Enéas Athanázio
MERGULHO NO MUNDO ECIANO
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Apaixonado por Eça de Queiroz (1845/1900), cuja vida/obra vem estudando de
longa data, o “piauiense recifencisado” Dagoberto Carvalho Júnior reuniu em
alentado volume uma seleção dos muitos ensaios, prefácios, artigos, discursos
e conferências que fez sobre o célebre romancista português de prestigio
universal e que tem uma legião de admiradores em nosso país: “Eça de Queiroz –
Retratos de Memória” (Edição do Diário de Pernambuco – Recife – 2001). A
circunstância de viver no Recife, a cidade mais eciana do Brasil, e de ter
sido um dos criadores da “Sociedade Eça de Queiroz”, em 1948, contribuiu de
forma decisiva para a realização desses estudos. Não satisfeito, tem
palmilhado sem cansaço os caminhos do romancista em Portugal, com a mesma
devoção com que trilha suas obras e o que sobre ele se escreve. Em
conseqüência, o livro se tornou um manancial sem fim de informações e
apreciações sobre Eça de Queiroz, como poucos existem.
Aspecto
admirável no livro é a linguagem erudita e elegante com que foi escrito, uma
linguagem que honra o laureado ficcionista estudado. Ele se abre com um exame
da recepção de Eça em Pernambuco e depois, em sucessivos trabalhos, em outros
Estados. Diz ele que “o espaço intelectual para a recepção de Eça de Queiroz
não poderia ser melhor; preparara-o o naturalismo da escola filosófica de
Tobias Barreto.” Quem o reconheceu foi ninguém menos que Alceu Amoroso Lima.
Refere-se depois a um fato histórico, talvez surpreendente para muitos, de que
“o Brasil consagrou e adotou Eça de Queiroz antes de Portugal”, conforme
asseverou, com autoridade, Clóvis Ramalhete. A ex-colônia, no caso, se revelou
mais sensível à grande arte eciana que a metrópole. Ou terá sido porque santo
de casa não faz milagre? Desde então a influência eciana em nosso país tem
sido permanente, gerando inclusive verdadeiro culto cujas cerimônias costumam
se realizar nas sociedades de ecianos, congressos, conferências e incontáveis
eventos do gênero.
Outro aspecto destacado pelo ensaísta e que
justifica de forma cabal a admiração votada ao escritor português foi “o modo
porque transformou a velha língua de Camões e de Vieira, quase exclusivamente
própria para poemas épicos e sermões fradescos, num claro instrumento maleável
e sonoro, rivalizando em plasticidade e opulência com os idiomas modernos.”
Vale dizer que ele libertou a língua, inovou na maneira de usá-la, deu-lhe
vida e cor, tornando seus romances objetos do fascínio de gerações e gerações,
transpondo inclusive os limites do idioma português para penetrar em outros
países. Como escreveu Graciliano Ramos, “Eça é grande em tudo – na forma
própria, única, estupendamente original de dizer as coisas.”
Analisa,
em outros ensaios, os trabalhos de grandes experts em Eça, a começar por Paulo
Cavalcanti, um dos mais dedicados e talvez o maior de todos, Clóvis Ramalhete,
Nilo Pereira, Gilberto Freyre e o incansável estudioso Manoel Paulo Nunes,
além de outros, inclusive os mais jovens e os autores de trabalhos
universitários. Registra e discute as obras aparecidas, as homenagens, a
presença do escritor na televisão, no cinema, nos selos postais, nas
esculturas em praça pública, no cordel e nas artes, a visita de ecianos
ilustres e tudo aquilo que se relaciona com o carnegão incurável mas
inofensivo que é a ecite. Enfim, é um mergulho de cabeça no admirável mundo do
pobre (grande) homem da Póvoa do Varzim, criador do romance realista, cujo
gênio no trato com a palavra e capacidade imaginativa fizeram dele uma
presença forte em todo o mundo lusófono e outros recantos do planeta.
Dagoberto Carvalho Júnior proporciona ao leitor um inesquecível encontro com
José Maria Eça de Queiroz e sua inigualável obra.
(27 de fevereiro/2010) CooJornal no 673
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Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
Balneário Camboriú - SC
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