09/10/2010
Ano 14 - Número 705
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
UMA POLÊMICA ACESA
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Grandes polêmicas na área cultural marcaram época no passado histórico,
tanto aqui como em outros países. Em virtude de uma delas, os escritores
Olavo Bilac e Raul Pompéia tentaram se enfrentar num duelo, o que só não
aconteceu graças à providencial chegada da polícia. Em Florianópolis,
segundo os cronistas, Othon D’Eça desafiou Altino Flores para um duelo a
espada, também evitado pela intervenção da turma do deixa-disso. Outras
questões do gênero, maiores e menores, pontuam as páginas históricas, em
especial no campo das letras.
Nos dias de hoje, porém, graças à alienação generalizada, as discussões
dessa ordem não costumam chegar ao povo, passam batidas, em branca nuvem.
Só as polêmicas de natureza política ainda despertam algum interesse e
muitas pessoas se posicionam deste ou daquele lado, ainda que o resultado
não vá além da troca de seis por meia dúzia. Mas essa já é outra história,
como gostava de dizer o velho Rudyard Kipling.
No momento em que escrevo, no entanto, uma polêmica vai acesa nas páginas
culturais e nos suplementos. A historiadora mineira Guiomar de Grammont,
no livro “Aleijadinho e o Aeroplano” (Editora Civilização Brasileira),
afirmou que o escultor Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido como
Aleijadinho, na verdade nunca existiu, não passando de uma ficção
inventada pelo historiador Rodrigo José Ferreira Bretãs. A criação do mito
do Aleijadinho remontaria ao Estado Novo, quando o Governo Vargas
necessitava de um “herói nacional” para exibição pública, inclusive
externa, porque qualquer país que se preze deve ter seu herói nacional.
Essa hipótese faz lembrar o romance “O Farmacêutico a Cavalo”, de
Pitigrilli, já comentado nesta coluna. Segundo a historiadora, a obra
atribuída ao Aleijadinho, incluindo os profetas de Congonhas, as igrejas e
tudo mais, seria obra coletiva de diversos artesãos. Ela afirma que Bretãs
chegou a ponto de inventar até um pai para o escultor, o arquiteto
português Manuel Francisco Lisboa.
Ora, o Aleijadinho é considerado um artista genial, tanto na escultura
como na arquitetura, e sua obra constitui um dos pontos mais elevados da
arte barroca, admirada em todo o mundo. É um rico patrimônio da cultura
nacional, apontado como único e inigualável. Em consequência, inúmeros
estudiosos e pesquisadores vêm se debruçando sobre ela e seu autor, entre
eles o escritor e jornalista Fernando Jorge, pesquisador minucioso,
investigador incansável, erudito, autor de uma primorosa biografia de
Antônio Francisco Lisboa, com várias edições publicadas (Editora Martins
Fontes). Para escrever a obra, ele se dedicou a pesquisas e investigações
desde as visitas de cientistas e exploradores estrangeiros, passando por
historiadores, cronistas e biógrafos, para levantar os elementos
biográficos do artista ao longo de toda sua vida. Descobriu documentos,
testemunhos, recibos, comparando assinaturas e tudo o mais. Buscou os
testemunhos de Saint-Hilaire, Richard Burton e Guilherme de Eschwege, além
de estudar a vida de Bretãs, o primeiro biógrafo do artista, para
demonstrar que se tratava de pessoa séria e respeitável. Diante de tantos
elementos, conclui que a teoria da inexistência do Aleijadinho não passa
de fantasia e não existe prova alguma nesse sentido. O Aleijadinho viveu e
conviveu com as pessoas de sua época e, apesar dos graves defeitos
físicos, nos legou uma obra admirável que envaidece todos os brasileiros
que a conhecem.
A polêmica, porém, promete continuar e estaremos atentos para trazer seus
desdobramentos ao conhecimento dos leitores.
(09 de outubro/2010)
CooJornal no 705
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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