16/04/2023
Ano 25 Número 1.316
ARQUIVO
CARLOS TRIGUEIRO |
A construção de uma
economia industrial moderna e a realização da
sociedade desenvolvida constavam como princípios
básicos do hoje esmaecido II Plano Nacional de
Desenvolvimento. Nem tanto se construiu, nem
tanto se realizou. Mas continua cada vez mais
nítida a estruturação de um poderoso Estado
econômico como alternativa para fortalecer um
Estado social secularmente débil e, de certo
modo, institucionalizar o processo de um
controvertido modelo de Estado político.
Naturalmente, no caso brasileiro, seria tarefa
árdua para qualquer tipo de Governo transformar
um quadro econômico de 400 anos de incipiência
produtiva privada em painel estatal de
bem-estar, pleno emprego e desenvolvimento.
Nessa ótica é, portanto, compreensível que o
salto de "50 anos em cinco" dos tempos
juscelinistas e todo o seu manancial de boas e
más consequências provocasse, nos anos
seguintes, a necessidade de um aggiornamento nas
estruturas produtivas do país bem como no seu
aparato estatal, naqueles aspectos mais afetados
pelo boom: o político, o administrativo e o
fiscal.
Ocorreu, como se sabe, que os
ventos das leis econômicas, muito mais fortes do
que as amarras da estrutura sociopolítica do
período que se seguiu, impeliram a Nação para o
oceano tormentoso das fragilidades democráticas,
de onde resultou a situação institucional que se
prolonga aos nossos dias e vem concebendo uma
estrutura produtiva sob os tentáculos da
acromegalia do Estado.
Assim, o Brasil de
hoje pode ser comparado a um gigantesco
laboratório para testes e ensaios da chamada Lei
de Wagner ou Lei do Crescimento Incessante das
Atividades do Estado, fenômeno preconizado pelo
financista alemão Adolf Wagner sobre a tendência
do Estado moderno ao açambarcamento progressivo
de atividades diversificadas.
É fenômeno
universal, sob qualquer matiz político ou
ideológico, que o Estado moderno alargue o
compasso das suas responsabilidades
socioeconômicas, principalmente nos países que
iniciam a decolagem para o desenvolvimento e
são, como o nosso, carentes de capitais, de
formação tecnológica, de tradição empresarial e,
sobretudo, daquele potencial empreendedor que a
doutrina econômica denomina de "espírito
Schumpeteriano".
Acontece que, entre nós,
o compasso dessas responsabilidades alargou-se
de um velado direcionismo para um
intervencionismo arbitrário, sob a legenda de
que o nosso rol de desafios socioeconômicos não
poderia esperar que a iniciativa privada
aflorasse naturalmente no curso da tecnologia,
da capitalização, da seriedade e competência
profissionais, da industrialização e do comércio
de escala.
E sem apelar para o
artificialismo das explicações tecnocráticas,
qualquer observador de bom senso pode constatar
que, no último decênio, a atividade empresarial
privada nacional involuiu de um quadro de
convivência com a intervenção estatal para uma
condição de penosa sobrevivência, tendendo, a
persistir o ritmo em que vai o dirigismo, para
uma posição de subsistência falida.
Mas
no acervo de impropriedades acumulado pela
máquina estatal, no afã de reduzir a
complexidade do relacionamento "bem-estar do
Estado/bem-estar da Nação", merecem registro os
aspectos mais impregnados pela filosofia da
situação no Poder:
I) Tendência para a
aplicação dos hibridismos, dualidades e
meios-termos do modelo político nos assuntos
econômicos (vide os casos que envolveram os
assuntos do petróleo, do café ou da siderurgia
nos últimos dois anos, por exemplo);
II)
Ausência de visão de conjunto sobre o sistema
econômico real, uma vez que os aparatos
governamentais atuam sobre um sistema econômico
oficial - e o controle da inflação é um exemplo
patente, para não falar dos preços impostos aos
produtos do setor primário.
Na política e
mesmo na política econômica, os hibridismos e
meios-termos podem servir como mediadores da
realidade social. Daí sermos forçados a conviver
com a hibridez de concepções como as de um
Estado federativo/unitário, de um sistema
financeiro oficial/privado, de um sistema
bancário puro/misto, de uma democracia-relativa,
de eleições/indicações ou de um quase-Congresso.
No mundo econômico, capitalista ou
neocapitalista, hibridismos, dualidades e
meios-termos são incompatíveis com a realidade
autêntica, mesmo porque ainda não se descobriu a
quase-inflação, o petróleo-relativo, a
meia-pobreza, ou pacotes de desenvolvimento.
Donde se concluii que indicar o crescimento
do Produto Interno Bruto, a descoberta de
lençóis de petróleo ou baixa dos índices
inflacionários implica igualar a moral política
à moral econômica - sofisma que não pode servir
nem ao Brasil-país nem ao Brasil- empresa
publica.
(Em MEU BRECHÓ DE TEXTOS– Ed. Imprimatur –
2012 – Rio de Janeiro/RJ)
(Publicado no Jornal do Brasil - 09-05-1978, Rio
de Janeiro)
Carlos Trigueiro é escritor
e poeta Pós-graduado em "Disciplinas Bancárias". Prêmio Malba Tahan (1999), categoria contos, da Academia Carioca de Letras/União Brasileira de Escritores para “O Livro dos Ciúmes” (Editora Record), bem como o Prêmio Adonias Filho (2000), categoria romance, para “O Livro dos Desmandamentos” (Editora Bertrand Brasil).
RJ
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