16/04/2024 Ano 27 Número 1.363
ARQUIVO
BRUNO KAMPEL
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Bruno Kampel
IPANEMA
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Mais que da Ipanema dos 80 (eu já estava no exílio)
sinto saudade da dos 60 e 70.
Sim, do boliche ao lado da Igreja Nossa
Senhora da Paz. Dos chopinhos do Castelinho. Dos baratos nas boates nada
baratas. Das corridas de submarinos no Arpoador.
Na verdade, sinto
saudades de mim. Desse eu que aprendia a descobrir a boca da loura, os seios
da outra, o beijo no pescoço, a mão curiosa indo e vindo, vindo e indo.
Era um ragazzo com a vida pela frente; com a alegria pendurada nos lábios;
com a esperança dançando na pista de tantas boates; nos copos de tantos
botecos; nas mesinhas de tantos barzinhos, na cabeça carregada de sonhos e
projetos.
Era bom sentar no bar da Montenegro para ver passar as
gatinhas a caminho do mar que por alí passavam para que as víssemos passar a
caminho do mar.
Rio 1800. O George Tavares acabando com o estoque da
Brahma. As mulheres mostrando o esplendor da pele queimada pelo sol e o brilho
do olhar negociando um encontro ou desencontro.
No ouvido, Taiguara nos
dizendo que “talvez um dia... por desejo de poesia, Helena Helena Helena... E
no outro, a Elis nos aconselhando a aprender a ser sós (serviram-me de muito
essas lições).
E a mão que toca o violão se for preciso faz a guerra...
A minha fez a guerra sem tocar o violão.
E o Kings e o Vip’s acolhendo
com noturnidade nosso tesão juvenil. E o Gordini e o Dauphine e o fusquinha
indo e vindo na Visconde, na Vieira Souto, na Maria Quitéria, na beira da
lagoa, foram ensaiar, para começar, o ticotico no fubá...
Ipanema,
cenário de madrugadas que acabavam ao meio-dia. Ipanema, berço de amores
infinitos que findavam ao chegar ao posto seis.
Saudades de mim.
Saudades de nós, nesta gélida terceira idade onde planejar o futuro é falta de
"mancômetro"; onde morrer de amor provoca AVC; onde ser feliz é risco de vida.
Ipanema do bonde e das casas. Ipanema da bossa, que era nossa.
Saudades.
Bruno Kampel
Advogado, escritor Suíça
Direitos Reservados.
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