O excessivo apego das pessoas à
televisão e a influência nem sempre positiva que ela exerce têm sido
objeto da preocupação de estudiosos de várias áreas, inclusive do
próprio meio televisivo. O escritor Ricardo Teixeira de Salles, em
recente ensaio publicado numa importante revista de cunho cultural,
abordou o tema de forma interessante, merecendo alguns comentários.
Trata-se de “A servidão do olhar e da mente”, no qual ele conclui
que “a era da comunicação de massa está revelando um fenômeno
estarrecedor e que é a espetacularização da vida no âmbito social de
nosso tempo” (*).
Visitando duas amigas, ele constatou,
estarrecido, que elas mantinham cinco aparelhos de televisão ligados
ao mesmo tempo, “estrategicamente localizados nos principais cômodos
da casa, habitada somente pelas duas.” Assim, onde estivessem,
fazendo o que fosse, mesmo se locomovendo de uma peça para outra,
“estavam sempre plugadas ao mundo do espetáculo visual da
televisão.” Claro que isso não ocorre em todas as casas, mas
representa bem o que significa a submissão à ditadura que a
televisão impõe. Por outro lado, anota o ensaísta, ninguém se livra
dela porque onde quer que vá haverá sempre um aparelho ligado:
bares, restaurantes, hotéis, bancos e até ônibus e aviões. Quase
sempre no mesmo canal.
Numa casa assim invadida pela
televisão, aparelho dominador e barulhento, não restará tempo para
outras coisas, como a leitura, a escrita, o rádio, o papo em
família, o recolhimento individual. Talvez seja por isso que tanta
gente não saiba mais conversar e as ruas das pequenas cidades se
esvaziam durante certas horas. Além disso, a televisão tende a
unificar tudo, desde os assuntos até os sotaques, as expressões, as
histórias e as piadas. “Participamos do desenvolvimento de uma
cultura estranha às nossas verdadeiras, ricas e multifacetadas
regionalidades nacionais.” Com efeito, a triste realidade é que, de
norte a sul, a preocupação dominante é com o que vai acontecer na
novela, com este ou aquele personagem, se o bom será premiado e o
mau punido. Preocupações que acabam se sobrepondo às reais,
espetacularizando a vida e deixando a realidade em segundo plano.
Assim, conclui ele, “estamos deixando
de falar para escutar. Enclausurados, assistimos à televisão;
expulsos de nossas ruas, que se tornaram ameaçadoras, assistimos à
televisão; cerceados por merencório e insolúvel desemprego,
assistimos à televisão; sufocados pelo sistema econômico-financeiro,
assistimos à televisão; seduzidos pelos argumentos capciosos dos
políticos, assistimos à televisão; assustados com o descaso da
sociedade com os reais problemas da nação, assistimos à televisão.
E, já que através desse veículo de comunicação não existe mais a
diferença entre público e privado, assistimos à televisão.” E dessa
forma – arremata o ensaísta – “somos prisioneiros passivos da
televisão, onde as idéias não circulam livremente, dado o seu
caráter monologal. E se as idéias não são ventiladas livremente, não
teremos um estado de situação democrática...”
Está aí um bom assunto para pensar.
(*) “Revista da Academia Mineira de
Letras”, B. Horizonte, Vol. XXXV, março de 2005.