16/10/2023
Ano 26 Número 1.339
ARQUIVO
CARLOS TRIGUEIRO |
(Esquecido na gaveta por volta de 1994/1995 -
Chicago - EUA)
Novos escritores
encontram dificuldades para publicação de seus
trabalhos em qualquer parte do mundo. James
Joyce quando inédito, esperou nove anos para que
o editor resolvesse publicar "Dubliners". A
história da literatura registra numerosos casos
semelhantes ou mesmo de recusas a outros não
menos geniais escritores. O crítico italiano
Mauro Baudino no seu livro -'IL GRAN RIFIUTO',
conta episódios célebres de recusas de editores
a escritores como Hemingway, Dostoievsky, Marcel
Proust, Nabokov, Gore Vidal, Gabriel Garcia
Marques, Milan Kundera, Moravia e muitos outros.
Numa tentativa simplista de classificar
trabalhos escritos publicáveis, alguns analistas
consideram haver dois tipos de literatura:
"literatura-arte" e "literatura-comercial". Às
vezes, a chamada "literatura-arte" pode
tornar-se sucesso comercial, embora difícil a
recíproca ser verdadeira. No entanto, a obra de
Shakespeare está aí mesmo para desdizer tudo
isso, a começar pelos críticos de sua época que
viam seu trabalho como subcultura e impregnado
de interesses comerciais.
Aos olhos do
novo escritor, publicar um livro significa
materializar sonhos e ilusões. Mas vivendo numa
economia de mercado, temos de entender que a
edição de uma obra literária implica investir
capital e tempo em leituras, compra de direitos
autorais, de papel, trabalhos de revisão ou
tradução, composição, design, capa, impressão,
marketing, distribuição etc., além de envolver a
imagem e marca do editor. Do ponto de vista da
casa editora, o livro e um projeto econômico que
deve maturar e trazer retorno compensatório.
Enfim, livro é um bem destinado a vendas
— um
produto de consumo. Quanto mais vender, melhor!
É nessa dimensão econômica que se insere o novo
escritor. Ele não é conhecido do grande público
e ninguém pode garantir que, mesmo havendo
escrito um bom livro e obtido crítica favorável,
seu trabalho vá agradar ao grande publico e
tornar-se um best-seller.
Uma prospecção
no segmento editorial da maior economia do mundo
ajuda a comparar e interpretar o gigantismo do
mercado americano de livros em relação a outros
mercados. Enquanto no Brasil há 600 livrarias,
nos Estados Unidos há 12.897 grandes livrarias
de livros novos, milhares de livrarias de obras
usadas e raras, dezenas de milhares de pontos de
venda de livros em shoppings, lojas, galerias,
postos de gasolina, etc., alem de 32.441
bibliotecas. Também é expressivo o volume de
compras de livros pelo correio e do qual se
valem empresas especializadas.
No guia
"1995-Writer's Market", editado por Writer's
Digest Books, há 4.000 editores de todos os
tipos, aptos a comprar artigos, livros, contos,
novelas, cartões etc. Outro guia - "1995-Novel
and Short Story Writer's Market" cita nome,
endereço, especialização, condições (de
recebimento de manuscritos, exame, prazos,
devoluções, pagamentos, etc.) de nada menos que
1.900 editoras, inclusive universitárias e
revistas literárias. Há ainda várias revistas
destinadas a aprendizes e escritores emergentes
incentivando publicações subsidiadas, vendendo
métodos e softwares para escrever melhor,
promovendo concursos de todo tipo, além de
numerosos classificados abrangendo oferta e
demanda do mercado de livros. Também existe a
figura do agente literário — quase desconhecida
no Brasil — desempenhando importante função no
relacionamento entre escritores e editores,
elevando o livro à condição de produto
industrial e comercial.
Esse universo
editorial aparenta facilidade de publicação.
Porém, é necessário considerar outros aspectos
da situação. Por exemplo: a multidão de
escritores nos mais diversos ramos, de ficção,
auto-ajuda, teatro, cinema, biografias de
sucesso, manuais de todo tipo, dicionários pra
quase tudo, e uma imensidão de outros assuntos.
