volumes, que teve invulgar aceitação.
Não obstante, faleceu aos 48 anos de idade, vitimado por ataque cardíaco. Talvez
os esforços sobre-humanos a que foi forçado tenham provocado alguma lesão em seu
coração. Foi um líder nato, dono de grande magnetismo, inspirando intensa
confiança nos companheiros que o seguiam nas mais difíceis situações, certos de
que ele os levaria no rumo correto. E, de fato, em suas expedições empenhou-se
sempre na defesa de sua equipe, jamais perdeu um só homem e todos sempre
retornaram.
Tinha, porém, o impulso da aventura. Apesar das reiteradas promessas à esposa
Emily de que aquela seria a última, estava sempre arquitetando novas partidas.
Conformada, ela escreveu: “Como eu poderia segurar uma águia no quintal?”
(08 de fevereiro/2013)
CooJornal nº 826
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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