03/03/2007
Ano 10 - Número 518
ENÉAS ATHANÁZIO
ARQUIVO
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Enéas Athanázio
PELAS PRAIAS DO MUNDO
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Este ano marca o centenário de Pablo Neruda, nascido em 12 de julho de
1904, em Parral, no Chile, cujo nome “quer dizer país frio em uma das
línguas incaicas.” Filho de ferroviário, desde cedo o menino aprendeu a
amar a ferrovia e a vibrar com o apito musicado das velhas locomotivas que
arfavam para vencer os desafios do chão acidentado. Revelou em idade
precoce a alma sensível do poeta e a incontida inclinação para a escrita.
O jovem Ricardo Eliezer Neftalí Reyes y Basoalto nascera poeta, assim como
tantos nascem pintores, músicos ou empresários. Em 1920 publica um poema
chamado “Hombre”, usando pela primeira vez o pseudônimo que usaria pelo
resto de seus dias e que o acompanharia na jornada de cidadão do mundo.
Desde então sua veia poética se aperfeiçoou sem cessar e seus versos
começaram a penetrar na alma das pessoas, tornando-o um dos poetas mais
lidos de todo o mundo.
Deixando aquela “região virginal de frio e de tempestade”, estudou, leu e
viajou. Foi diplomata, senador, conferencista, escritor e, acima de tudo,
poeta. Condoído da pobreza de seus patrícios, gravada a fogo na memória,
sua alma chorava “junto aos acampamentos miseráveis, esta pátria de cruzes
sem nome e sem cerca”, refletindo-se de forma candente em versos que não
tardaram a cair na boca do povo, cruzando mares e distâncias, publicados e
traduzidos em todos os recantos. Palmilhando os caminhos dos cinco
continentes, fala, recita, declama.E vai semeando livros que são
consumidos por leitores ávidos e cada vez mais numerosos: “Vinte poemas de
amor e uma canção desesperada” (agora relançado no Brasil), “Residência na
terra”, “Os versos do capitão” e “Canto geral”, para lembrar apenas os
mais conhecidos, dentre os quais o último é o mais lido e publicado,
espécie de súmula poética de sua vida e pensamento. “É meu livro mais
fervoroso e mais vasto, foi a coroação de minha ambiciosa tentativa” –
escreveu. Seu livro de memórias, “Confesso que vivi”, encantou a crítica e
os leitores pela beleza de uma existência ativa e repleta de arte cujos
dias decorreram nos mais diversos cantos do mundo. A consagração plena
viria com o Prêmio Nobel, em 1971, ocasião em que pronunciou o discurso “A
poesia não terá cantado em vão”, até hoje lido, relido e repetido, com
passagens conhecidas em toda parte.
Sua casa na “Isla Negra”, refúgio e santuário, é objeto de curiosidade e
peregrinação. Ali ele coleciona amigos, livros, caravelas em miniatura,
carrancas e caracóis. E escreve, escreve, escreve. Chegam poetas e mais
poetas, em pessoa ou carta. “No mundo há lugares em número bastante para
cavalos e poetas de todas as cores do arco-íris” – diz ele, aludindo à
revista “Cavalo Verde”, cujo título intriga a muitos. Em 1973, sentindo o
avanço da doença, ali se recolhe com sua Matilde Urrutia. Em 23 de
setembro, com o vento cantando nas janelas e as ondas do mar martelando as
pedras de sempre, Neruda falece. Doze dias antes um sangrento golpe
militar derrubara o presidente Allende, por ele apoiado e seu bom amigo,
dando início à ditadura de Pinochet. O destino o poupava do rol de
tragédias que viriam. “E agora me vou, oculto por esta folha, mas não
desaparecerei” – profetizou o poeta.
Antecipando-se às comemorações do centenário, a Editora Bertrand Brasil
publicou, no ano passado, o livro “Pelas praias do mundo”, reunindo
crônicas e uma novela do poeta. Em 2001 veio a público o livro-álbum
“Presente de um poeta”, contendo pensamentos e poemas nerudianos,
traduzidos por Thiago de Melo. António Skármeta publicou o romance “O
carteiro e o poeta”, depois convertido em filme. São obras que permitem um
reencontro com a poderosa poética de Pablo Neruda e sua inesquecível
figura.
(03 de março/2007)
CooJornal no 518
Enéas Athanázio,
escritor e Promotor da Justiça catarinense (aposentado)
e.atha@terra.com.br
Balneário Camboriú - SC
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