13/02/2010
Ano 13 - Número 671
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
A BOA MESA DE EÇA
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Em antiga entrevista, dizia Edgard Cavalheiro haver sido criticado, mais
de uma vez, inclusive por intelectuais de renome, pela sua incansável
pesquisa em torno da vida e da obra de Monteiro Lobato. Diziam esses
críticos não ver sentido na busca incessante de pormenores sobre o
escritor de Taubaté, minúcias que a ninguém poderiam interessar. Isso
revelava, segundo Cavalheiro, o pouco ou nenhum gosto brasileiro pelo
aprofundamento dos assuntos, pela especialização, pelo conhecimento
metódico e sistemático dos temas. Anos mais tarde, quando começaram a
circular por aqui as biografias européias e norte-americanas foi possível
observar que elas eram incomparavelmente mais minuciosas, exigentes e
massudas que as nossas. Concluiu-se, então, que tudo que respeita a um
biografado é importante, nada é secundário, nada pode ser ignorado. E com
esse pensamento, Cavalheiro se transformou no maior e mais completo
biógrafo de Monteiro Lobato, até hoje insuperado, apesar das freqüentes
tentativas, e escreveu um dos melhores livros do gênero de nossa
literatura.
Pelo que venho observando, essa é também a diretriz de Dagoberto Carvalho
Júnior, especialista em Eça de Queiroz, ao devassar em ensaios, crônicas e
artigos a vida e a obra do celebrado romancista de Póvoa de Varzim. Para
ele, nada que diz respeito ao autor de “O Primo Basílio” pode ficar no
esquecimento e, por isso, em seu livro “A boa mesa de Eça de Queiroz”
(Editorial Tormes – Recife – 2008), investiga em um ensaio e numerosas
crônicas as preferência gastronômicas do escritor e as bebidas de seu
maior agrado. É interessante notar que não foi o primeiro, tantas e tão
variadas foram as fontes informativas que encontrou. O resultado é um
livro muito curioso e diferente, inclusive porque o autor, grande
conhecedor do assunto, alarga seus comentários para inúmeros outros temas
interessantes sobre a época, o meio, os amigos, os locais freqüentados e
tudo mais. Eça nunca aparece como figura isolada ou solitária, mas como
partícipe ativo da vida de seu tempo. Tudo isso faz do livro uma leitura
agradável e rica de informações.
O autor começa por comentar o livro “Comer e beber com Eça de Queiroz”, de
Beatriz Berrini, professora paulista, segundo a qual “Eça consegue
entremear a degustação dos pratos e dos vinhos, com a tessitura da trama,
a análise da sociedade, a composição das personagens...” Aborda, em
seguida, “Era Tormes e amanhecia”, de autoria de Dário Moreira de Castro
Alves, que é “um singular dicionário gastronômico cultural de Eça de
Queiroz, em dois volumes, com trezentas e oitenta e oito entradas e quatro
mil, cento e doze citações, rigorosamente anotadas dos romances, referidos
os livros e as páginas correspondentes.” Não satisfeito, o mesmo autor
publicou “Era Porto e entardecia”, dicionário de vinhos e bebidas
alcoólicas em geral na obra de Eça de Queiroz.” Lembra ainda “Alusões
alimentares na obra de Eça de Queiroz”, da ensaísta e professora belga
Andrée Crabbé Rocha, da Universidade de Coimbra, e não esquece “Comer e
beber com Eça de Queiroz”, de Maria de Lourdes Modesto, que transcreve
receitas deliciosas. Comenta ainda outros autores e fecha o ensaio com um
apêndice em que relaciona com minúcias todos os trabalhos existentes sobre
o assunto.
Não falta quem procure “o motivo verdadeiramente obsidiante do apego de
Eça de Queiroz à mesa.” Também há quem imagine que ele tenha exagerado
nesses assuntos, “deixando-nos uma visão distorcida dos homens do seu
tempo, arrastado por uma evidente predileção pessoal.” É fora de dúvida,
porém, que o romancista tinha tão refinado gosto pelo comer e beber como
pelo escrever. Os momentos vividos ao redor da mesa, “onde tudo se
decide”, na companhia de amigos apreciadores da comida e da bebida
constituíam para ele um prazer inigualável, registrado em tantas passagens
de sua obra pela boca dos personagens.
(Editorial Tormes – Rua Conselheiro Portela, 1 6 0 – 52020-030 – Recife –
PE).
(13 de fevereiro/2010)
CooJornal no 671
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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