
14/03/2009
Ano 12 - Número 623

ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
PIAUÍ: SUA TERRA E SUA GENTE
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Meu interesse pelo Piauí vem de longe.
Leio tudo que pilho sobre ele, realizei memoráveis andanças por Teresina e
pelo interior, e acompanho pelos jornais enviados por amigos a vida do
Estado. Sempre digo que ele é um Estado sui generis, com uma conformação
toda própria, de litoral estreito e interior vasto, além de ser o único
Estado brasileiro colonizado do sul para o norte, do interior para o
litoral. E conta ainda com o Parnaíba, o “Velho Monge”, banhando-o numa
das divisas. Nesse ponto, é o oposto de Santa Catarina, meu torrão natal,
que tem litoral extenso e interior estreito, com cidades vetustas na
beira-mar (São Francisco do Sul é uma das mais antigas do país) e centros
urbanos muito jovens no Planalto e no Oeste. Sem falar no frio que domina
por aqui, em contraste com o calor piauiense. Tudo isso, para mim. faz do
Piauí um motivo de permanente curiosidade.
Diante disso, “100 Fatos do Piauí no Século 20”, de autoria de Zózimo
Tavares, proporcionou-me o autêntico prazer da leitura e me ensinou muito
a respeito da terra de Da Costa e Silva. Bem escrito, conciso e
fundamentado, o livro contém informações enciclopédicas sobre uma centena
de eventos ocorridos no século passado, cada uma ministrada de forma leve
e direta, constituindo-se numa crônica que pode ser lida de maneira
isolada, mas que integra, ao mesmo tempo, o conjunto da obra. “Tem ele tal
poder de comunicação que fruímos as páginas desse roteiro sentimental,
verdadeiro guia histórico de nossa terra, como se estivéssemos a ler um
romance” - escreveu com a costumeira precisão o crítico M. Paulo Nunes.
À medida em que avançamos na leitura, vão se desenrolando acontecimentos
marcantes no Estado, tomando vida personagens que deles participaram,
desenhando paisagens, ambientes, locais, obras e artes, entrando em cena o
povo, sempre presente nas suas manifestações cívicas, políticas,
religiosas, folclóricas ou artísticas. É uma história que se conta com a
presença de gente, ao contrário de tantas outras em que ela fica de fora,
como que marginalizada, alheia aos fatos. Desfilam os governadores, desde
Arlindo Nogueira, o primeiro do século, até o “fenômeno” Mão Santa,
passando por Dirceu Arcoverde, sobre quem muito li nas obras de José Lopes
dos Santos, falecido quando fazia seu discurso de estréia no Senado. E
muitas outras figuras que marcaram presença nos diversos setores.
Destacam-se os ciclos econômicos, com a exploração intensiva da maniçoba,
do babaçu, da carnaúba e sua influência no destino do Estado. A navegação
pelo Parnaíba nos grandes vapores e o sabor de aventura que cercava as
longas viagens. São relembradas as grandes e dolorosas secas, com destaque
para a de 1915, inspiradora do clássico de Rachel de Queiroz, em contraste
com a enchente que inundou a Capital, em 1926. Também os incêndios de
Teresina, consumindo os casebres da gente humilde e abrasando os céus, tão
bem descritos por Afonso Ligório, estão presentes em capitulo próprio.
Acontecimentos marcantes no cenário cultural, como a fundação da Academia,
em 1917, e a premiação nacional de Assis Brasil, levando a literatura
local ao público nacional. A arte de Mestre Dezinho rompe as barreiras e
ganha o mundo.
A inauguração do Monumento do Jenipapo, lembrando as cruentas lutas da
Independência, a passagem da Coluna Prestes, a “Revolta do Pau de Colher”,
liderada pelo “Beato” José Lourenço, cuja trajetória foi romanceada por
Cláudio Aguiar (“Caldeirão”) e muitos outros acontecimentos são descritos
de forma enxuta e segura. Desde os de grande impacto até aqueles
silenciosos, mas decisivos. Enfim, um panorama sem precedentes do que
recheou o dia-a-dia do Estado e sua gente no Século 20, um século curto,
segundo Hobsbawn, mas de grande significado.
O livro é um curso intensivo e didático sobre o Piauí e, ainda que não
seja piauiense, eu o li com prazer e interesse, cumprindo aquela que M.
Paulo Nunes considerou uma obrigação de todos os piauienses. E de seus
amigos também.
(14 de março/2009)
CooJornal no 623
Enéas Athanázio,
jurista e escritor
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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