E também a acirrada concorrência entre casas
editoras para verem seus livros na lista de
best-sellers, motivo pelo qual preferem publicar
livros de escritores que vendem. Impressiona
ainda o número de eventos literários promovidos
pelos próprios escritores, envolvendo viagens
aos grandes centros urbanos do país, leitura e
divulgação de suas obras em livrarias, clubes
literários, e universidades. Isso sem falar na
concorrência de publicações concomitantes com
filmes do mesmo tema sob enorme cobertura de
marketing, no crescente segmento de
vídeos-livro, de vídeos, de CD-ROM e outros
sofisticados "softwares" de computadores, bem
como das redes interconectadas tipo INTERNET.
Alias, através da INTERNET, novos escritores
podem valer-se das "livrarias eletrônicas" com
suas vitrinas no "ciberespaco", onde apresenta a
capa dos seus livros, resumo dos argumentos
tratados, nota sobre o autor e como e onde
adquirir os livros.
Nesse quadro, o novo
escritor brasileiro, mesmo com suporte de agente
literário americano, encontra muitas
dificuldades para publicação. Inicialmente, há a
barreira da língua portuguesa a exigir boa
tradução do texto, adaptação às expressões
idiomáticas do inglês americano, além de abordar
temática atraente à cultura local ou na moda.
Depois, enorme gama de literaturas de e para
minorias - de fora, chicanos, orientais,
feministas, gays, lésbicas, etc. com nichos de
mercados orientados e que não deixam de ser uma
espécie de "reserva". Em ficção, há preferência
por romances. Contos estiveram muito em moda nos
anos 70. Hoje, "short-stories" são muito lidas
em revistas literárias independentes, revistas
universitárias, magazines "comerciais" tipo New
Yorker, Harper's, Atlantic City e tantas outras,
ou em coletâneas organizadas por grandes
editoras. Atualmente, como no Brasil e em outros
mercados, contos são julgados "menos comerciais"
do que romances, salvo trabalhos de escritores
consagrados.
Se o novo escritor produz
trabalhos da chamada "literatura-arte" poderá
valer-se, não também sem dificuldades, do
interesse das editoras universitárias. Mas isso
leva tempo para se concretizar, e exige processo
demorado de contatos, submissão de originais,
escolha entre numerosos escritores domésticos e
não poucos estrangeiros, além de longa espera
porque essas editoras trabalham com programações
muito antecipadas e dependem de orçamentos
restritos ou de subvenções.
Isso nos leva
a concluir que o imenso mercado americano de
publicação de livros, com o seu elevado nível
técnico-profissional de industrialização e
comercialização, não deve ser visto como
ambiente fácil aos novos escritores brasileiros.
Para aqueles que desejam tentar o lado atrativo
do empreendimento - a dimensão do mercado, a
sofisticação do produto livro, e ter a obra
publicada em inglês (que permite levar o livro a
outros países da mesma língua e a outros
mercados onde há espaços para livros em língua
inglesa) - é aconselhável munir-se de livro
muito bom, arranjar um agente literário, ou
contatar diretamente os editores segundo as
condições e regras do mercado. Bem, e ter muita
paciência e perseverança.
Fontes:
American Library Association, Washington, DC
American Bookselleres Association, New York, NY
(Em "Meu Brechó de Textos", 2012, Ed.
Imprimatur, Rio de Janeiro)
(19 de
abril/2013) RT, CooJornal nº 836.
Carlos Trigueiro é escritor
e poeta Pós-graduado em "Disciplinas Bancárias". Prêmio Malba Tahan (1999), categoria contos, da Academia Carioca de Letras/União Brasileira de Escritores para “O Livro dos Ciúmes” (Editora Record), bem como o Prêmio Adonias Filho (2000), categoria romance, para “O Livro dos Desmandamentos” (Editora Bertrand Brasil).
RJ
carlostrigueiro28@gmail.com
Direitos Reservados É proibida a reprodução deste artigo em
qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização do
autor.
|
|