Em seu mais recente livro, o escritor Adrião Neto realizou uma modalidade de crônicas de viagens que, se não é inédita, é, pelo menos, muito rara e pouco versada pelos autores. Em “Ramon e Juliana” (Edição do Autor – Teresina – 2012), ele descreve suas andanças, só ou em companhia da namorada, por variados recantos deste mundo, entremeando com o tórrido romance de amor entre os dois que, ao final, para surpresa do leitor, não tem um desenlace feliz. Nessas andanças usa um método criativo e, mesmo estando em determinado lugar, direciona a memória, instigada por algum pormenor, para outras viagens anteriores, reconstituindo-as para o leitor. E nesse difícil exercício revela excelente memória, organizadas anotações e admirável senso de observação. Trata-se, pois, de um livro que defino como romance viageiro, nova modalidade dos costumeiros livros de viagens.

Portugal, Espanha e França estão em destaque dentre os países europeus visitados, em especial os dois primeiros. Lisboa, o Porto, Coimbra e sua secular universidade são objeto de sua admiração e nelas palmilha as ruas, praças, avenida e logradouros interessantes, além de fornecer sucintas e preciosas informações históricas, culturais e turísticas, como quem orienta os futuros viajantes. Evitando a monotonia das prolongadas exposições, esses dados são colocados em diálogos com outras pessoas ou nas bocas de supostos guias. Momento marcante é a visita à Universidade de Coimbra, das mais antigas do mundo, percorrendo suas vetustas instalações e posando para as indispensáveis fotos junto à escadaria e à célebre torre do relógio. Como escritor, não deixaria sem visita a biblioteca que abriga mais de 200 mil volumes. Ligada de maneira íntima à nossa história, a velha universidade formou durante longo período os primeiros bacharéis brasileiros. Em terras espanholas, a visita ao Santuário de Santiago de Compostela, na Galícia, é registrada em minúcia. Segundo a tradição oral, um eremita foi alertado por um campo de estrelas para o Bosque de Libredón onde foram encontrados os restos mortais do apóstolo, daí derivando a denominação: Caminhos de São Tiago do Campo das Estrelas. Muitos outros lugares mereceram detida atenção dos viajantes.

Já na América, o destaque é para Machu Pichu, que em quéchua significa montanha velha e que é um dos principais símbolos do império inca. Tudo é descrito com precisão, desde as formas de acesso até os esplêndidos panoramas, com olhar carregado de justa admiração por esse fascinante conjunto encravado nas alturas. Surgem pitadas de história, lendas e fatos pitorescos dentre os muitos que povoam a crônica do lugar e arredores. As presenças de cientistas, arqueólogos, exploradores e aventureiros e de quantos almejam sentir a sensação de chegar até lá. Contemplar o Templo do Condor, com o desenho da grande ave, “talvez seja como se deixar seduzir pelo vôo do condor” – como diz o Autor – e com ele galgar às alturas. No entanto, onde quer que estejam, os viajantes não esquecem do Brasil, apegados ao visgo do chão brasileiro. E vão recordando de mil lugares, desde a Costa do Santinho até o Delta do Parnaíba, o Parque de 7 Cidades e Brasília, Fernando de Noronha e o Rio de Janeiro, as praias, os rios, as montanhas e tudo aquilo que está gravado na alma brasileira.

Nota interessante no livro é a atenção posta pelos viajantes naquilo que observam nas andanças. Porque o verdadeiro viajante não é o que muito anda, mas aquele que vê, observa, anota pormenores, compara e aprende. Não é aquele que viaja para contar vantagem e retorna alienado, mas para enriquecer pela experiência vivida o seu eu interior e a compreensão da pátria. E neste romance viageiro “sui generis”, Adrião Neto se revelou autêntico “globe-trotter.”
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(05 de outubro/2012)
CooJornal nº 807