04/07/2009
Ano 12 - Número 639
ENÉAS ATHANÁZIO
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Enéas Athanázio
A QUINTA COLUNA
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Única peça teatral escrita por Ernest Hemingway (1899/1961) e pela
primeira vez publicada no Brasil, em excelente tradução de Ênio Silveira,
“A Quinta Coluna” (Bertrand Brasil – Rio – 2007) é uma obra deveras
singular. Escrita em 1937 em um quarto do Hotel Flórida, em Madri, durante
a Guerra Civil Espanhola, enquanto os bombardeios se sucediam até mesmo na
rua contígua, provocando violentas explosões, cortando a energia e a água,
sem esquecer a crônica carência de alimentos. Mesmo em circunstâncias tão
absurdas, Hemingway escrevia e escrevia, com as cortinas cerradas,
aproveitando os intervalos dos estrondos para organizar o pensamento.
Naqueles dias a capital espanhola era atacada por quatro colunas
franquistas, comandadas por oficiais alemães, enquanto outra, composta por
espiões e traidores, agia dentro da própria cidade em favor do inimigo – a
quinta coluna. Esperava-se na ocasião uma grande ofensiva, gerando um
ambiente de tensão e expectativa. O hotel estava a cerca de mil e
quinhentos metros da linha de frente e foi atingido por mais de trinta e
oito projéteis de grande poder explosivo. Como correspondente de guerra de
jornais americanos, o autor se deslocava até a frente de combate, em meio
a bombardeios infernais, e “sempre deixava os originais escondidos e
protegidos nas dobras de meu colchão de campanha. Ao voltar, era muito
agradável encontrar intatos tanto o quarto quanto eles. Terminei a redação
e os remeti para fora do país...” – escreveu (págs. 9 e 10). Creio que
raras obras literárias poderiam, nessa situação, ser mais autênticas.
Mesmo assim, parece que a peça nunca foi encenada, em parte devido à
dificuldade de sua montagem.
Infiltrada na cidade, a quinta coluna passava informações ao inimigo,
apontava locais para ataques, praticava sabotagens e assassinatos,
espionava de todas as formas. Para combatê-la, pequeno grupo de
republicanos se entregava à contra-espionagem, embora essa atividade só
venha ao conhecimento do leitor através dos diálogos que acontecem no
hotel e em alguns poucos lugares. Desde então a designação quinta coluna
se disseminou pelo mundo, aplicada a todo indivíduo ou grupo que age de
forma subreptícia em favor do inimigo. Esse teria sido seu primeiro grande
teste, às vésperas da II Guerra Mundial, e dele resultaram terríveis
massacres, incluindo a destruição de Guernica, que deu origem à célebre
tela de Picasso. Na peça, porém, o grupo é bem sucedido e consegue prender
numerosos integrantes da quinta coluna. Como tantos personagens de
Hemingway, Philip e Preston são homens duros, decididos e guerreiros,
enquanto Dorothy parece buscar seu modelo, pelo menos no físico, na
terceira mulher do autor. A clareza e a perfeição dos diálogos, técnica em
que ele foi mestre, torna tudo claro e substitui com vantagem longas
descrições. Como acentuou um crítico, esse livro revela como poucos o que
ficou conhecido como estilo Hemingway, mil vezes imitado e copiado sem
sucesso.
Embora jamais se entregasse a atividade política, Hemingway foi sempre
antifascista e via no assalto franquista imenso perigo para a Espanha,
país que amava com verdadeira devoção, intuindo que daquela experiência
macabra sobreviria a carnificina da Guerra Mundial, como de fato
aconteceu. “A Quinta Coluna”, além de leitura agradável, constitui rico
documento humano e histórico.
(04 de julho/2009)
CooJornal no 639
Enéas Athanázio,
escritor catarinense, cidadão honorário do Piauí
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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