05/08/2011
Ano 14 - Número 747
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
O DOSSIÊ DO MENINO CANDINHO
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A palavra dossiê foi desfigurada. Sugere perseguição policial ou
artimanhas políticas de baixo calibre. Neste caso, porém, ela tem sentido
positivo porque registra um trabalho a respeito do pintor Cândido Portinari
(1903/1962), um dos maiores artistas plásticos do país, publicado por importante
revista de cunho cultural (*). Nascido em Brodósqui, na região de Ribeirão Preto
(SP), fez cursos e estágios na Europa, conquistando desde cedo grande renome
internacional. Com nítida inclinação naturalista, evoluiu para a temática social
e sofreu forte influência de Picasso. Mas foi a realidade brasileira, captada em
sua história e na atualidade que mais o tocou, refletindo-se em numerosas obras
de sua autoria. Segundo o Projeto Portinari, que administra o acervo, produziu
cerca de 5000 obras, entre telas, aquarelas e desenhos. Encontram-se obras suas
em numerosos países, destacando-se os painéis que estão na sede da ONU, em Nova
York, os que se encontram no prédio do antigo Ministério da Educação (RJ) e os
que pintou na igrejinha da Pampulha, em Belo Horizonte, cujo conjunto é o
símbolo do modernismo nacional.
O dossiê se abre com ensaio de Célia Linhares, especialista em educação, escrito
em estilo encruado e de difícil digestão, muito preocupada em estabelecer
ligações entre o ensino e a obra de Portinari, o que não seria bem o caso. Mas
revela como Candinho, assim chamado pelos íntimos ao longo da vida, conservou as
lembranças do meio cafeeiro onde nasceu, os brinquedos da vida rural, os medos e
os sonhos e, acima de tudo, o amor ao Brasil e à liberdade que lhe custaria
caro, inclusive com um exílio no Uruguai para fugir às perseguições, ainda que o
país vivesse em aparente democracia (1948). São publicados, a seguir, diversos
poemas de autoria de Portinari, faceta pouco conhecida de sua produção.
Fragmentos de “O menino e o povoado”, de índole memorialista, e vários outros,
como “Grunewald” I e II, “A Revolta” e “Ensaio de Oração”, este último dedicado
à neta Denise. Segue-se uma breve biografia escrita pelo filho João Cândido
Portinari, assinalando os principais feitos da vida do artista, e uma
bibliografia mínima sobre Portinari e sua obra que me parece algo confusa.
Também aparecem diversas fotos e numerosas reproduções de obras do pintor,
espalhadas por toda a revista e inclusive na capa, muitas delas coloridas. Ainda
que não seja uma perfeição, o dossiê é uma bela homenagem a uma das maiores
figuras das artes plásticas do país.
Visitei Brodósqui há alguns anos, percorrendo os locais ligados ao pintor e sua
obra. A casa onde nasceu, em cuja parede fôra descoberta uma pintura escondida
sob várias camadas de cal, e a capela construída nas proximidades, a pedido da
mãe, e cujos santos, pintados por Portinari, retratavam pessoas de sua família,
todas identificadas com facilidade pelos que as conheceram. Na cidade vizinha de
Batatais, estive na igreja matriz em cujo teto Portinari pintou imensos painéis
que lá se encontram muito bem preservados.
Segundo se afirma, Candinho morreu envenenado pelos vapores de uma tinta azul
que ele mesmo havia inventado. Apesar da vida breve, deixou uma obra imperecível
e a lembrança do artista que se manteve menino para sempre.
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(*) Revista “O Escritor”, órgão da União Brasileira de
Escritores (UBE), S. Paulo, número 121, julho de 2009, págs. 23 a 45.
(05 de agosto/2011)
CooJornal no 747
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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