01/05/2015
Ano 18 - Número 934
ARQUIVO
CARLOS TRIGUEIRO
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Tentaremos alternar nossa crônica sobre “Olhos” “com um olho no padre e outro
na moça, digo, na missa”, ou seja, alternando o sério com o burlesco, pois
todo mundo sabe que o olho é o órgão da visão, apresenta-se em par, um em cada
órbita, e ainda segundo a Anatomia, tem três camadas: esclerótica, coroide e
retina. Mas “olho nela”, digo, na Ciência, pois todo santo dia, o seu “olho
clínico” ou “olho de lince” descobre novos olhares. Daí que não nos cabe,
neste espaço, esmiuçar os “Olhos” por esse ângulo científico, e muito menos
pelo olhar da Medicina. Melhor mesmo é ficar literalmente “a olho nu”, do
contrário teremos “os olhos rasos de água”.
Dizem os poetas que “os
olhos são o espelho da alma”. Mas tem olho de todo tipo: “olho de cabra”,
“olho de gato”, “olho mágico”, “olho vivo”, “olho mecânico”, “olho
eletrônico”, “olho gordo”, “olho-de-santa-luzia” (jardineiros sabem que é uma
planta), “olho-roxo” (agricultores sabem que é uma variedade de mandioca), e
por aí vão inúmeras expressões similares num crescendo “a olhos vistos”.
Até aqui nenhuma trave bíblica, ou melhor, nenhum cisco no olho. Mas se
alguém disser que fulano tem “olhos de mormaço” podem crer que o dito cujo
“anda de olho” naquela fulana, e, portanto, melhor a fulana “abrir os olhos”,
embora perceba “de olhos fechados” a intenção do tal fulano que, segundo a
galera das redes sociais - os vilarejos contemporâneos do “disse-me-disse” – é
um galã de “encher os olhos”.
Em tese, os “Olhos”, sendo órgãos da
visão, são responsáveis por transmitir ao ser humano (e a outros animais
vertebrados ou não) as imagens, dimensões, cores e movimentos do universo que
nos cerca. Mas nem por isso alguém comedido pode deixar de experimentar uma
taça de vinho elaborado com a casta de uva conhecida por “olho-de-sapo” e,
mesmo sem ter “o olho maior que a barriga”, degustar inteira bandeja com
“olhos-de-sogra” preparados pela avó de “olhos cansados”.
Talvez porque
os peixes necessitem de visão especial para enxergarem imersos nas águas dos
lagos, açudes, rios e oceanos, os aspectos dos seus “Olhos” acabam por
determinar-lhes os respectivos nomes. Assim, eu mesmo, sem invencionice nem a
famigerada conversa de pescador, digo, de histórias de pescador, já pesquei,
no mar fluminense, uma fileira de peixes “olhos-de-cão” e, no litoral
cearense, uma fileira de “olhos-do-céu”. Claro que nos igarapés amazonenses
pesquei, quando menino, alguns “olhos-de-fogo”, peixinhos de poucos
centímetros que se adaptam bem em aquário. Tudo isso seria a tal “conversa de
pescador” se eu houvesse fisgado todos esses peixes num “olho d’água”.
E nessa miscelânea de “Olhos” daqui e dali, nem por isso vou me esquecer de
registrar que um bom fotógrafo dispensaria um “olho armado”, ou seja, a lente
(objetiva) conhecida por “olho-de-peixe” na hora de aproximar e juntar, por
exemplo, as imagens de um grupo de pessoas em fotografia no mesmo plano.
Nenhuma novidade também que a riqueza do nosso idioma proporcione muitas
analogias com situações mundanas. Exemplos não faltam. Se um sujeito morreu,
todo mundo entende que um parente emocionado dê a notícia assim: “Fechou os
olhos…”. Se a preocupação ou, modernamente, o estresse tira o sono de alguém,
diz-se: “não pregou o olho”. Se fulano, ao visitar a casa de um amigo, fixar o
olhar num vaso ou adorno de sala, e, por acaso, mais dia menos dia, o objeto
venha a cair e se quebrar, não tem escapatória: “Fulano tem
olho-de-seca-pimenteira”…, ou tem “mau-olhado”.
Com olhos no ponto de
vista (que não deixa de ser olho) filatélico, são valiosos para
colecionadores, os selos brasileiros emitidos em 1843 conhecidos por “olho de
boi” (maior) e “olho de cabra” (menor), ambos com desenhos assemelhados a um
olho.
Historicamente, sabemos que povos guerreiros, em culturas muito
antigas, costumavam castigar terrivelmente inimigos aprisionados
perfurando-lhes ou queimando-lhes os “Olhos”. Daí terem chegado aos nossos
dias textos e códigos de antigas civilizações orientais que mencionam tais
castigos. Aliás, a Bíblia, no Velho Testamento, Cap. Êxodo, 22.22 registra “Se
alguns homens pelejarem…” e a seguir no Versículo 22.23 “Mas se houver morte,
então darás vida por vida…”, e no Versículo 22.24: “Olho por olho, dente por
dente, mão por mão, pé por pé”.
De relevante ainda sobre “Olhos” me
ocorreu a inspiração do francês Louis Braille que, tendo ficado cego aos 3
anos de idade, inventou, em 1827, um sistema de leitura através do tato para
cegos. O sistema logrou enorme êxito e até hoje (ficou conhecido por Sistema
de Braille) é utilizado por deficientes visuais que, assim, conseguem pelo
tato interpretar 63 combinações de sinais em alto relevo capacitando-os a ler
letras, números, sinais matemáticos, pontuações, notas musicais, enfim ler sem
“Olhos”.
E como o espaço da crônica está acabando, melhor fechar os
“Olhos” à falta de maior inspiração do cronista, pois do contrário meus
editores podem não me ver “com bons olhos” e me apontarem o “olho da rua” num
“abrir e fechar de… ‘Olhos’”.
Crônica publicada anteriormente no ‘CARTA CAMPINAS’
- Comentários sobre o texto podem ser encaminhados ao autor, no email
carlostrigueiro@globo.com
(01 de maio/2015)
CooJornal nº 934
Carlos Trigueiro é escritor
e poeta
Pós-graduado em "Disciplinas Bancárias".
Prêmio Malba Tahan (1999), categoria contos, da Academia Carioca de Letras/União Brasileira de Escritores para “O Livro dos Ciúmes” (Editora Record), bem como o Prêmio Adonias Filho (200ó), categoria romance, para “O Livro dos Desmandamentos” (Editora Bertrand Brasil).
RJ
www.carlostrigueiro.com
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